Uma noite com Messier
Feriado de Corpus Christi. Tudo em ordem para partir. Eu e minha filha. Destino Buzios.
Telescópio embarcado. Acompanha-me o Sky Atlas 2000.0 e Phill Harrington.
Desta vez eu vou garimpar todas as galáxias de Coma virgo.
Sonho meu...
Os dois primeiros dias tudo nublado.
Sexta à noite o tempo abre.
16h30min Estou em casa começando o evento. Como querem organizar o Bobó simultaneamente eu fico com o quintal da frente. Ainda claro e eu faço um a calculo aproximado do sul. Um alinhamento polar pró-forma...
Aproveito o muro ainda iluminado para checar a colimação. 1200 mm são bastante condescendentes. Parece ótima apesar da viagem e seus trancos.
Organizo a papelada. Abro o Sky Atlas na pagina certa. Mr. Harrigton a postos. Lanterna vermelha no bolso e o kit de desenho na mesa
Arcturus acende no horizonte norte. 17h: 40 min.
Mais um pouco e meu primeiro alvo se acende. Saturno.
Não sou um tipo muito planetário. Mesmo assim provo as mais diversas magnificações e com a 17 mm acho um ótimo de conforto. Os anéis não estão exatamente em uma posição favorável. Esta fazendo um belo par como Porrima. Percebo que o seeing não esta lá estas coisas. Com a 5 (240x) a imagem começa a degradar-se.
O quintal da frente, as crianças e a família não chegam a colaborar. Cogito quebrar uma lâmpada do poste a noroeste. Sou impedido.
Com Saturno na ocular começo as melhoras nas buscadoras. Estas não tão condescendentes como a colimação. Finalmente consigo ter as coisas no esquadro. Sempre.
A 10 mm sempre acha!
Pelo menos até o próximo duelo entre meu nariz e a buscadora...
Calço a 25 mm no telescópio.
Meus planos são claros. A noite será dedicada a Messier.
Assim que o céu se apresenta escuro o suficiente eu me lanço ao primeiro objetivo. Na verdade a única parte da sessão que eu tinha determinado como “sine qua non”.
M104. A Galáxia do Sombrero. Localizada há 50.000.000 de anos luz.
Magnitude: 8.00. Brilho da Superfície: 11.60. Sua dimensão: 8.6 x 4.2.
É uma entrada tardia do catalogo Messier e consta da cópia de pessoal de Messier. A entrada é confirmada também por correspondência de Pierre Mechain( que foi o descobridor da mesma em 11 de maio de 1781). Na ultima edição do catalogo (publicada em 1784) não consta M104. Esta só é realmente incluída no catalogo por Camille Flamarion em 1921. Ele adquiriu a cópia pessoal do catalogo de Messier e encontrou as anotações.
M 104 Newtoniano 150 mm |
M104 foi durante muito tempo uma das “galáxias perdidas de Messier”.
Assim que consigo ver Corvus claramente meus outros faróis já estavam acesos. Com Algorab, Spica e Saturno a triangulação não é difícil. Tinha pesquisado bem a posição e o Sky Atlas indica claramente um grupo de três estrelas bem próximas (Uma dupla e outra no desenho) que estão bem próximas a M 104. No mesmo campo com uma 25 mm. (1200 mm Df).
Suspeito sua presença na buscadora ótica (9x50mm).
O asterismo é descrito por Harrington e segundo o próprio foi batizado por um astrônomo amador americano (mas precisamente do Texas) com Stargate. Não me parece... Parece uma estrela dupla com outra de campo bem juntas. Esta formação é obvia no Sky Atlas.
M104 se mostra claramente. Utilizo a 10 mm. Percebem-se mais detalhes da galáxia. A faixa de poeira se mostra bem com visão periférica. Assim como na 25 mm.
O melhor custo- beneficio foi com a 17 mm. Bastante detalhe em periférica. As “dust lanes” são detalhe obvio.
Um bom começo. Faço um rápido esboço para registrar.
Parto para Coma-Virgo cheio de certeza.
Seguindo os conselhos de Mr. Harrington resolvo começar com a chamada Campanha do oeste. Mr. Harrington propõe o seguinte” approach” para o aglomerado de galáxias: uma campanha começando pelo oeste. Porto de saída: Denebola ou Beta Leo. A partir desta você deve achar um asterismo que consiste de um triangulo e um pequeno diamante acima deste. Ao redor deste conjunto de estrelas você vai localizar M 98, 99, 100 e 85. Segundo o renomado colega a campanha do oeste é mais fácil.
E uma campanha de Leste. Tem como ponto de partida Vindemiatrix em Virgem. Esta mais comprometida.
Coma- Virgo é cruel. Um monte de galáxias. A maior parte bem apagada. (Se você tem algo com mais de 300 mm ainda vai ter de usar “averted” na maior parte do caldo).
Nem Messier compareceu. Ngc então...
Depois de mais de uma hora e não localizar os asterismos referencia que meu amigo Harrington comentou eu ponho minha viola no saco.
Percebo que o destino será o mesmo se mudar meu plano de ação para um ataque pelo flanco leste. Às vezes é melhor recuar para lutar outro dia.
Desisto. A transparência é pouca e o seeing idem. Me servem de desculpa.
