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terça-feira, 4 de outubro de 2016

Corona Australis e o Céu Profundo

          

          Corona Australis  é uma constelação de  elegância discreta. Espremida entre as ostentadoras e zodiacais Sagitário e Escorpião    e com suas estrelas mais brilhantes atingindo não mais que magnitude 4.1 ela não chega a se destacar. Mas seu formato é evidente e esta é uma  das 48 constelações listadas por Ptolomeu no seculo II.  Os antigos gregos não percebiam uma coroa. Para estes ela mais se parecia com uma grinalda e a associavam a Sagitário ou a Centauros. 
                Sua estrela mais brilhante é Alpha CrA. Esta é a única estrela na constelação que recebe um nome próprio. Alfecca  Meridiana. Sua 11 estrelas mais proeminentes foram destacadas pelo padrinho do Nuncius Australis , o Abbe Lacaille, que utilizou as letras gregas de Alpha até Lambda para as registrar. Por alguma razão desconhecida o mesmo designou duas das estrelas de CrA como Eta e omitiu Iota...
                Apesar de disputar com duas das constelações mais ricas em DSO´s dos céu Corona Austrina ( seu outro nome...) possui peças dignas de nota e uma notável região.  Ela possui um adas regiões de formação estelar mais próximas do sistema solar.  Uma poeirenta e escura nebulosa denominada de "Nuvem Molecular de Corona Australis". Por isto a nossa discreta e educada Coroa possui diversas estrelas e proto estrelas muito especiais e no começo de suas vidas. R e TY CrA são dois tipos de variáveis que são modelos clássicos de estrelas que estão ainda assentando a sequencia principal.  A Região é rica também em nebulosas de reflexão que são alimentadas por estrelas jovens e sem massa suficiente para criarem nebulosas de emissão. Na região também se encontram diversos objetos Herbing-Haro ( proto estrelas).
                Registrei ainda que de forma tímida e preguiçosa uma das áreas da constelação de maior interesse para astrônomos amadores. Nesta pequena area de menos de 1ox1o  se encontram diversos DSO´s de características diferentes e todos bastante atraentes para pequenos telescópios.
                Na foto de abertura  podemos perceber claramente Ngc  6723 ( um aglomerado globular) ,Ngc 6726-27 (nebulosas de reflexão)  e  Ngc 6729 ( Nebulosa variável) de forma mais discreta. Se esconde ainda IC 4812.
                Ngc 6723 curiosamente escapou as observações de Lacaille. E este apesar de utilizar um refrator minusculo ( 8X 12,5 mm) descobriu globulares bem mais difíceis de serem observados e percebidos .  Desta forma sua descoberta teve que esperar por Dunlop iniciar seu levantamento em Paramatta , Nova Gales do Sul na Austrália. Este é a entrada 559 de seu catalogo e foi avistado em 3 de Junho de 1826.
                Ele escreveu: " Uma bela nébula arredondada e brilhante , com 3  1/2´ de diâmetro , moderada e gradualmente condensada e para o centro.  Ela se resolve. A moderada condensação e a cora azulada das estrelas que o compõe lhe dão  uma aparência suave e agradável. É muito difícil de se resolver ainda que a condensação não seja muito grande."  
                Segundo Glen Cozens  em sua tese de Phd " An analysis of the first Three Catalogues  of Southern Star Clusters and Nebulae" o telescópio de Dunlop teria o mesmo poder de fogo de um moderno refletor de 150mm. E desta forma o que percebo com o "Newton"  em muito se assemelha ao que o "Astrônomo Cavalheiro" viu.

