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sexta-feira, 3 de abril de 2020

Ngc 4349 : O Querubim e "Tudo que Existe".



Ngc 4349 é um DSO que serve como exemplo perfeito para o “Projeto Tudo que Existe”. Este surgiu de um delírio meu onde eu conseguiria observar todos os objetos do Catálogo Ngc ao longo de minha vida.  Embora não seja, em tese, uma tarefa impossível é muito pouco provável que isso aconteça. E desta forma os parâmetros para ser membro do catálogo “Tudo que Existe” se tornaram mais restritos e desta forma cada vez existe menos coisas no projeto. É um total contra senso, mas o projeto é meu e faço dele o que quiser. Deve ser reflexo do “Geist der Zeit” mundial. Cada vez mais autoritário e limitante. E não pretendo pensar em um novo nome para a empreitada.
                Assim um objeto para ser membro do “Tudo que Existe” não pode ser encontrado em nenhum dos modernos guias observacionais que conheço.  Esses não são poucos. E ser parte do New General Catalog (Ngc) que foi organizado por Dreyer e publicado em 1888. Neste ele reuniu todos os DSO conhecidos até a data. Foi o último catálogo realizado, exclusivamente, a partir de observações visuais. Por fim eu tenho que ver e fotografar o DSO. Atualmente já estou me conformando com a ideia de que apenas o registro fotográfico do mesmo seja aceito no feito.
                Depois de observar (há muito tempo) Ngc 4349 e de o fotografar (há pouco mais de uma semana) fui levantar informações sobre ele. Segui o caminho normal. Sendo um DSO localizado muito ao sul e muito tênue para ter sido notado por Lacaille no século XVIII eu imaginava que o descobridor deste seria ou Dunlop ou John Herschel. Estava certo. Ponto para Dunlop.  Assim sendo e já tendo aprendido que um obscuro e apagado aglomerado aberto só poderia estar relacionado na série “Deep Sky Companions” do O´Meara.  Provavelmente no “The Southern Gems”. Não estava.  Arrisquei uma investigação no “The Secret Deep”. Escapou também. Faltava o “ Hidden Secrets”. Nada...
                Pronto. Ngc 4349 entrou para o “Catálogo Tudo que Existe” (e ninguém sabe...).   
                Trata-se da entrada 292 do catálogo Dunlop. Este o descobriu em 1826. Em seu observatório amador montado em Paramattha, na Austrália.
                A única descrição histórica que encontrei do discreto aglomerado é a do próprio Dunlop. Consegui uma cópia digitalizada do mesmo há algum tempo.
                “Um bonito aglomerado de estrelas extremamente pequenas, que recorda uma bonita nebulosa tênue com 6 ou 7´de diâmetro, sua concentração e bem gradual em direção a centro. Uma estrela bem brilhante no lado que segue a nebulosa (leste). Formato arredondado.”
                Um exercício lúdico que aproxima estruturas distantes como aglomerados abertos de nosso cotidiano é ligar pontos em aglomerados abertos e com isso batizá-los como algo mais, digamos assim, telúrico.  Desta forma Ngc 4349 é um aglomerado entre todos os que existem que eu posso apelidar. E assim nasce “O Aglomerado do Querubim”.   Em meio aquele pequeno amontoado de estrelas percebo claramente a figura de um rosto de um querubim barroco.  Com a ajuda do Photoshop vou dar uma força para o  lado direito do cérebro do leitor e ajudar na visualização da imagem. Mas cada um vê o que quer. Minha filha achou que era o Chucky...

                De volta ao universo físico Ngc 4349 é um aglomerado que serviu como amostragem em diversos papers sobre a estrutura de aglomerados abertos e como data em outros tantos em diversos assuntos. Mas nunca teve um paper só seu.
3 X Drizzle no DSS.

                O aglomerado possui 390 membros prováveis dentro do raio angular do aglomerado e 129 contidos em sua parte central. O raio de maré do mesmo é de algo entre 58 a 75 anos luz. Qualquer estrela mais distante que isto dificilmente terá alguma interação gravitacional com o núcleo do mesmo.    Uma Blue Straggler (estrela que aparentam ser mais jovens do que deveriam.)  foi detectada no mesmo.  A “maior” estrela (a vedete.) do aglomerado é Ngc 4349-127. Esta atraiu muitas atenções do mundo acadêmico para nosso ilustre desconhecido quando foi descoberta um anã marrom na sua orbita. Esta possui uma massa de 19,8 Júpiteres e orbita nossa amiga a cada 678 dias há uma distância de cerca de 2,38 UA (Unidades astronômicas. 1 UA é a distância média da terra para o sol.) 127 tem uma massa de 3.9 sóis e é uma gigante vermelha. No momento da descoberta ela foi a estrela de maior massa conhecida onde foi detectado um companheiro subestelar.
                Localizar Ngc 4339 é fácil. Muito próxima a Acrux (a estrela mais brilhante do Cruzeiro do Sul) é um pulo desta. Nas fotos você pode perceber facilmente onde olhar.  Ambos estarão no mesmo campo de quase qualquer binoculo. Recomendo tirar Acrux do quadro pois pode apagar o discreto aglomerado.


                Ngc 4349 está a cerca de 6.000 anos luz e tem uma idade estimada em 250 milhões de anos.
                Todas as fotos aqui apresentadas são fruto de uma captura que consistiu em 3 exposições de 1 minuto em ISSO 1600. Estas foram posteriormente empilhadas (tempo total de exposição de 3 minutos) no Deep Sky Stacker e processadas no PixInsight e no Photoshop. Foram utilizadas uma Canon T3, uma lente Pentax 300mm f 4,5 montadas sobre a Mlle. Herschel (Uma cabeça equatorial Heq5).  Fotos realizadas em Boa Esperança _ Friburgo – R.J. céus Bortle 4 e com uma transparência apenas mediana. A noite bastante úmida.