Chegou o Outono logo Virgem. Se p
-> q então contingência lógica. Mas
nessa Aporema que vou comemorar na lua nova de abril será uma tautologia. De qualquer
forma não me lembro mais as benditas tabelas de verdade de meu curso de Lógica
101. Embora o Chateaubriand fosse um excelente professor.
Depois
de um bom tempo retorno para a Armação de Búzios para comemorar uma
Aporema. Para aqueles que não acompanham
o blog: Aporema é uma festa pagã de origem indígena e
que é comemorada sempre na Lua Nova mais próxima aos equinócios e solstícios. 4
vezes ao ano. Seu nome remonta um Cacique Tupinambá de nome Aporema. É possível
que devido a sua lendária acuidade visual a palavra “aporema” tenha sido
incorporada a algumas línguas do tronco tupi com o significado “ver longe” ou em
uma tradução bem livre como “ver antigo”. Em uma daquelas “coincidências de Adams” que coleciono
aporema é também um silogismo que demonstra o valor igual de duas proposições
contraditórias. Coincidências de Adams são coincidências tão surpreendentes que
parece ser relacionadas a leis fundamentais do universo. Mas são apenas coincidências.
São uma homenagem a Douglas Adams. Autor
do obrigatório “Guia do Mochileiro das Galáxias”. Um livro que você deve sempre
ter na mochila junto com uma toalha.
Meus objetivos foram traçados na
semana anterior a viagem. Eu iria novamente me digladiar contra o Aglomerado de
Virgem. De novo falando em verdades e contradições queria observar apenas as Galáxias
Messier que adornam o superaglomerado galáctico mais próximo. Se não todas pelo menos uma boa parte. Uma longa caminhada pelos caminhos do Outono.
Um passeio difícil na companhia de duas nobres donzelas que disputam o posto de
Virgem celestial: Astréia e Perséfone. Já dizia Quintana em sua Canção de Outono:
Partir, ó alma, que
dizes?
Colher as horas, em
suma…
Mas os caminhos do
Outono
Vão dar em parte
nenhuma!
Há
muito sem visitar a Terra de José Eustáquio , um misto de pescador, pirata e astrônomo
que habitou a região no Sec. XVIII e amigo pessoal do Cacique Aporema, eu tinha
me esquecido que os céus da Armação não são os mesmos de meu novo posto de
observação na nem tão próxima Serra-Mar. Se na Pedra Riscada observo debaixo de
céu 3 ou 4 na escala Bortle em Geribá peno
entre 6 e 7.
Mas
tenho minha derrota toda planejada: Em um arquivo txt. habita meu plano de ataque.
Pretendo
realizar o ataque a partir de oeste. Na verdade, vou estacionar por volta das 20:00
horas no horizonte nordeste e esperar o aglomerado cruzar esse meridiano. É a área
menos afetada pela poluição luminosa gerada pelo “centrão de BZ”. E desta forma
vou primeiro observar os membros mais próximos que habitam próximos a Leão. São
estes M 95, M96 e M 105. Seguidos de M 65 e M 66. Depois dividi o aglomerado de Virgem
propriamente dito em alguns grupos organizados de oeste para leste e
encabeçados pelas galáxias que me pareciam ser as mais dispostas a colaborarem
coma minha causa. O primeiro grupo
encabeçado por M 98, o segundo por M 88 e o terceiro M 49. E, estupidamente,
não queria utilizar M 87e a cadeia de Makarian para coordenar o ataque pela
simples razão de que já tinha fotografado a maior parte do conjunto da obra.
A
melhor forma que vejo para se explorar o Aglomerado é calcular a posição de M
87 (que é uma das galáxias mais facilmente percebidas no aglomerado) e com esta
centralizada calmamente ir escaneando a região e começar a navegação.
Tendo
o Newton (meu telescópio 150 mm f8) alinhado e balanceado as 19:20 com o auxílio
luxuoso de Avior. Sou muito preguiçoso para realizar o drift e assim costumo realizar
o alinhamento polar utilizando uma estrela no momento que esta cruza o
meridiano. E agora obtive um aplicativo
que é um nível digital preciso o suficiente para um excelente acerto... Outra
coisa boa de voltar a Terra de Zé Eustáquio é que eu sei onde reside o sul
celeste “de ouvido”.
Como
não poderia deixar de ser nem tudo são rosas. O vizinho da casa ao lado largou
a luz da varanda acesa. E um novo poste perturba bastante.... Mas me contenho e
não cometo nenhum tipo de vandalismo. Começo a jurar que a Aporema de inverno será
na Pedra Riscada...
M 96 - 20 Exposições 30 seg 1600 Iso- Newton. Nada explica porque não enquadrei também M 95 nessa foto... |
Parto
para o jogo. E rapidamente me lembro que a Astronomia é sobrinha de Moira e
prima irmão de Obsessão. Quando você decide passar as suas noites de sexta, sábado
e domingo em busca de galáxias que, na melhor das hipóteses, vão comparecer na
sua retina com o uso de visão periférica, técnicas de respiração e de horas no
escuro é bom saber que nem todos vão entender e muito menos gostar. No caso meu
filho e a cara metade estão já bastante contrariados. Para piorar minha esposa
arrastou sua amiga mais “loca” para acompanhar a noite. Sou obrigado a
determinar uma área de exclusão e todos são proibidos de ir aos fundos da casa.
