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terça-feira, 22 de dezembro de 2020

Back In Black: Aporema de verão 2020 2a parte

 

            


            Com a Aporema prolongada desse verão venho confirmando o paradoxo de Broken. Esse garante que quanto mais tempo tenho para observar menos dinheiro terei no mês seguinte. Em 2020 foi um ano atípico para Broken. Nem dinheiro nem observação.  Mas no final do ano a Dona Fortuna resolveu sorrir e apesar de ter pendurado um filme para a Johnnie Walker e outro para Nissan em dezembro devido ao retorno da covid aluguei meu apartamento, fugi para Búzios e depois ainda farei uma perna em Lumiar antes de decretar falência.

                Na noite de 19 para 20 de dezembro finalmente o céu se apresenta padrão. Sem nuvens e a lua já crescente se pondo ainda bem cedo. Ou pelo menos eu acredito nisso.

                Dessa forma monto toda a brincadeira de novo. As aventuras iniciais dessa Aporema anabolizada podem ser lidas aqui.

                Com meu novo intervalômetro a astrofotografia se tornou uma operação quase remota. Escolho o alvo, programo o cacareco, vejo o resultado da primeira foto e se tudo estiver no esquadro deixo Mlle. Herschel (mina cabeça equatorial HEQ 5 pro) e Ptolomeu (o intervalõmetro) se entenderem enquanto vejo uma série com meu filho. Ou cozinho alguma coisa. Ou Escrevo para o Blog. Um espetáculo. De vez em quando dou uma olhada e tenho tido noites bem produtivas. E não sou mais chamado de autista pela cara metade.  Enquanto assistia “Death by Magic” fotografei as Hiades (um alvo eu já tinha visitado, mas em companhia de suas meias irmãs Plêiades), Ngc 1647 (“The Pirate Moon Cluster”), ataquei novamente a Roseta na esperança de conseguir um resultado mais legal... e A Arvore de Natal (Ngc 2264). Ngc 2232 também recebe uma visita (por alguma razão estas fotos se perderam...). Alguns com pelo menos 51 X 50 Segundos. E de novo com a boa e velha 70-300 mm da Canon. As Hiades, por exemplo, são feitas sob medida para algo ao redor de 100 mm. Já os outros alvos demandam 300 mm. 


Hiades


                Há 00:00 resolvo atacar a GNM. Não sei por quanto tempo a janela vai permitir. mas com a zoom regulada ao redor de 150 mm sento o dedo no intervalômetro. Minha cunhada não acredita em podas e assim a horizonte sul do Quintal vai perdendo espaço para uma Aroeira já centenária e que se recusa a morrer.  Por conta disso também já estou com diversos cortes na cabeça causados por um galho de goiabeira que cruza a entrada de meu quarto na casa dos fundos.

Ngc 1647 ( Pirate Moon Cluster) 2 Drizzle 300 mm f 5.6


                Aproveito essa pausa para trocar a bateria da câmera e para baixar as fotos que já possuo e poder ir adiantando o processamento. Como já falei esse esquema de astrofotografia quase remote é o máximo.

                A noite está bem mais limpa que as anteriores e sem vento. O que é raro aqui pela Armação. Geralmente noite claras são bem ventosas. Por alguns instantes me arrependo de não ter trazido o Newton (meu refletor 150 mm f8). Mas ele não iria caber no Fiat Mobi que aluguei. O carro não tem mala nenhuma.

                Depois de espremer o que deu da GNM resolvo visitar um aglomerado aberto. Guiado por seu nome. Hagrid´s Dragon Cluster. O Aglomerado do Dragão de Hagrid. Uma citação ao Universo de Rowling e as história de Harry Potter. O nome verdadeiro do Dragão era Norbert. Aposto dinheiro que o apelido foi dado pelo O´Meara....  depois fazer os darks frames para empilhar todo o material. Já são quase duas da manhã. A noite rendeu, mas astrofotografia é uma caixinha de surpresas e só vou ter certeza dos resultados após a ‘revelação”. Mas meu sexto sentido (aquele que me garante que estou certo estando eu certo ou errado) me diz que as fotos desta noite serão mais dignas que as das enevoadas, brumosas e úmidas noites anteriores... 

Norberto...


              

2 drizzle Hagrid´s Dragon Cluster


Norberto parece ter vários apelidos...

              Agora é desmontar a câmera e os periféricos, embalar a cabeça em lona  e encerrar a sessão.  Depos que faço o alinhamento polar eu faço o impossível para não ter que mexer no “observatório”.

