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sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

Back in Black: Aporema de Verão 2020 1a parte

 


                    2020 foi um ano triste. Quase não escrevi. Provavelmente fui tomado pelo espírito sombrio que anda por Sucupira e os textos do Nuncius costumam ter muitas palavras. Mas finalmente criei coragem e mesmo sendo acusado de ser comunista por muitos ex-amigos achei melhor dar as palavras o seu verdadeiro significado e através de um site comunista que faz seu dinheiro sem possuir um metro quadrado de terra aluguei minha casa (própria) a preço de ouro para outros comunistas que pagaram em dólar e com isto fui exercitar meu comunismo nas terras de José Eustáquio. Nada é mais comunista que observar estrelas na Armação dos Búzios e depois contar a história. Aliás História é uma matéria desnecessária e perigosa. Tão inútil como a filosofia.  Deve ser culpa de um jesuíta (comunistas ferrenhos...) que disse: As palavras hão de se fazer estrelas. Se chamava padre Antônio Vieira e foi anterior a Silvano Silva e seu Catálogo JESS de objetos estelares. Seu busto vigia a entrada da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.  Alis Gravis Niu. Com asas, nada é pesado.

                Dessa vez a Aporema (festa pagã e de origem indígena. Uma coisa horrorosa de se comemorar nos ideológicos dias atuais ...) seria de caráter binocular e fotográfico. Afinal, nós comunistas, descobrimos que a qualidade ótica das lentes da Pentax é infinitamente superiora aos espelhos made in china... E assim partimos eu, a cara metade e as crianças (uma já não mais tão criança, mas ainda a ponto de saber tudo), minha buscadora 10X50 mm e um velho Vanguard 10X50mm para iniciar nossa quarentena na segunda onda da série. Primeiro em Búzios e depois em Lumiar. O Rio de Janeiro foi tomado pela ignorância e é o maior centro de contágio de COVID no mundo.

                Chegamos e o tempo se encontrava fechado. Mas finalmente o vento nordeste bateu forte e na noite de 14 para 15 de dezembro lá estava eu, com meu novo intervalometro (made in china) pronto para fotografar. Uma tremenda mão na roda. Nada mais de ter que montar o computador do lado de Mlle. Herschel (minha montagem equatorial HEQ5. Também Made in China. Esses comunistas de olho puxado são fodas...); é só colocar a câmera em modo bulb, informar o tempo de exposição, intervalo das fotos e quantas fotos você deseja e o resto acontece sozinho.

                Realizei o alinhamento polar através de   meu método patenteado e utilizando Achernar como estrela guia. As 19:49:49 eu tinha o telescópio alinhado.  Coloquei a 300 mm na câmera e essa montada em Mlle. Herschel. Apesar de ter a impressão de que a noite ainda estava bem enevoada decidi tentar caçar por nebulosidades. As Hiades serviram apenas como um teste para o alinhamento e para checar a precisão do Go-to. Afina utilizei o menu de “1 star align”. Acreditava que meu alinhamento polar estava preciso. Com a cabeça checando quase cravada na Hiades vi que estava certo. Uma das vantagens de utilizar uma lente 300 mm em vez de um telescópio com 1200 é que a precisão e o acompanhamento se tornam bem mais fáceis. Percebi que poderia utilizar 1 minuto de exposição. Mas exposições muito longas, as vezes, sofrem muito com a poluição luminosa. Acabei decidindo por exposições de 45 segundos apenas. Da Hiades passei para as Plêiades. Só alvos fáceis. Depois achei que era hora de tentar acertar as contas com a Nebulosa da Roseta. Ngc 2244. Um alvo lindo e que nunca havia fotografado. Só iria saber se ia conseguir extrair a Roseta depois de revelar as fotos...

                Depois de mais de 50 exposições achei que era hora de tentar uma vizinha famosa. A Cabeça de cavalo. Essa já registrei. Mas quero tentar com mais aumento. No passado a registrei com uma lente de 75 mm junto com toda banda sul de Orion. Dessa vez, com a 300, espero detalhar mais a região. O Synscan dá uma vacilada e acabo fazendo algumas fotos da área da espada de Orion. Uma rápida correção e estaciono Alnitak e Alnilam no visor e volta a derrota planejada.

                Outra aquisição que fiz foi mais uma bateria para a minha câmera.  Com isto as noites têm rendido mais.

Depois das capturas fui para o processamento. Meu sensor está imundo. E a Roseta ficou muito aquém do esperado. Há nebulosidade. Mas os filamentos e cores que eu sonhava não comparecem. Vai voltar para a prancheta. A previsão é que dia 17 será a noite mais limpa de todas. Vou gastar inteira no projeto. As duas baterias...  Mas como astrofotografia é a melhor diversão processo todas as fotos engorduradas do sensor e aqui apresento.  Não sei se vou postar o Time Lapse que fiz ( Postei...). Mas neste fica evidente a grande quantidade de nuvens altas que se disfarçavam de escuridão para mim, mas se apresentavam para o CMOS da Canon.  Astrofotografia é meio como fotografia com película. Você só sabe mesmo o que fez depois de “revelar”.