Bagunça só na varanda da frente da casa ou na sala. Se precisarem pegar algo na
cozinha devem utilizar uma pequena lanterna. E gritar antes para que eu feche
os olhos.
O
pequeno eu acalmei contando a história de “ver antigo”. Embora não seja muito
fascinado pela astronomia ele adora dinossauros. E assim, quando contei a ele
que aquela luz que estávamos vendo começou sua viagem no tempo que as imensas e
ferozes criaturas ainda caminhavam sobre a terra ele deu sossego. E ficou
encantado com a ideia de ano luz. Gostaria de realmente entender como uma
criança de 5 anos realiza o espaço-tempo. Ele percebeu algo. Mas
definitivamente eu não sei o que... Talvez não seja tão diferente de minha
percepção. Só mais jovem.
Meu
plano faz água rapidamente. Com Mlle. Herschel (minha cabeça equatorial HEQ 5)
com seu Go-to um pouco errante e caçando o invisível a noite vira uma longa
série de tentativas e erros. Ainda não sei como consegui ter mais erros que tentativas...
M
105 (e suas discretas damas de companhia), M96 e M95 (O Tripleto menos conhecido
de Leão) ficou para o dia seguinte. M 65, M66 e galáxia de Hamburguer (O
Tripleto de Leão propriamente dito) foram um pouco mais companheiras.
Tenho
que contar um segredo para vocês. Se o plano é observar as galáxias Messier (ou
outras) de Virgem lembrem-se que muitas delas não serão simpáticas. A moça é Virgem
não é à toa...
O Grupo de M 105 , M96 e M 95-30 X 45 Seg Iso 1600 Pentax 300 mm 20 Darks DSS + Pix + PS. 2 Drizzle |
Realisticamente em céus
como os de Búzios nenhuma delas será muito mais que uma suspeita e não terão
forma. Serão todas um ponto estelar fraco (o núcleo) com uma leve nebulosidade
ao redor. Será muito difícil diferenciar estas das estrelas fracas que habitam
a região. E depois que você localizar uma galáxia com certeza lembre-se de onde
ela está. A navegação na região é mais de galáxia em galáxia que “Starhooping”. Como você vai perceber muitas pequenas
estrelas enevoadas e suspeitas de serem mais que uma estrela na região vai ser
bem difícil saber quem é quem. As Galáxias
que você terá um pouco mais de apoio são M 66, M 65, M 98, M84, M 86, M 87 e M
49. Lembrando que as belíssimas espirais “de frente” para nós (como M 100) não
irão aparecer. Seu brilho de superfície é muito baixo para céus com poluição
luminosa. Mesmo roubando e fotografando elas não serão muito dadas. Galáxias “face-on”
não gostam de luz mesmo. Vide M 33 que está a meros 3 milhões de anos de nós.
Em Virgem você pode multiplicar a distância, no mínimo, por 10... Como já falei (e Quintana antes de mim) muitas
as vezes os caminhos do Outono vão dar em parte alguma...
No coração de Virgo. |
Outra
informação interessante que descobri nesta Aporema. Há muitas galáxias na
região e isso eu já sabia. Mas quase todas as IC (galáxias listadas no Index
Catalog. Uma continuação do New General Catalogue) não estarão ao alcance de amadores
nem com fotografias... As Ngc (Listadas no New General Catalogue) ainda dão uma
força. Algumas até se rivalizam as Messier. É importante lembrar que o NGC foi todo realizado
a partir de observações visuais. Já o IC utilizou-se de placas fotográficas. É
impressionante o que os pioneiros fizeram com os limões que tinham. Messier
dificilmente possui um telescópio melhor que o Newton. E observava de um Paris
que já era conhecido como o a Cidade Luz. Sua visão era melhor que a do Steve Austin.
(Aos leitores mais jovens: recomendo que
procurem por “O Homem de Seis milhões de dólares” no google.)
M 98 21 x 45 seg 1600 iso |
Afobado
que sou utilizo péssima astronomia o resto de noite. Mando Mlle. Herschel
apontar para uma das vítimas e tiro uma foto. Se aparecer algo que pareça com
uma galáxia eu tento observar um pouco e depois tiro mais fotos. No visual a
coisa está muito feia. Nessa noite eu só vi (tenho certeza) M 87 e M 49. M 66 e
65 eu conheço o campo estelar e posso mentir para mim mesmo...
Na
segunda noite as coisas são parecidas com a primeira. Mas faço muitas
exposições (100 X 30seg.) com ISO 3200) do Tripleto de Leão original e espero
conseguir algo. O dia fora muito bom para a noite render. A fim de aproveitar um pouco o tempo faço uma
seria de fotos de Ômega Centaurus. Sempre bonito.
