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segunda-feira, 6 de maio de 2019

Ngc 4216: A Agulha do Tecelão


                



           No último artigo disse que o Aglomerado de Virgem é melhor abordado se atacando em blocos. Ou por subgrupos de galáxias. Algo como aglomerados dentro do aglomerado. Certamente um dos subgrupos mais famosos é a Cadeia de Makarian.  E por isto mesmo deixarei estas bandas para depois. Hoje vou apresentar Ngc 4216. Em primeiro lugar porque área é menos manjada e eu adoro novidades. E em segundo lugar é porque estudos recentes demonstram que este subgrupo provavelmente é um subgrupo mesmo. Com processos e história bem diferentes de outras regiões dentro do aglomerado.


                Ngc 4216 é a bambambãs de sua região e a chefona mesmo do clã.  E rivaliza em brilho e detalhe muitas das galáxias Messier na área. É interessante que Messier e Méchain tenham deixado escapar essa belezinha tão próxima a M 98.  Conhecida como a “Agulha do Tecelão” seu apelido remonta aos clássicos guias escritos por Smyth e Webb ainda no século XIX.  Sua descoberta sobrou para William Herschel na noite de 17 de abril de 1784. Ele registra apenas: “brilhante, bastante alongada, muito brilhante no centro, 9´a 10´ em comprimento.”
Agulha de Tecelão (Weaver´s Shuttle) 

                A seguir vem o inspirador de seu bem dado apelido, Smyth, em seu “Cycle of Celestial Objects” de 1844 que nos diz “... uma longa e pálida nebulosa esbranquiçada... Um Objeto muito curioso em um formado que lembra uma agulha de tecelão”.  Webb em seu “Celestial Objects for Common Telescopes” de 1859 reforça a ideia de Smyth e fala em “um núcleo longo como uma agulha”.  Pouco mais de um século se passou e Burnham em seu “Celestial handbook” não dedica uma entrada exclusiva para 4216. Ele apenas a enumera juntamente com ouros objetos de interesse na apresentação que abre os capítulos referentes a cada uma das constelações.  Mas é o primeiro a destacar a presença de duas outras galáxias imediatamente vizinhas no campo.  E é também o primeiro a destacar sua posição ambígua na classificação de Hubble: “Sa/Sb?  10.9; 7,2´X1.0´; Muito Brilhante (vB), muito grande (vL), muitíssimo alongada (vmE) repentinamente mais brilhante no meio-núcleo ( sbMN); interessante espiral quase de perfil. Duas outras no campo.”  Adoro decifrar a notação descritiva deixada por Dreyer. Me sinto lendo livros antigos de xadrez....   vB, Vl, vmE, sbMN e ++ (xeque mate).
                As duas galáxias citadas são as discretas e pequenas Ngc 4222 e 4206. No mundo real existem muito mais galáxias envolvidas no grupo de Ngc 4216. A dinâmica do grupo tem sido bastante estudada e se revela uma região bastante interessante e especial.