Plêiades e Hiades -28 mm f4 12 X 45 seg



Roseta borrada... 5X 55 seg 300 mm f 4


               

Horse head- desastre total... Muitas fotos em vão...

             Na noite seguinte já sabia que não seria grandes coisas. O dia inteiro com cirrus passeando sobre minha cabeça. Decidi brincar com constelações. Primeiro tento o organizar uma reunião de beldades e fotografar as Hiades e as Plêiades no mesmo recinto. Depois seu famoso assediador Orion. e depois seu Cão Maior. Deu ..., mas nada espetacular. Loop de Barnard nem pensar. Tentei ainda fotografar algumas das estrelas famosas da constelação, mas o tempo nublou de vez. Meissa teve que esperar. Há anos quero tirar uma foto decente da cabeça do caçador. Afinal é um sistema múltiplo e um aglomerado Collinder.

                Mesmo com a forte nebulosidade brinquei por horas com meu binoculo 10X50. Há anos não fazia uma sessão binocular. E assim meu filho conheceu as Hiades, As Plêiades e toda coleção de maravilhas em Orion. Um dos melhores campos para se viajar com um binoculo. Ainda tirei alguma água de pedra percebendo o Aglomerado de Rosse em Lepus. Aglomerados globulares são um divertido exercício observacional com binóculos. Pequenas estrelas que se negam a fazer foco e que com atenção revelam sua natureza. Vi ainda M 41 e outros Ngcs pela região.  Depois vim contar a noitada para vocês e processar o que capturei. Astrofotografia é a melhor diversão. Mesmo quando não revela muita coisa... Nesta noite usei apenas a 18 =50 que acompanha toda DSLR da Canon. Kit mais básico de sobrevivência em campo...Quando coloquei a Canon 70 -300 (outra pé de boi) o tempo babou geral...

A Espada de Orion. O melhor da Noite. !2 X 45 seg

A Estrela Foragida

Rising Canis major

Rising Orion - 28 mm.O sensor todo pintado de gordura...

Star trail para enganar o tempo...


                No outro dia processei tudo. E sem grandes novidades descobri uma interessante estrela escondida em lepus. Bom de se fotografar imensos campos estelares é que sempre surgirão novidades após apresentar a foto ao Astrometry. Essa é a “Runaway star”. A estrela fugitiva. Ainda nada sei sobre a foragida, mas, em breve, contarei novidades por aqui.

 O Dia promete. É a primeira manhã que não vejo um cirrus decorando o topo do céu. As 15:00 horas percebo leve nebulosidade, mas nada semelhante aos dias anteriores. Rapidamente compro a cara metade e a filha mais velha. Deposito uma grana para a esposa e dou 50 pratas para a filha e aviso que essa noite elas vão sair as 17:00 horas e só podem voltar depois das 22:00. Tem a ingrata missão de dar um rolê sem se aglomerar. Proponho que se enfurnem no Porto da Barra e se escondam em uma mesa no deck do Bar do Gordo.

Lógico que as coisas não correm como o previsto. O tempo fecha completamente as 17:00 horas, a madrinha da minha filha, que é também a amiga mais pé de cana da cara metade aparece e acabo eu e o meu pequeno indo parar escondidos numa mesa do Bar do Gordo para comer pastel e tomar cerveja. Ela rapidamente arruma uma amiguinha e eu fico de papo com um casal de aposentados. Mantendo uma distância segura.  Melhor que aturar o papo de maluca da doida que baixou lá em casa. Seu projeto para o dia seguinte incluía ir dar um mergulho na Praia dos Ossos e depois visitar o tumulo de um amigo morto no cemitério que fica junto da Igreja que divide a paria do canto da Praia dos Ossos. Muito bucólico...

 Ao voltar para casa o tempo começa a abrir e eu resolvo ficar brincando com minha buscadora com as luzes acesas e as meninas enchendo a cara. Por incrível que pareça começo a achar um monte de abertos espalhados pelo céu e a região de Orion está espetacular. Era a melhor noite até o momento. Contrariando tudo que já foi falado e escrito consigo realizar um belo tour astronômico e ainda realizo registros aceitáveis de tudo que observei pela buscadora com luzes acesas e bar funcionando. As fotos da noite acabam sendo um belo exemplo do que você consegue observar com uma buscadora 10X50 em céus com Bortle entre 6 e 7.  Bortle é uma escala de poluição luminosa. Ao localizar um exemplar do “O Sul Profundo: O Catálogo Lacaille” na mesa da sala começo uma pequena Maratona Lacaille com resultados bem aceitáveis. Os objetos de Lacaille são bem brilhantes e excelente ideia para noites não tão generosas. Certamente o filé mignon do céu austral.

