Três
horas depois de sair do Rio já me encontrava em frente a sede da Sociedade
Musical Euterpe Lumiarense (que desrespeitando
o fluxo temporal foi fundada muitos anos
antes do Beto Guedes nascer) aguardando a proprietária da casa que eu tinha
alugado para ela nos guiar até a mesma.
Eu
querendo acreditar que com a virada da lua a meteorologia ia mandar as borboletas da Tailândia
baterem as asas e este que vos escreve iria poder testar as novas lentes que
havia ganho de seu cunhado. Este as tinha herdado de seu irmão e não tinha
nenhum uso para as mesmas.
Como
o objetivo principal era testar as lentes e a expectativa climática estivesse
mais na casa da simpatia que propriamente da ciência achei melhor ressuscitar o
“Galileo” (um refrator Celestron de 70 mm f13) do que levar o Newton. E assim
fomos eu, Galileo, uma Pentax ED 300 mm f4.5, uma Takumar 70-210 f 4, uma
Vivitar 70-150 mm f3.8 e um Pentax 50 mm f1.7. Mais um anel adaptador e minha
Canon T3. A Pentax PZ1 que veio junto com as lentes foi também, mas ainda está
aguardando eu me dignar a comprar baterias novas para fazer uma experiência “vintage”
e tirar algumas astro fotos com película...
A
chegar na casa me lembro que fotos não são reais e que o local não se presta
para astrofotografia. Postes e vizinhos demais em algo bem diferente do
imaginado pelas fotos do site...
Mas
tudo bem. O plano desde o começo era fotografar de um camping perdido no km 2
da estrada Serra-Mar (RJ-142). Um local adorável. Com uma vista alucinante para
a Pedra Riscada. Céus Bortle 3-4. Tinha estado lá no início de janeiro e já
vislumbrara o potencial do local.
Mas
sabem como é o Carnaval... Um leitão a Pururuca, muita cerveja e umas pingas me
levaram a conhecer a “Vingança de Barnabé”. Esta é a versão local da temida “Vingança
de Montezuma”. Uma tremenda dor de barriga que me fez antecipar a quaresma em
quatro dias e passar o carnaval mais sóbrio desde meus 13 anos. Evidentemente
que ao entardecer as borboletas bateram asas na Tailândia, Taipei, Laos e na Birmânia
também.
Felizmente
elas começaram a fazer isto todos os fins de tarde durante os próximos dois
dias. Na segunda de Carnaval eu finalmente consigo montar o kit todo e depois
de deixar a cara metade e as crianças em um projeto de baile infantil sigo para
o camping. Já tinha feito todo o trabalho de diplomacia e tendo doado um
exemplar do “O Sul Profundo: O Catalogo Lacaille” para a simpática proprietária
sou autorizado a me instalar na parte alta do terreno (que dispõe de energia elétrica)
e montar meu “observatório”.
Não
poderia ser tão fácil. Claro que esquecera o bridge plate para instalar a câmera
com as lentes diretamente em Mlle. Herschel (uma montagem HEQ 5 pro da
Skywatcher). Como a necessidade é a mãe da invenção rapidamente projeto um
sistema que apesar de bastante rustico se revela extremamente eficiente. Com um
parafuso de ¼, duas porcas, um nível de marceneiro e gaffer tape (uma “irmã”
high tech” da fita crepe) consigo acoplar a câmera ao Galileo de forma
eficiente e estável. Pela foto pode parecer difícil de acreditar, mas
funciona...
Tenho
um período de alforria relativamente curto. São 7 da noite e já estou com tudo
montado. Faço algumas fotos “artísticas” da locação e me preparo para testar as
lentes na “difícil arte”. Com o céu quase no twilight astronômico eu encaixo a
Pentax 50 mm f1.7 e fecho um stop. O primeiro alvo já estava definido. Faço um
alinhamento polar meio Mandrake e depois utilizo Sirius e Achernar para regular
o Synscan ( go-to ) de Mlle. Herschel. Isto
é feito utilizando uma ocular 25 mm no Galileo.
O
céu já começa a se apresentar magnifico. Apesar de na chegada haverem nuvens em todo quadrante oeste tudo indica que as borboletas estavam ficando bem agitadas e ainda soprando ao anoitecer. As Nuvens de Magalhães e diversos
outros objetos “difíceis” de céus pouco generosos se tornavam evidentes a olho nu mesmo
com visão direta. Fazia tempo que não as via assim. A Grande Nuvem mais
evidente que a Pequena. Tuc 47 claramente uma “estrela” enevoada. A Via Láctea
cheia de estrutura. Um espetáculo.