Finalmente
chega o domingo. Mudança radical de equipamento. E aí a derrota planejada com tanta antecedência
acontece. Parece até que Murphy e Clark estavam de férias. Em vez de atacar o
aglomerado com o Newton decido utilizar um set up mais flexível e leve. Minha Pentax
300 mm f 4.5 Serie F. Com um fator de correção de 1,6 devido ao sensor da Canon
T 3 ela vai atuar como uma 480 mm.
Começo
a desconfiar que o Newton é um pouco pesado para a HEQ 5. Pelo menos para astro
fotos. Com a 300 Mlle. Herschel (utilizando apenas o 1 star align) crava tudo
que peço. A Noite transcorre as mil maravilhas. Com o computador no colo
rodando o Astrophotography Tools eu não
só capturo toda a derrota como ainda abato a “Pata do Gato” e faço uma linda
foto de M 4. Tudo isto conversando com a
cara metade e bebendo cerveja...
Começo
a achar que já espremi o Newton até perto de seus limites. Preciso urgentemente
de Evostar... Na verdade a ignorância as vezes é uma benção. O Newton é apenas
um telescópio razoável para observação visual. Como astrofotografo é uma certa
forçação de barra. O foco é muito difícil (cremalheira...) e a qualidade de seus espelhos é apenas razoável.
De tempos em tempos ele faz uma foto aceitável. E é extremamente suscetível ao
seeing e a transparência. Um
exemplo simples de como ele deixa a desejar é o fato de ser obrigado a
trabalhar com um threeshold (limite) muito baixo no Deep Sky Stacker para garantir
que esse empilhe um número aceitável de frames. Com a Pentax (e outra lentes)
Utilizo um threeshold muito mais alto e dificilmente um frame é recusado.
Agora é torcer
para que já que elegemos este celerado em nome de uma suposta melhora econômica
que está venha a galope. Sem educação, sem ciência, sem cinema e sem educação vai
ser difícil. Mas perder tudo isso e ficar duro vai ser...
Segunda
tenho que retornar correndo para o Rio já que meu trabalho foi adiantado em um
dia. Na noite cai uma tempestade na cidade.
M 4 e cia. ltda. |
A
Aporema de outono terminou e os céus já choram. O diluvio chegou a Rio poucas
horas depois de eu devolver o carro na locadora. Esqueci de dizer que além de ficarmos sem cultura,
sem ciência, sem cinema, com bancada evangélica forte somos também negadores do
aquecimento global. É bom que eu ganhe dinheiro suficiente para meu Evostar
rápido...
Com
rápida análise sobre o material capturado é inegável a superioridade da ótica Pentax
sobre os espelhos da Skywatcher. Só falta aumento... Não esquecendo que Mlle Herschel
me garantiu 100% de aproveitamento das fotos feitas com a lente. E fazendo
exposições de 45 segundos com um acompanhamento quase irretocável. Eu não possuo um guider para o Newton. É outra
coisa que é bom que entre logo o dinheiro para ter que aturar o Olavo de Carvalho
gerenciando a educação no país. Sai Velez e entra um discípulo ainda mais
burro. E o diluvio rolando lá fora...
Tripleto de Leão 21X 45seg 1600 Iso. Dando um banho n Newton e suas 100 exposições com 3200 Iso. F4.5 contra F8 . Mas mesmo assim... 3 drizzle no DSS |
Agora resta “revelar”
as fotos. Nesse processo aprendo mais uma lição. Quando não tenho certeza do
que estou vendo utilizo um site adorável que faz isso. Chama-se astrometry.net
. É raro que ele não identifique algo que brilhe, pisque ou acenda no universo.
Mas ele não gosta de arquivos com autosave no nome. Descobri agora. Acho que
ele acha que é roubo. Tem algo a ver com um tal de “Django” Mas bastou eu
alterar o nome dos arquivos para ele carregar e dar o caminho das pedras. Outro
detalhe é que ele não é chegado em fotos muitos processadas. Menos informação para ele é mais. Geralmente
utilizo apenas um frame (esticado de leve no Photoshop e transformado em Jpeg.
Ele não aceita Raw (CR2.) para identificar. Especialmente em alvos mais
coloridos como o final da Cat´s Pawn Nebula. Na seção galáctica ele atua com
brilhantismo.
M 49... Newton.. |
O fim do Mundo
deve estar realmente próximo. Quase todos os alvos da derrota planejada foram ao
menos fotografados. E os que não foram acabaram substituídos por várias
novidades. Das galáxias Messier foram registradas
M 65, M 66, M 84, M 86, M 87, M 88, M91 (ainda que de esbarrão), M95, M 96 e M
105. E mais de uma dezena de Ngc´s. Quanto as IC´s uma análise nas fotos
ampliadas vai provar o que disse acima. A maior parte não se apresenta. E as
que se apresentam não são alvos visuais viáveis com meu equipamento nem mesmo
no Atacama...
Quanto a
observação visual a Virgem precisa de um quarto bem mais escuro que Búzios...
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