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quinta-feira, 14 de junho de 2018

M 20 : A Trífida e o Síndico


              M 20 é a Nebulosa Trífida. Uma das grandes damas da noite. Sua imagem é uma das mais icônicas da astronomia. Ícone é algo ou alguém que se distingue ou simboliza determinada época, cultura, área do conhecimento; imagem ou ídolo: a Guernica é um ícone do cubismo.

                M 20 é uma das representações, por excelência, de um DSO. Sua foto ilustra centenas ou milhares de artigos, capas de revista e o imaginário de todo e qualquer amador na astronomia.  Algo semelhante a nebulosa da águia e os pilares da criação (provavelmente a foto mais famosa do Hubble e da história da astronomia.  E assim como esta é muito melhor nas fotos do que a vivo. Uma modelo....
                No ultimo post do Nuncius Australis falei de M 21 e expliquei que não poderia falar de um sem falar de outro. Mas talvez pudesse até ter pulado M 21. Já a Trífida seria imperdoável.
                Missão dada missão cumprida. Vamos falar de M 20 com toda a atenção que esta merece. Este é um daqueles posts que foi até adiado devido a importância da moça. Algo com M31. Já até abordei o assunto, mas acabei me concentrando mais no seu entorno (a Nebulosa Porter-Mason) do que na sua parte mais nobre. Quem tem c... tem medo.

                Quem leu o post anterior sabe que M 20 reside e torna (em conjunto com a obra) esta região em Sagitário uma das mais dramáticas e lindas do céu. A Avenida Rio Branco da Via Láctea. A olho nú (e em locais escuros) ela faz par com M 8 (A nebulosa da Lagoa. Outra diva.) e com diversos abertos e campos estelares que tornam até difícil saber quem é quem. Ao contrario da Lagoa M 20 é pequena. Uma moça mais recatada. Porém de beleza muito delicada e traços incomparáveis. Uma DSO (gênero é algo ultrapassado hoje em dia...) de vários DSO`S. E não consigo imaginar a Trífida como algo diferente de uma musa.
                Como uma diva ela não revela seus segredos e nem seus agudos sem algum esforço. Me lembro até hoje (vão anos) da primeira vez que a vi. Ela não me deu muita bola e assim como Messier não percebi todos seus encantos. Ele é enganado por seu modesto telescópio e diz apenas “Aglomerado de estrelas, logo acima da eclíptica, entre o arco de Sagitário e pé direito de Ophiuchus.” Na sua descrição de M 21 ele fala de alguma nebulosidade envolvida.
                M 20 foi, provavelmente, observada anteriormente por Le Gentil em 1747. Messier a conheceu em uma noite especialmente feliz onde ele registrou ainda M 21, M19 e M 22.
                Sua experiencia (quero acreditar) foi muito parecida com a minha. Partindo de Kaus Australis fui navegando para oeste e esbarrei no caminho com M21. E obrigatoriamente cheguei também a M 20. Eram tempos do “Galileu” (meu Celestron 70 mm). Bambo que nem bambu em uma Eq 1. Ainda bem verde já sabia onde estava e treinei minha “averted vision”. Provavelmente influenciado pelas fotos que já tinha visto percebi alguma nebulosidade no que mais parecia uma estrela dupla. M 21 não me enganou e percebi apenas um aberto. Definitivamente não parecia as fotos do Hubble. A nebulosa escura que recorta a paisagem e empresta seu nome a dama não estava lá. Embora eu quase acredita-se nisto. Troquei a ocular pela 10 mm. Uma Kelner tabajara. Maior, mas sem nenhuma novidade. Como quem nunca comeu melado quando come se lambuza achei a paisagem sensacional.  Segui viagem e M 8 roubou o show.
                Tempos depois e já com o Newton (um refletor 150 mm) voltei a região e com os céus mais escuros (mas nem tanto) de Búzios e maior poder de fogo consegui perceber seu charme. Mesmo assim com muito tempo de observação e muito mais experiencia junto a ocular. E não eram as fotos do Hubble.
                Como disse as duas grandes musas são modelos fotográficos. E finalmente eu fotografei M 20. Continuou não sendo Hubble. Mas a Trífida se fez presente e merecedora de tanta seda rasgada.

                Visualmente ela é pequena e em escala de cinza. E/ou meu telescópio é pequeno (ele é). Mas é a Trífida. Percebe-se sua natureza e em céus escuros sua extensão (a Nebulosa Porter Mason) se faz presente e por um truque de contraste percebe-se até alguma cor...
                M 20 tem paternidade discutida. A Maioria dos autores concorda que Le Gentil observou a mesma enquanto inspecionou M8 (facilmente percebida a olho nu e um dos pontos mais brilhantes da Via Láctea). Stoyan defende que Messier é o pai da criança.  Já sua personalidade tripla parece ser percebida por John Herschel. Autores clássicos e habitantes do hemisfério norte (e possuidores de acromáticos) não fala nada a respeito (Smith e Webb). Herschel (filho) observou do hemisfério sul e com um refletor muito maior...  Ele foi quem batizou a criança. É o padrinho da Trífida. E a descreve assim; “... consiste de 3 massas nebulosas e irregulares gradualmente mais brilhantes em direção ao centro onde encapsula um forcado ou uma área vazia abruptamente sem luz como um vazio na nébula.... Uma linda estrela tripla é situada exatamente na borda de uma das massas nebulosas exatamente onde o vazio se bifurca em dois canais”.
                Burnham nos conta que sua estrutura Trífida é facilmente percebida com um telescópio de 200 mm. Com meu 150 ele é evidente com 120 X de aumento e em locais relativamente escuros. Do Rio de Janeiro é preciso muita fé...
                M 20 consiste de duas estruturas basicamente. A Trífida propriamente dita, que brilha intensamente em Ha e é uma nebulosa de emissão e um halo azulado (a Porter Mason) que é uma nebulosa de reflexão. A Trífida é a nebulosa de emissão e uma parente próxima de M 42 (a Grande Nebulosa de Orion). Porém muito mais jovem. A maior parte de suas estrelas nascituras continua escondida no escuro. Este aglomerado secreto não possui mais de 500.000 anos. Sua área ocupa algo como 15 anos luz e apesar de discussões parece se encontrar mais próxima que o entorno. Mas há divergência entre as fontes. Ela não pertenceria a imensa aglomeração OB de Sagitário. Estaria do lado oposto do braço de M 21. Em fotos do Hubble se perceba vários EGGs. Embriões de estrelas. Um local bem animado...

                Pela buscadora M 20 é um pequeno borrão em volta de uma brilhante estrela. Mas com M 21 para indicar o caminho é um alvo fácil. Conforme se vai aumentando o poder de fogo mais impressionante ela se torna. Céus escuros ajudam muito.
                Como modelo é uma delicia de se fotografar. Já fiz varias experiências. Atualmente resolvi levar astrofotografia mais a sério. Será alvo de uma expedição em breve. As fotos aqui apresentadas são fruto de algumas sessões observacionais, mas, sem muito compromisso. Estou vivendo uma história de amor com o PixInSight e creio que vá passar a fazer capturas mais a sério. Mesmo porque não preciso mais observar 40 objetos por noite. O fim da infância...
                 Uma das grandes damas da noite mesmo sem se apresentar. Uma diva com jeitão de Tim Maia...
- Vai Banda Vitória Régia. 
(Para quem não teve o prazer de ver o sindico se apresentar (vi 4 vezes) em noites ruins ele abria o show, mandava a banda arrebentar e voltava só para fechar o espetáculo. Dos quatro, três foram a sério. O outro foi a banda que tocou. Arrebentava...)

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