                Ngc 4216 por si só já é uma daquelas espirais que se apresentam carentes em estrelas jovens e parece ter sido estripada de grande parte de seu gás e por isso não apresenta regiões de intenso nascimento estelar em seus braços. Ainda por cima é considerada atualmente uma Galáxia espiral mista. (SABb). Uma espiral com uma barra escondida em meio aos braços mais típicos em um espiral “Grand design”. E estando quase de perfil para nós torna ainda mais difícil se perceber a presença ou não da estrutura.  Mas mesmo em minhas modestas fotografias desconfio da presença de uma barra central. Todas as fotos aqui são resultado do empilhamento de 20 fotos com 45 segundo de exposição ISO 1600 com uma lente Pentax 300 mm f 4.5. Temos desde a panorâmica que engloba toda a região (aí incluída M 98 bem no centro da imagem levada ao astrometry e que serve como guia para localização) até 6 X drizzle.
                Ngc 4216 vem se encontrando no meio da evolução da ciência desde há muito. Foi a primeira “nebulosa espiral” fotografada pelo refletor Crossley (36 polegadas) do Observatório Lick na virada do século. Seu diretor Keller foi um dos defensores de Curtis durante o Grande debate e garantiu ter percebido a rotação de discos galácticos ao longo de curtos períodos observacionais. Não se sabe se por crença ou vontade. O universo foi implacável e as nebulosas espirais se revelaram galáxias como a nossa e o universo e a mentes se expandiram...  
                Ngc 4216 é uma espiral de tamanho semelhante a via láctea.
                Embora estudos mais recente digam quase não haver regiões de starbusrt em Ngc 4216 um estudo realizado em 1999 por O.K. Sil´chenko (Instituto Astronômico Sternberg de Moscou) obteve um espectro em alta resolução da galáxia utilizando o refletor soviético de 6 metros  e descobriram um núcleo rico em metais o qual aparenta ser mais jovem que o bojo galáctico. Geralmente estes são contemporâneos. Uma hipótese é que a suposta barra central junto a núcleo esteja desencadeando nascimentos estelares e mantendo a região próxima ao núcleo “mais jovem”.
                Um recente estudo utilizando os dados do “Next Generartion Virgo Survey” (THE NEXT GENERATION VIRGO CLUSTER SURVEY. IV.  NGC 4216: A BOMBARDED SPIRAL IN THE VIRGO CLUSTER* SANJAYA PAUDEL†, PIERRE-ALAIN DUC , PATRICK CÔTÉ, JEAN-CHARLES CUILLANDRE3, LAURA FERRARESE, ETIENNEFERRIERE, STEPHEN D. J. GWYN , J. CHRISTOPHER MIHOS , BERND VOLLMER, MICHAEL L. BALOGH6, RAY G. CARLBERG, SAMUEL BOISSIER8, ALESSANDRO BOSELLI8, PATRICK R. DURRELL, ERIC EMSELLEM1, LAUREN A. MACARTHUR, SIMONA MEI  , LEO MICHEL-DANSAC  , WIM VAN DRIEL ) e do telescópio Firebird conseguiu obter imagens de galáxias anãs de baixíssimo brilho de superfície que estão em processo de absorção por Ngc 4216 e que vem mostrando em seu filamentos processos antes nunca registrados . Como foi possível registrar estas galáxias anãs em processo de destruição a estrutura filamentar e a  resultante do processo foi possível perceber que um alinhamento de três anãs se revela intrigante e pode ser que estas sejam a segunda geração de galáxias originaria de uma primeira galáxia absorvida. No paper se discute o tempo que isto ocorre e como isto foi possível em um local tão densamente povoado com o aglomerado de Virgem. Levantam a lebre de que o grupo inteiro pode ser um agregado recente ao aglomerado de Virgem. Aos que gostam de evolução galáctica o paper é extremamente interessante e deve ser lido na integra (o Link está acima no título do paper). É uma área de extremo interesse cosmológico, muito estudada e sempre na fronteira do saber.

                Localizada na fronteira de Virgem com Coma Berenice localizar   Ngc 4216 demanda algum dever de casa. Localize 6 Coma e provavelmente Messier 98 e/ou 99. Depois siga rumo a leste. Em céus bem escuros ela se apresentará discretamente mesmo para uma buscadora 50 mm. Mas não é tarefa para olhos sem treino ou cansados... Suas companheiras são muito discretas mesmo no Newton. (Um Refletor 150 mm f8). Não acho que nada menor que isso dará algum tipo de detalhamento. Você vai procurar por um esfuminho discreto.  Entre 6 Coma (e M 98) habita a ainda mais discreta Ngc 4208. Com muita atenção você vai percebê-la. É um indicador que vais no caminho certo.
                Ngc 4216 é uma das mais interessantes e “fáceis” galáxias de Virgem fora do Catálogo Messier.

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