                Ngc 6723 é um globular muito antigo. Sua metalicidade esta no limite inferior dos globulares . Trata-se de um Globular do bojo galáctico com  cerca de 1/16  do ferro presente no Sol ( por atomo de hidrogênio). Isto indica que ele se formou em um momento em que a história química do universo ainda estava nos primórdios.  Sua metalicidade combina com a variáveis RR Lyrae que habitam  bojo. A idade idem. Isto nos leva até 13.5 bilhões de anos atrás quando o bojo galáctico estava se formando e os disco espirais que hoje enfeitam nossa galaxia sequer existiam.  Acredita-se que  a formação do bojo galáctico levou cerca de 8 bilhões de anos.
                Muito próximo de Ngc  6723 esta Barnes 157, uma nebulosa escura e parte da Nuvem Molecular de CrA. Pelo menos para quem as observa. Barnes 157 esta a meros 420 anos luz da nós enquanto 6723 esta a  29.000 anos luz.    Esta proximidade ajudaria a sustentar uma hipótese defendida por William Herschel que embora equivocada é bastante poética e faz parte da evolução da cosmologia.  Herschel , no seculo XVIII, tivesse visto Be 157 e Ngc 6723 iria denominar a escura nebulosa como mais um Loch im Himmel  , um buraco nos céus , "um curioso vazio através do qual parecia que navegamos por um infinito ininterrupto". Herschel achava uma coincidência que estes vazios encontravam-se frequentemente próximos a a ricos aglomerados. Ele suspeitava que estes aglomerados coletavam o seu material destas regiões e deixavam para trás estes vazios.  Ele considerava o conjunto de   Rho Ophiuchi com M 80 um modelo padrão. Tivesse ele avistado 6723 e e Be 157 provavelmente suspeita iria fortalecer-se.
                Ngc 6726-27(descoberta por Julius Schimdt em 1861)   e Ngc 6729 são nebulosas de reflexão que  me recordam muito M 78 em Orion. Nebulosas de reflexão são uma das faces que regiões de formação estelar podem tomar.   Alimentadas por TY Corona Australis e  R Corona Australis , um interessante objeto que é melhor observado em infravermelho e que trata-se de uma protoestrela que continua acretando material e que tem a luz de HIP 93425 e HiP 93371 ( ambos sistemas múltiplos)  participando da brincadeira  vemos uma das  nebulosas de reflexão  mais fáceis de serem observadas no céu. ( M 78 é a mais fácil...) .
                Esta é uma região de formação estelar.  Neste caso especifico temos estrelas de massa intermediaria se formando. ( menos de 10 massas solares) que nunca alcançarão temperatura suficiente para fissão do Ferro. As estrelas no extremo desta categoria poderão terminar sua vida como supernovas mas a maioria ( entre 7 e 2 massas solares)  jamais viverá este fim tão glorioso.  Estas não atingirão temperaturas para queimar nada muito mais complexo que Helio. Mas devido a suas interações com a física , a química e o universo elas criarão nos inicio de sua vidas belas nebulosas de reflexão. Sem força suficiente para ionizar suas bandas do universo e emitindo  a maior parte de sua energia no parte azul e ultravioleta do espectro elas vão formar belas nebulosas de reflexão ao se relacionarem com a matéria interestelar poeirenta de suas matrizes. Um processo parecido com o que faz nosso céu azul.  Diversas destas Nebulosas se espalham por Be 157 e por estas plagas do universo.
Esta foto passou por menos pós processamento e ée bastane semelhante ao que você verá com uma buscadora wide field ( no meu caso uma Plossl 26 mm) 

                Ngc 6729 , embora seja a  mais discreta em nossa foto, é uma das favoritas de Sir Patrick Moore e a entrada de numero 68 de seu Catalogo Caldwell. Foi o ultimo DSO a ser descoberto de nossa lista até o momento.  Não só escapou de Dunlop como de John Herschel e só foi descrito por Alberth Marth também em 1861 com o uso de um telescópio de 48 polegadas.
                6729 assim como R Corona Australis é uma variável. Uma nebulosa variável cujo o brilho de superfície varia. Sua estrutura também é bem dinâmica. Em fotos feitas entre Junho de 1920 e agosto de 1921 demonstram clara mudança de brilho e formato da nebulosa. Seu brilho pode apresentar modificações em menos de 24 horas. Estrelas pré sequencia principal são bem temperamentais...
                Localizar todos os DSO aqui descritos é bem fácil. Ache Epsilon CrA. E com uma ocular wide field estarão todos lá . E mais alguns convidados.

                Corona Australis é uma pequena constelação riquíssima em DSO´s bastante interessantes tanto pelo desafio observacional como por sua importância cosmológica.

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