Retorno para Corvus. Na verdade começo com Corvus. Apesar das aparencias dizerem o contrario M 104 se encontra em Virgem...
M 68 |
M 68. Um Aglomerado globular. Não o conheço. Mas bem próximo ao Zênite é viável. Há suspensão mais baixo no horizonte. Um alinhamento fácil seguindo a linha entre Algorab e Beta Corvus. Segue mais um pouco e pronto!
Discreto na buscadora. Acredito que deva ter dias melhores... Hoje é uma mancha... Mas dois Messier novos no hit list é sempre melhor que um Abell que você não sabe se viu mesmo ou se quis ver. Não se apresenta arredondado , pelo menos não perfeitamente.
Algorab (e Corvus em geral) é um farol muito útil. Tema uma companheira visível a olho nu e a dupla é certeza de posição. Mesmo no céu urbano. Ela permite localizar com certa facilidade ambos Messier avistados.
O aglomerado de Virgem agora já vai mais baixo no horizonte e está fora de cogitação.
Estou tentando manter um registro das observações e me demoro desenhando os DSO´S. Realizando pequenos esboços para referencia.
Utilizo basicamente um conjunto de lápis (H, 2B, 6B e lapiseiras 0,5 e 0,9 com grafite HB) e um esfuminho 1. Uma boa borracha. Depois faço uma versão no Photoshop. Meu scanner está com problemas. Espero postar os originais em breve...
Mantenho a intenção de dedicar à noite a Monsigneur Messier.
Arcturus, Saturno e Vendimiatrix alinham e consigo perceber Alpha Coma. Segundo o amigo, achando a tímida estrela você vai achar M53.
Não foi tão fácil assim. Ela não exatamente salta a vista na buscadora. Na verdade centralizei Alpha e navegando (ou escaneando) com a 25 mm acabei por encontrar. Mais definido que M68. Novamente a 17 mm foi a melhor opção.
Acho que o seeing está muito fraco para suportar a 10 mm.
Com “averted” se percebe uma granulosidade e suspeito perceber estrelinhas “ flicando“.
Flicar é um anglicismo. No cinema se usa para se expressar um problema de freqüência. Quando sua luz funciona a 60 hertz e você filma com a velocidade de 25 quadros por segundo pode ocorrer o “Flick”. Vai lembrar o efeito de uma luz estroboscópica. O efeito é muito semelhante. M53 flica com “averted” (averted não é um anglicismo. É inglês mesmo)
O plano deve ser flexível.
Nasceu Sagitário. Serei fiel a Messier (a estratégia). Mas farei uma mudança tática (o plano).
São objetivos mais claros e em território conhecido. E na verdade muito mais bonito que o horizonte norte que pretendia atacar.
M8. Para abrir os trabalhos. A nebulosa da lagoa. É uma bela definição.
Gastei um pouco mais de tempo desenhando. A noite não é ideal... Mas a lagoa sempre se apresenta. Cada vez de um jeito. Aqui é para jogar campão. 25 mm. Com a 17 fica bom e com a 10 mm se resolvem muitas estrelas, mas se perdem os reflexos.
Sagitário é sensacional. Girei os botões de ambos os eixos e topei com M 28.
O melhor Glob da noite. Flicando muito,
M17 é a favorita do camarada Harrington. Vamos lá. Fácil. A transparência para o horizonte sul esta melhor. A Via Láctea apresenta-se. E meio calculo, meio chute a nebulosa aparece na buscadora. Claramente. Até interessante.
Com 25 mm ela é o cisne. Com a 17 mm ela é a ferradura. Com a 10 mm novamente o mesmo problema. Mais estrelas, mas sem névoa (bem... com um pouco)
M 17 é conhecida por vários nomes. Nebulosa do Cisne, da Ferradura ou Omega. Eu percebo bem a ferradura. Foi descoberta por de Chéseaux a redor de 1746.
O céu nubla. Me resigno . Abro uma cerveja.
Vou esperar a lua nascer.
A lua se apresenta as 03h00min da manhã. Um rápido levantamento com a 25 mm e escolho meus alvos.
Troco a ocular. 120 x vão ser o suficiente. Desenharei somente uma parte do campo.
Um grupo de três crateras alinhadas no terminator.
Longomontanus é a maior delas. Batizada em tributo a um astrônomo dinamarquês do Sec. XVII. Foi assistente de Tycho Brahe e parece que inimigo figadal de Kepler...
A seguir Wilhelm. Este um estadista e astrônomo nascido alemão durante o Sec. XVI.
Menor e espremido entre os dois está Montanari. Esta batizada em tributo a Geminiano Montanari. Italiano obviamente. E astrônomo.
Depois de vários esboços resolvo que é hora de me preparar para dormir.
Pretendo utilizar os esboços para produzir alguns sketches da região utilizando algumas técnicas diferentes. Achei um livro interessante a respeito da matéria. E apesar da total inaptidão para as artes plástica pretendo testar as possibilidades apresentadas.
Minha cunhada dá o golpe final e me traz uma caipirinha de Cajá.
PS- Sabado o céu acabou abrindo. Mas infelizmente era dia de churrasco e o dever junto a churrasqueira me mantém ocupado. Apresento Saturno aos visitantes. Sempre funciona... E depois visito Ngc 4755 . E só...
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