                Nem tudo são rosas. Mlle. Herschel apesar de estar centrando todos os alvos começa a fazer manha.  Realizo todo o procedimento de alinhamento do go-to pela rotina de “1 Star Align”. Ela vai lá e crava o objeto buscado. Depois de minutos fotografando esse (sempre 12 X 50 segundos) e peço para ela se encaminhar para outro alvo. Nada acontece. A cabeça não se move apesar do hand controler me dizer que o movimento está acontecendo. Desligo a cabeça e refaço todo o processo e tudo dá certo de novo. Aí faço as fotos e novamente o mesmo problema. É um saco ter que informar tudo de novo para o Synscan. Especialmente a hora com precisão de segundos. Isto acontece umas cinco vezes. Já começo a me irritar quando do nada ela começa a funcionar normalmente e com precisão incrível. Vai entender que se passa pela cabeça de uma mulher...

                Já mais de madrugada consigo inclusive perceber M 35 a olho nu. Sinal de dia ensolarado. M 44 também é um gradiente evidente.  A essa altura já tinha apagado luzes, fechado o botequim e colocado os “pés inchados” todos para dormir...

                Dia 17, segundo a previsão seria o mais promissor para a observação. Mas amanhece bem nublado e fica assim o dia todo.  M 35 e a previsão do tempo parecem ter sidos enganados por algum bater de asas de borboleta na Tailândia. Aproveito para levar o pequeno para dar um mergulho em Manguinhos e contar tartarugas marinhas. Vimos 8. E chegamos bem perto de 2 delas em um demorado mergulho. Depois Anchova na brasa e venho escrever as linhas que vocês estão lendo e tratar as fotos da noite anterior. Nada mal para uma noite “perdida”. 11 DSO`s ... M 41 em bela composição com Sirius, M 47 e 46, M 93, Ngc 2516, 2451,2477,3228, IC 2391, 2488 (todos membros do catálogo Lacaille) e de lambuja M 35 e 44.

                Todas as fotos são resultado de 12 exposições de 50 segundos iso 1600 com a 70-300 mm @5.6 f.  Fotografar usando a zoom é muito prático. Para alinhar Mlle. Herschel você pode começar com 70 mm e ir centralizando as estrelas guias até chegar em 300 mm.

                Aqui em Búzios é bom que consigo fazer o alinhamento polar de “ouvido”. Tive que mexer o observatório de lugar e não queria ter que realizar o alinhamento polar de novo. Nem pelo meu preguiçoso método patenteado. Mesmo assim consegui um acompanhamento e precisão suficientes para 300 mm. Isto usando o menu de “1 star align” no Synscan. Não podia perder a chance de contar um pouco de vantagem. Afinal foi uma noite de “observação de botequim” .... Nem todo astrônomo é Caxias.   Mesmo porque observar usando apenas uma buscadora 10X50 mm não é exatamente “Rocket Science”.  Quanto a tratamento das imagens usei o DSS para empilhar e o Photoshop para esticar... Abertos e campos grandes sem nebulosidade envolvida não “precisam” da PixInsight e o trabalho envolvido é excessivo para pela melhora obtida no poderoso programa. O único recurso que usaria do PixInsight seria a remoção automática de gradiente de fundo.  E o objetivo final é apresentar o que você vai observar visualmente. E mesmo assim você está sendo enganado aqui. Pela buscadora, na noite brumosa, a maioria dos aglomerados aqui apresentados não chegam a se resolver e explicam bem o nome nebulosas que possuíam na antiguidade. Minha buscadora é uma ótica infinitamente superiora ao equipamento utilizado por Lacaille no séc. XVIII e mesmo por muitos dos telescópios utilizados por Messier. E as minhas lentes não tinham nada sequer semelhante mesmo alguns séculos depois...  A 70-300 mm da Canon é inferior a 300 mm da Pentax. Tem mais cromatismo. Mas nada que comprometa muito. Observo e fotografo à lazer.