                Conforme o previsto as fotos ficaram muito melhores. A Roseta, que é a nebulosa que me derrubou em um primeiro momento, acaba se deixando levar. As primeiras fotos são, talvez, mais próximas do que você pode um dia almejar junto a ocular. Na verdade, todas as vezes que observei a Roseta visualmente percebi mesmo Ngc 2244, o aglomerado aberto associado a nebulosidade. Mas a nebula da Roseta foi, quando muito, uma leve desconfiança com o uso de visão periférica e técnicas milenares de Yoga. Mas seu bonito colorido e a forma de rosa propriamente dita parece-me ser algo de caráter fotográfico. Mesmo em céus muito escuros (a menos que você disponha de um telescópio muito porreta mesmo...) ela não vai ser tão bela. Foram 75 fotos com 50 segundos de exposição. Mas, enfim, tenho minha foto do icônico DSO. ( A Roseta é a foto que abre este post)

The Seagull nebula


 


                Depois disso vou tratar IC 2177, The Seagull Nebula, ou em bom português a nebulosa da Gaivota. A gaivota propriamente dita só é perceptível na imagem com 2 drizzle. Mas o campo aberto onde ela esconde o ninho é ainda mais sensacional. Diversos abertos (entre eles M 50) e muita nebulosidade fazem da região um espetáculo. Um daqueles lugares na Via Láctea que merecem número de vertebra. Tipo Rho Ophiuchus e a região da Lagoa (no caso a 13ª e 14ª vertebras.) O meu episódio favorito do Cosmos (o do Sagan) é “The Backbone of the night”. Fiz 51 fotos de 50 segundos. Sempre com a 70-300 mm d Canon em 300 mm f5.6. E as fotos foram processadas por um cocktail de DSS + PixInsight + Photoshop.

                As Hiades e o “Pirate Moon cluster” (Ngc 1647) receberam visitas rápidas. Cerca de 10X 50 segs. Ngc 1647 é um aberto bem legal em Touro e fácil de achar. É uma opção para escapar das batidas Plêiades e Hiades que são as donas do pedaço lá pelo curral celeste.

Christmas Tree Cluster


                Claro que nessa época não poderia deixar de Visitar o Grupo da Arvore de Natal em Monoceros. É um aberto com muita nebulosidade envolvida e nunca tinha feito um registro mais elaborado deste. É da mesma raça da Roseta. O aglomerado é fácil de se observar. A nebulosidade é coisa mais para CMOS e CCD que para retina.

A Grande Nuvem arborizou...

                E o Norberto é um aberto simpático. Tipo o Hagrid... Ngc 2301.

                Enquanto escrevo estas linhas tento quebrar uma maldição. Estou fascinado com meu novo set up. Deixei Mlle. Herschel e Ptolomeu sozinhos no quintal dos fundos tentando libertar a Bruxa de Cursa. Mais conhecida como Ngc 1909 ou A Nebulosa Cabeça de Bruxa. Um alvo difícil e que já causou cizânia na bolha astro fotográfica brasileira. E em se tratando de bruxas, astrofotografia e cia. Ltda é bom praticar um exercício de fé. Programei o Ptolomeu para realizar 99 exposições de 50 segundos com ISO 1600. Uma Lua crescente está do lado oposto do céu. Mas vou começar os trabalhos com ela presente pois será uma longa noite. No final da qual ou terei fotografado o tão sonhado Gral ou terei tirado a mais longa exposição de Cursa (Beta Eridanus) da história... De qualquer forma adorei o nome: A Bruxa de Cursa. Vou fazer um curta metragem um dia com esse nome.  É um nome sonoro e com tudo a ver com navegação. Vem de cursar. Me sinto como um velho marinheiro. Mal sei que vou dar de frente com um recife em poucas horas...

                As fotos estão acontecendo, mas, começo a desconfiar de algumas nuvens altas... Se a Roseta negou fogo sob essas condições eu começo a me preocupar se vai sair alguma Bruxa desse mato... Como dizia Stanislaw Ponte Preta de onde menos se espera é de onde não sai nada mesmo.  Continuo tratando as fotos da véspera e ouvindo Donovan. The Season of the Witch...

