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quinta-feira, 10 de outubro de 2019

M 105 : A Galáxia Bastarda de Messier


            

        O quingentésimo post do Nuncius Australis é um marco. Nunca esperei chegar tão longe. Depois de meses sem nenhuma produção achei que era hora de ressuscitar o blog. Realmente os tempos atuais não têm me animado muito a escrever. Observo um crescente descrédito as coisas da ciência e uma profunda desinteresse entre a população. Para piorar é política pública declarar que a ignorância é tão boa quanto o saber.  E que educação é a mesma coisa que ideologia.
            Como não é, em um esforço  "dessassosegado" quase digno de Pessoa para despertar em sua “Floresta do Alheamento”, eu decidi que apesar do pouco alcance deste blog é um trabalho que deve ser feito e que se alcançar um jovem que seja já será valido em tempos tão cinzentos.
            Desta forma chegamos a primeira entrada realmente duvidosa do Catálogo Messier. É aceito por todos os autores clássicos e mesmo alguns mais modernos que Messier certamente observou todas as entradas de seu catálogo até a de número 104. Mesmo que a maior parte das contribuições mais tardias tenhas sido descoberta de Méchain.

            A sua entrada no catálogo Messier como conhecemos hoje foi uma invenção da Astrônoma americana nascida canadense Helen Sawyer Hogg. Ela inclui M 105, M106 e M 107 ao catálogo em 1947.  Ela descobriu uma carta datada de 6 de maio de 1783 de Méchain para Bernoulli onde o autor diz: “O senhor Messier menciona nas páginas 264 e 265 duas estrelas nebulosas as quais descobri (M 95 e M 96). Não achei nada a corrigir sobre a suas posições as quais determinei a partir de Regulus.  Há, entretanto, uma terceira mais ao norte que é ainda mais vívida que as duas precedentes. Esta descobri em 24 de maio de 1781, quatro ou 5 dias depois das duas primeiras.”
            Hoog rapidamente identificou a descoberta de Méchain com Ngc 3379. O resto é história.
            Apesar de Méchain considerar M 105 um alvo mais fácil que M 95 e M 96 eu particularmente acho que o jogo é empatado. Nenhuma delas é alvo visual fácil e um local escuro é fundamental para sua observação visual. M 105 é um a galáxia elíptica o que, geralmente, torna seu brilho de superfície um pouco mais amigável que galáxias espirais. Mas não espere detalhes nem mesmo com telescópios bastante robustos.  
            M 105 possui duas discretas companheiras em seu campo e forma um mini tripleto. Parece ser uma tradição pelas bandas de Leão. Mas não se deixe enganar. Embora M 105 e Ngc 3384 sejamhabitantes do mais próximo grupo de Galáxias Leo I o terceiro membro (Ngc 3389)habita o muito mais distante Grupo Leo II. Sua aparente proximidade é apenas umalinhamento casual.
            Herschel descobre M 105 de forma independente em 11 de março de 1784.
            Smyth no clássico Cycles of Celestial Objects cita M 105 em sua entrada a respeito de  Ngc 3384 ( o que demonstra que não se trata de um showpiece)  : “ Um par de nebulosas  brilhantes, sp [sul precede, SO] e nf [norte segue, NE] um do outro, na barriga do leão, descoberto por  William Herschel em março de 1783 e nº 758 (NGC 3384) no catálogo de seu filho; enquanto que a uma pequena distância da nf [norte segue, NE] é uma estrela dupla, porém limpa, minuciosa. Estas são duas das três nebulosas descritas por ambos Herschels [Messier 105 e NGC 3384]; mas o terceiro [NGC 3389] não posso distinguir, a menos que seja um brilho no sf [sul segue, SE], em uma linha vertical com duas pequenas estrelas. Agora nos aproximamos de uma região onde essas misteriosas massas luminosas estão espalhadas pela vasta concavidade dos céus, em profusão verdadeiramente ilimitada; e neles, todos os verdadeiros herschelianos devem ver poderosos laboratórios do universo, nos quais estão contidos os princípios dos futuros sistemas de sóis, planetas e satélites!”
            Podemos perceber pela descrição de Smyth a quantas andava a cosmologia no século XIX. A hipótese nebular de Herschel era o que havia de mais moderno e a verdadeira natureza das galáxias ainda era algo mais próximo a filosofia que a astrofísica. Kant tinha um palpite bem melhor ...


            Para localizar M 105 a receita de Smyth é perfeita e dispensa novos adendos. Mas eu confesso que demorei anos até localizá-la visualmente. É um alvo fotográfico bem mais amigável.
M 95 , M 96 e o tripleto de M 105

            O Meara em seu “Deep Sky Companions: The Messier Objects” faz uma descrição bastante apaixonada de M 105 e a considera “uma elegante elíptica ... é talvez o mais “puro” dos objetos do catálogo Messier.  Por isto compreendo que seu disco levemente ovalado apresenta a menor soma de imperfeições.  Lógico que com meros 4´não há muito espaço para imperfeições. Para nossos olhos M 105 reside apenas 1o norte e levemente a leste de suas companheira M 95 e M 96. Mas na realidade se encontra a 400:000 anos luz destas”. Mas apesar do comentário todas são membras de Leo I e em termos galácticos vizinhas bem próximas. Com pequenas ampliações é possível espremer o trio dentro de um campo ocular.


            Burnham em seu “Celestial Handbook” fala brevemente em M105, mas não considera esta uma entrada valida no catálogo Messier. Ele encerra esse em M 104.
             Todas as fotos aqui apresentadas têm como matriz uma captura de 30X 45 segundos ISO 1600 com uma lente Pentax 300 mm f 3.5. As imagens foram empilhadas no DSS e posteriormente esticadas no PixInsight.