                Outra interessante reflexão: Com o recurso de drizzle no DSS (Deep Sky Stacker) consigo imagens muito semelhantes as que obtenho com o newton (meu refletor 1200 mm f8) fotografando com uma lente 300 mm em f 5.6 (com a Pentax consigo trabalhar em f4 com pouquíssima aberração cromática. E na verdade, como o sensor da T3 não é full frame, o distancia focal é na prática equivalente a 480 mm. (X 1,6). Com isto o Newton se tornou um recurso que só uso quando quero observar visualmente. Sua qualidade ótica não chegas aos pés das lentes que tenho. E O tamanho do embrulho fica bem reduzido usando lentes...  Somente em caso de objetos realmente muto pequenos (Nebulosas planetárias são a primeira coisa que me ocorre) é que acho que o esforço de alinhar com precisão nanométrica, apanhar para fazer o foco e trabalhar em f8 se justificam para utilizar o Newton em astrofotografia. Uma grande aquisição para o newton seria um focalizador dual speed... fazer foco com cremalheira é de fu...  Um sistema de acompanhamento seria importante também, mas com o Guedes achando bom o dólar a 5 e tal e importando soja fica difícil...

                Outra coisa legal é que trabalhando com campos mais abertos descobrimos vários aglomerados duplos. E, definitivamente, isso é um espetáculo celestial. Quase enredo de escola de samba. E assim M47 e M 46 formam um par muito charmoso bem como 2541 e 2477 também fazem bonito.  M 35 também tem um companheiro escondido...

M 47 e M 46 Plano aberto

2 drizzle

300 mm f 5.6 12 X 45 seg

 


                Ngc 3228 é um aglomerado mais charmoso de ser observado com mais aumento e merece o newton. Mas é um desafio para astrônomos experientes perceberem junto a buscadora e binóculos. A arte da caça não pode se perder em tempos de comodidades tecnológicas.  Ngc2190 é um objeto do projeto “Tudo que Existe”. Sua observação binocular é um exercício para um “Deep Sky Die Hard”. Uma expressão americana para viciados em céu profundo. Para astrônomos ocasionais é uma missão sem sentido. Com mais aumento é um aglomerado aberto pequeno. Daqueles que sobraram para o John Herschel.  Nem Lacaille nem Dunlop perceberam sua existência.  Seu vizinho Ngc 2925 é um pouco mais fácil. Uma espécie de aglomerado duplo para junkies observacionais...

3228 -3 drizzle 300 mm 

3228 -Wide field. É bom lembrar que ao se observar de binoculos ( ou junto a buscadora) é por esse tipo de coisa que deves procurar...




Só para viciados... 3 drizzle 300 mm


                IC 2488 é um favorito. Mas dessa vez o foco me traiu. É importante você checar o foco de tempos em tempos durante a noite. Ele acaba “escorregando” um pouco depois de várias fotos.



                M 41 é o objeto mais tênue registrado na antiguidade clássica. E um espetáculo divertido de binóculos. Apresenta caras diferentes cada vez que você o observa. Em noites muito boas ele chega e se resolver quase na integra. Dessa vez era um esfuminho onde, de tempos em tempos, uma estrela mais brilhante se acendia para apagar novamente. Provavelmente a brilhante estrela avermelhada que marca seu centro. Na foto consegui colocar Sirius e o aglomerado decorando o mesmo campo. Na buscadora isso é impossível.


M 41 3 drizzle

300 mm f 5.6 12 X 45 seg 4 darks


Ngc 2516 é amigo de binóculos e se resolve bem. Fácil de achar e resolver é um DSO ótimo para iniciantes. IC 2391, a Pequena Cassiopéia é do mesmo naipe.

IC 2391 - a pequena cassiopéia

2516 3 drizzle

Wide field


                M 35 é espetacular em binóculos. Mas assim com M41 o que vc vai ver varia de noite para noite e de lugar para lugar. Dessa vez era um grande esfuminho onde algumas estrelas tentavam se acender com visão periférica. Flicando como vagalumes.  Seu discreto parceiro demanda atenção e é um esfuminho discreto e que muitas vezes fica perdido no quadro. Mas com paciência e se sabendo de sua existência comparece quase sempre.




        M 44 fechou a noite. O Presépio. É um alvo binocular por excelência.  Por mais paradoxal que possa soar eu acho M 44 mais fácil de se perceber que a própria constelação de Câncer onde o Presépio se esconde bem “at plain sight”.

M 44 - O Presépio. Bem natalino... 


 Por fim na madrugada somos informados que Búzios decretou um novo lockdown devido a Covid. Nada como uma logística alemã na saúde... Enquanto no Peru se inicia a vacinação aqui os casos não param de subir e quem sabe um dia quem quiser vai poder se vacinar. Afinal somos uma democracia. Ser burro é garantido pela constituição e política de estado.

                As aventuras do Nuncius Australis vão seguir por aqui ao longo do mês. Espero ter mais e melhores noites ao longo do exilio familiar auto imposto. Se clima colaborar a perna ne Lumiar vai permitir que eu acerte as contas com a Roseta e revisite a Horse Head e a Chama. Em caso de intervenção divina vou tentar achar a Bruxa que habita entre Rigel e Cursa. Manterei informados...

Viva lá revolucion.

P.S. Esqueci da visita a M 93...








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