Sem
visitar o posto avançado em Buzios e aproveitar de um céu um pouco
mais escuro ( Bortle 5) desde o carnaval eu tinha grandes planos para a noite
de quarta feira.
Com Selene no terceiro dia após a lua nova tudo se mostrava ideal. O 7timer indicava
condições bastante favoráveis à observação. Tudo estava “ideal demais”...
Saí do
Rio acompanhado de minha cunhada ainda cedo. O transito ajudou. Chegamos em
pouco mais de duas horas.
Montei
o telescópio e com tempo sobrando resolvi inventar. Dizem que a necessidade é a
mãe da invenção. Pode ser verdade. Mas o ócio é o pai...
Procurei
por uma ocular com um reticulo iluminado em diversas lojas (ok, em duas...) e
não encontrei. Enquanto aguardo por uma de verdade eu invento...
Possuo
algumas oculares Kelner que praticamente não utilizo. Daí a tal da invenção...
A casa
passou por algumas reformas desde a ultima visita e rapidamente me assenhoreei
do novo coreto.
Com o telescópio montado na sua frente
utilizei a pequena mesa como minha base. Uma rápida visita a loja de ferragens e a
padaria e “voila”.
Descasco
um fio paralelo e acabo com quatro fios de cobre de+- 0,1 mm.
Com o
auxilio luxuoso de um rolo de fita crepe fabrico uma ocular reticulada de 20
mm. E assim me mantenho fiel a astronomia de baixo custo.
A ida
até a padaria é também parte do plano de observação.
Quando
você vai passar a noite junto a um telescópio alguns luxos são necessários. A
alimentação é algo fundamental. Logo duas latas de red Bull , um queijo minas e
uma barra de chocolate serão meus companheiros. Compro também meia dúzia de
Stella Artois. Estas para depois de realizar o grosso das observações
planejadas. Como já contei aqui os amigos, a bebida e você mesmo são os maiores
inimigos que um homem pode ter. Desta vez vim sem amigos e não poderia deixar
as coisas correrem tão frouxas assim. Afinal o homem é o exercício quem faz...
Quando
comecei a observar me lembro de ter lido em quase todos os lugares que uma
visita até um clube de astronomia e consequente convívio com outros astrônomos
seriam uma das melhores coisas que eu poderia fazer. Eu nunca realizei isto. A astronomia para mim
é uma atividade solitária. E prefiro aprender (ou não...) tudo do jeito mais
difícil. Admito que como nunca observei junto a outros astrônomos tenho por
principio que quanto mais gente por perto pior para a pratica astronômica.
Meu
plano inicial é dar continuidade a meu projeto de fotografar todo o Catalogo
Lacaille. E se possível fazer um tour
visual pelo aglomerado de Coma-Virgo. È outono e assim sendo “Galaxy Time”.
Mas o
objetivo principal é fotografia.
Astrofotografia
demanda um alinhamento polar muito mais preciso que o costumeiro. E por isto a
ocular reticulada. Veja este vídeo e você vai entender o porque de tanta
criatividade....
Recentemente
fiz um post falando como realizar o método do drift. E com este texto aberto no computador e com a
minha reticulada tabajara no telescópio aguardo o sol se por e poder começar o
meu alinhamento. Aproveito para nivelar a cabeça. Isto é um procedimento que as
vezes esquecemos e que torna o alinhamento muito mais difícil , senão
impossível. Tudo correndo perfeitamente. Talvez “perfeitamente demais”...
Como comecei as preparações muito cedo ( 3;30
pm) tive todo o tempo necessário para fazer tudo que não tinha feito. Como
adoro buscadoras possuo duas ao telescópio. E assim consigo ainda dar mais uma
saída e comprar uma bateria para minha “red dot”. E descubro que esta sendo de
3 volts qualquer modelo serve. A bateria indicada é a 3026 ( a mais fina...) só
que Buzios em geral e Geribá em particular não oferece muitas opções . Assim
compro uma 3032 ( a mais grossa). E funciona também. Vivendo e aprendendo. Tudo
dando certo. Talvez “certo demais”...
Um
ajuste na colimagem. Só para não perder o habito e finalmente anoitece.
Ajustar
as buscadoras. As coisas começam a não dar tão certo...
E agora
o bendito do alinhamento. Será que a “reticulada” vai funcionar? Faltava ainda
iluminar o reticulo. Meu plano era realmente mambembe. Com minha lanterna de
led vermelha presa a aranha do secundário eu iluminava o reticulo. O problema
era que as estrelas que eu utilizaria para o alinhamento teriam que ser bem
brilhantes. Curiosamente a ocular até que funcionou. Já o alinhamento polar nem
tanto. Nem tanto até demais...
A parte
boa é que meu projeto continua na prancheta e creio que o próximo “protótipo” é
promissor...
Era dia
de improvisar e com minha cunhada instalando luminárias novas pela casa o meu
projeto começa a desandar ( como eu disse quanto mais gente por perto pior para
observar...). Assim após ver que era possível fazer o drift com a reticulada eu
desisto de tanto elaboração e parto para a ignorância.
Faço
algumas fotos de Ngc 6231 em Escorpião. Um horror . Em vez de me comportar da
forma certa e recolocar a “nova ocular”
e refazer o drift eu prefiro ir por tentativa e erro. E abro uma cerveja...
M7 |
Ao
final da noite tinha algumas fotos medíocres de 6251 e de M28. M7 também foi
vitimado pelo autor... Pelo menos 6251 e M7 fazem parte do catalogo Lacaille. Respondem respectivamente pelas entradas Lac II. 13 e Lac II. 14.
M 28 |
Ngc 6231 |
Como
bônus M71 foi um objeto que avistei assim meio que por acaso. Não me recordo de
já o ter avistado antes. E como se
encontrava naquela posição que foi responsável
pela criação da palavra “incomodo” eu desisti de fotografa-lo. Definitivamente
cabeças equatoriais e objetos muito próximos ao meridiano são inimigos mortais.
Por
fim, já com a coluna cansada de malabarismos junto a ocular com DSO´s que vão
agora próximos ao zênite pego meu
binóculo mais novo e me deito em uma canga. E faço um tour clássico. Começo
pela cauda de escorpião com M7 e M6 no mesmo campo binocular. E aí é só seguir
a corrente. A partir do Bico da chaleira ( asterismo que identifica a constelação de Sagitário): Ngc 6522 , M28 , M22, M8 , M21, M20.
Um pulo para o outro lado do rio galáctico e M 17, M18 , Ngc 6605 e mais vários aglomerados abertos e
globulares que não me dou ao trabalho de identificar ( M25 e M23 liderando o
pelotão..). Depois tento os Globulares Messier mais discretos que se escondem
embaixo da chaleira. M69, M70 e M54. Pequenas estrelas que nunca dão foco. Mas
são alvos para mais abertura.
No
final entre mortos e feridos salvaram-se todos . E a noite foi divertida.
Quanto
a meu plano inicial eu me consolo que tudo estará lá pelo menos durante o próximo
milhão de anos.
No dia
seguinte o tempo fechou e voltei para casa e para prancheta. Espero mostrar em
breve minha “nova” ocular com reticulo iluminado “home made”. Agora com 10 mm e com um Led vermelho no proprio corpo da ocular. Quase de verdade...
P.S. - Quando já entrava no carro para retornar para o lar Murphy mandou seu recado. O
tempo limpou como que por mágica. Mas aí já era tarde para abortar a missão.
Tiro uma foto da Lua como consolo. Pelo menos desta vez não vi varios riscos cruzando a foto...
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