                Completei 100 fotos e início mais uma série. A Bruxa está quase zenital e o tempo bem limpo. Me preocupa agora a lua. Mesmo em lados opostos do céu temo que a bruxa seja também uma vampira e que qualquer luz a mate contra o fundo do céu... Isso se o enquadramento tão estudado não me trair. Estou com a 70-300 mm @ 200 mm. Quero a Bruxa de Cursa. Mas quero Cursa em quadro... Astrofotografia as vezes é meio angustiante. Tome com uma gota de Rivotril.

                Vou contar toda  a história da Bruxa de Cursa outro dia. Mas adianto que deu empate. As fotos e os borrões estarão lá.




                Decido que vou terminar o tratamento da foto do Aglomerado da Arvore de Natal e trocar de alvo. Ainda quero tirar umas fotos da Grande Nuvem e a janela observacional do quintal dos fundos é apertadinha para o horizonte sul.  Começo a pensar que a lua vai acabar com a brincadeira. (mal sabia eu que ela já estava esculhambando minhas fotos . Estava muito otimista com os resultados da véspera.) Amanhã, se não for o quarto crescente, é quase ele... Jamais chamaria minha filha de Selene.

GNM- 64X 50 seg. 200 mm f 5.6 Se quiser explorar a Grande Nuvem clique aqui


                Sobre tratamento de fotos: Existem diversos programas bons. Mas o PixInsight é muito melhor. O Photoshop é muito poderoso também. Mas, não é um programa para astrofotografia. Você vai ter muito mais trabalho. Já usei o FITS. Mas nunca me entendi bem com ele. É freeware, tem recurso, mas...  O Pix empilha também. Mas o Deep sky stacker é muito mais prático. Empilhar no Pix é a maior mão de obra. Tem que criar dark, criar flat, tratar quase foto a foto. Eu não me acostumo. O DSS é mais a prova de erro e muito mais rápido. Se você pretende extrair detalhes o Pix é um dinheiro bem gasto. Sou um astrofotografo preguiçoso. E tenho pressa. Adoro ter “bodycount” no fim da noite. Mas certos objetos são objetos para a noite toda. Outra coisa: certos objetos (abertos especialmente) são amigos do preguiçoso. Se você fizer umas poucas dezenas de frames você vai ter sua foto. Não vejo razão para tirar 300 fotos de M 35. Tudo bem que vai ter menos ruido. Mas, para mim, a foto é um registro. Se for para fazer arte eu trabalho com cinema. E aí me pagam para penar. Enquanto hobby não tem porque ser tão preciosista. Nas fotos individuais (antes de irem ao DSS) de Ngc 1909 (A Bruxa de Cursa) achei várias galáxias.  Que com 3 drizzle vão virar um belo registro para o projeto “tudo que existe”. Imagine que a própria Bruxa foi descoberta visualmente por Herschel. Aliás, todo o catálogo Ngc foi descoberto junto a ocular. O seu complemento IC já contou com placas fotográficas.

                A fase Buziana da Aporema se aproxima do fim. Agora é esperar o ano que vem e torcer para que o Clima em Lumiar colabore com a segunda fase da Aporema.  Com a lua brilhando o céu profundo vai adormecer... E neste interim apresentaremos todos os alvos registrados a caráter. História, lendas e cosmologia. No formato de sempre aqui no Nuncius Australis. Na contramão de Antônio Vieira as estrelas vão se fazer palavras.

                A Aporema é uma festa de origem indígena (Tupinambá) que ocorre sempre na Lua Nova mais próxima aos equinócios e solstícios. Uma data móvel que nem a Pascoa. O significado do termo vem de “Ver muito além”. Foi também o nome de um Cacique que, reza a lenda tinha a visão muito acurada. Via 14 estrelas a olho nu na Plêiades.

                Viva la Revolucion!

P.S.  Na noite seguinte foi o solstício. Houve a maior aproximação de Júpiter com Saturno em vários séculos e ainda se iniciou a Era de Aquários.  Eu não fotografei nada disso. Mas observei a aproximação máxima dos gigantes gasosos da praia com a família. Ao chegar em casa já mais de 22:00 hora e um pouco embriagado insisti e fotografei Meissa e M 67. Afinal a previsão do tempo avisa que vai nublar e a Lua vai vir forte de qualquer maneira. E não confio nas borboletas Tailandesas. Com tantas coincidências acontecendo Adams deve estar se revirando no tumulo e os mais fanáticos dizendo que o mundo vai acabar ou vendo o Elvis tomando chopp com o Jim Jones em Copacabana. Acordo e o Crivella (Prefeito do Rio e Bispo da IURD) foi preso.

Ohhh! Glória.  

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