Seguindo
a derrota planejada ataco a Grande Nuvem de Magalhães. A lente se revela
soberba e com uma distância focal de apenas 50 mm o alinhamento polar se revela
a altura. Realizo pouco mais de 2
dezenas de exposições e já sei que não perdi a viagem...
Agora
estou ansioso para testar a 300 mm. Esta uma joia. Meu objetivo inicial seria a
Roseta (C 50 ou Ngc 2244) mas ela se encontra muito próxima ao meridiano e não
vai rolar. Decido me manter no horizonte sul e revisitar um clássico. A nebulosa de Eta Carina.
Mas
antes disto minha anfitriã aparece e preciso mostrar algo rápido. Lá vamos nós!
Plêiades!! São infalíveis junto aos curiosos. Ela e o marido ficam fascinados.
Felizmente o camping vai bem cheio e estes estão exaustos e assim após alguns
minutos de Plêiade, prosa e alguma constelações seguem seu rumo.
De
volta a Eta Carina faço de novo uma dezena e meia de exposições e já sei que
nunca a fotografei assim. A lente é maravilhosa. E o céu idem. Vai ficar bom.
Mesmo posteriormente realizando um drizzle 3X de Ngc 3324 de uma borda da imagem
o perfil de Gabriela Mistral parece se apresentar em meio ao ruído.
Infelizmente
com minha alforria terminando e eu querendo testar todas as lentes parto para a
Vivitar. Faço uma imagem de M 42 com esta @ 150 mm e percebo que as borboletas
estão cansando e que esta lente não é do mesmo naipe que as outra. Mas ainda
resolvo dar ais uma chance a mesma e com esta @ 70 mm tento fazer uma composição
mais clássica. Em homenagem ao Barnabé que batiza a minha maldição fotografo o Acrux
e a Via Láctea brotando por trás do “Morro do Barnabé”. Tudo bem que se trata de um composite e que
ainda não dominei bem a técnica ( nem mal ...) mas a lente parece não ter , de fato, a mesma
qualidade das anteriores. O drizzle que tentei de Lambda Cen com as capturas
dela fico muito sofrível. Mesmo esta estando bem mais no meio do quadro.
Especialmente se comparado ao drizzle de Ngc 3324 feito a partir das imagens
obtidas com a PentaX 300mm e na bordinha do quadro. Tudo
bem que estava tudo muito baixo no horizonte e etc.. Mas ela é inferior também à minha Canon 70-300
mm embora seja mais clara.
Minha
alforria acaba e a Takumar vai ter que esperar por outro dia para ter sua
chance...
Recolho
tudo rapidamente e vou encontrar a família já no centro da cidade.
Depois
disto ainda continuo sendo levemente incomodado por “Barnabé” e as borboletas
do Triangulo Dourado entram em greve. A parte astronômica da festa acabou para
mim.
A
Vingança de Barnabé é um violento desarranjo que se abate aos que chegam a
Serra muito afoitos. Geralmente é antecedida por muita gordura e cachaça. Conta
a lenda que Barnabé foi um grande catador de Açaí da região que acabou sendo
expulso de Lumiar pela especulação imobiliária pós a refundação desta por Beto Guedes. Ele sumiu e foi visto a última vez para as bandas de Macaé de Cima,
mas antes conjurou esta que se apresenta como uma febre estomacal violenta tendo
como trilha sonora todo o Clube da Esquina . Ela é mais leve que a Vingança de
Montezuma . Lembrado que este perdeu não só todo um império para os espanhóis
com terminou morto e não apenas assombrando as matas da parte mais alta de uma
linda Serra.
Com o tempo nublado sempre se pode caçar passarinhos...
Com o tempo nublado sempre se pode caçar passarinhos...
Beija Flor Fonte Violeta |
Bet te Vi |
Canario da Terra |
Coleiro |
Na natureza selvagem minha filha foi picada por algum inseto ou aracnídeo peçonhento e
decidimos terminar a temporada na Serra na casa da Avó de minha mulher. Não sem
antes passar no hospital onde a filha entrou no antibiótico e o pai e Barnabé foram postos para
cumprir a quaresma de fato. 40 dias sóbrio, cinco dias comendo como um brâmane
e muito Floratil. O carnaval foi bom... E o Camping Cantinho Doce fora de temporada
deve ser um dos melhores locais para se observar em um raio de muitos quilômetros
do Rio de Janeiro. Céus escuros, boa estrutura e alojamento que vai desde
barracas até pequenos chalés. A Aporema de Outono já tem endereço.
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