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quinta-feira, 10 de outubro de 2019

M 105 : A Galáxia Bastarda de Messier


            

        O quingentésimo post do Nuncius Australis é um marco. Nunca esperei chegar tão longe. Depois de meses sem nenhuma produção achei que era hora de ressuscitar o blog. Realmente os tempos atuais não têm me animado muito a escrever. Observo um crescente descrédito as coisas da ciência e uma profunda desinteresse entre a população. Para piorar é política pública declarar que a ignorância é tão boa quanto o saber.  E que educação é a mesma coisa que ideologia.
            Como não é, em um esforço  "dessassosegado" quase digno de Pessoa para despertar em sua “Floresta do Alheamento”, eu decidi que apesar do pouco alcance deste blog é um trabalho que deve ser feito e que se alcançar um jovem que seja já será valido em tempos tão cinzentos.
            Desta forma chegamos a primeira entrada realmente duvidosa do Catálogo Messier. É aceito por todos os autores clássicos e mesmo alguns mais modernos que Messier certamente observou todas as entradas de seu catálogo até a de número 104. Mesmo que a maior parte das contribuições mais tardias tenhas sido descoberta de Méchain.

            A sua entrada no catálogo Messier como conhecemos hoje foi uma invenção da Astrônoma americana nascida canadense Helen Sawyer Hogg. Ela inclui M 105, M106 e M 107 ao catálogo em 1947.  Ela descobriu uma carta datada de 6 de maio de 1783 de Méchain para Bernoulli onde o autor diz: “O senhor Messier menciona nas páginas 264 e 265 duas estrelas nebulosas as quais descobri (M 95 e M 96). Não achei nada a corrigir sobre a suas posições as quais determinei a partir de Regulus.  Há, entretanto, uma terceira mais ao norte que é ainda mais vívida que as duas precedentes. Esta descobri em 24 de maio de 1781, quatro ou 5 dias depois das duas primeiras.”
            Hoog rapidamente identificou a descoberta de Méchain com Ngc 3379. O resto é história.
            Apesar de Méchain considerar M 105 um alvo mais fácil que M 95 e M 96 eu particularmente acho que o jogo é empatado. Nenhuma delas é alvo visual fácil e um local escuro é fundamental para sua observação visual. M 105 é um a galáxia elíptica o que, geralmente, torna seu brilho de superfície um pouco mais amigável que galáxias espirais. Mas não espere detalhes nem mesmo com telescópios bastante robustos.  
            M 105 possui duas discretas companheiras em seu campo e forma um mini tripleto. Parece ser uma tradição pelas bandas de Leão. Mas não se deixe enganar. Embora M 105 e Ngc 3384 sejamhabitantes do mais próximo grupo de Galáxias Leo I o terceiro membro (Ngc 3389)habita o muito mais distante Grupo Leo II. Sua aparente proximidade é apenas umalinhamento casual.
            Herschel descobre M 105 de forma independente em 11 de março de 1784.
            Smyth no clássico Cycles of Celestial Objects cita M 105 em sua entrada a respeito de  Ngc 3384 ( o que demonstra que não se trata de um showpiece)  : “ Um par de nebulosas  brilhantes, sp [sul precede, SO] e nf [norte segue, NE] um do outro, na barriga do leão, descoberto por  William Herschel em março de 1783 e nº 758 (NGC 3384) no catálogo de seu filho; enquanto que a uma pequena distância da nf [norte segue, NE] é uma estrela dupla, porém limpa, minuciosa. Estas são duas das três nebulosas descritas por ambos Herschels [Messier 105 e NGC 3384]; mas o terceiro [NGC 3389] não posso distinguir, a menos que seja um brilho no sf [sul segue, SE], em uma linha vertical com duas pequenas estrelas. Agora nos aproximamos de uma região onde essas misteriosas massas luminosas estão espalhadas pela vasta concavidade dos céus, em profusão verdadeiramente ilimitada; e neles, todos os verdadeiros herschelianos devem ver poderosos laboratórios do universo, nos quais estão contidos os princípios dos futuros sistemas de sóis, planetas e satélites!”
            Podemos perceber pela descrição de Smyth a quantas andava a cosmologia no século XIX. A hipótese nebular de Herschel era o que havia de mais moderno e a verdadeira natureza das galáxias ainda era algo mais próximo a filosofia que a astrofísica. Kant tinha um palpite bem melhor ...


            Para localizar M 105 a receita de Smyth é perfeita e dispensa novos adendos. Mas eu confesso que demorei anos até localizá-la visualmente. É um alvo fotográfico bem mais amigável.
M 95 , M 96 e o tripleto de M 105

            O Meara em seu “Deep Sky Companions: The Messier Objects” faz uma descrição bastante apaixonada de M 105 e a considera “uma elegante elíptica ... é talvez o mais “puro” dos objetos do catálogo Messier.  Por isto compreendo que seu disco levemente ovalado apresenta a menor soma de imperfeições.  Lógico que com meros 4´não há muito espaço para imperfeições. Para nossos olhos M 105 reside apenas 1o norte e levemente a leste de suas companheira M 95 e M 96. Mas na realidade se encontra a 400:000 anos luz destas”. Mas apesar do comentário todas são membras de Leo I e em termos galácticos vizinhas bem próximas. Com pequenas ampliações é possível espremer o trio dentro de um campo ocular.


            Burnham em seu “Celestial Handbook” fala brevemente em M105, mas não considera esta uma entrada valida no catálogo Messier. Ele encerra esse em M 104.
             Todas as fotos aqui apresentadas têm como matriz uma captura de 30X 45 segundos ISO 1600 com uma lente Pentax 300 mm f 3.5. As imagens foram empilhadas no DSS e posteriormente esticadas no PixInsight.  

quarta-feira, 24 de julho de 2019

M 98 : Uma Galáxia na Contra-mão


                


         M 98 é alvo de uma disputa entre Stoyan e O’Meara. São estes os dois autores dos que considero os mais práticos guias para se observar o Catálogo Messier. São, respectivamente
, “Atlas of the Messier Objects: Highlights of the Deep Sky” e  “Deep Sky Companions: The Messier Objects”.
            Enquanto Stoyan defende que M 98 empata com M 91 entre as galáxias Messier mais difíceis de serem observadas visualmente O´Mera defende que M 98 é um refresco para os olhos dos observadores com equipamentos modestos que estejam batalhando entre os tênues alvos que abundam na região. Quase de perfil para nós e com um brilho de superfície na casa de 13.2 ela habita ali na zona de transição entre a matéria e a assombração. Mas me inclino em direção de O´Meara na questão. Ainda que discreta M 98 é um alvo mais fácil que diversas das galáxias com a face virada pra nós. Com a vista bem acostumada você perceberá sua natureza facilmente com o uso de visão periférica.  


         Diversas descrições históricas da galáxia nos darão clara ideia do que esperar junto a ocular em função do equipamento utilizado.  M 98 foi descoberta por Méchain em 1781 e foi confirmada por Messier e 13 de abril do mesmo ano. Ele a descreve como “uma nebulosa sem estrelas, de luz extremamente tênue, acima da asa norte de Virgem”.  Já William Herschel fala em “uma grande e extensa bela nebulosa. Sua posição demonstra essa ser a 98 de M. Messier, mas sua descrição indica que o cavalheiro não viu todo o conjunto, pois seus fracos braços se estendem por mais de ¼ de grau... meu campo não engloba exatamente toda nebulosa”. Já Smyth, com seu famoso acromático de 150 mm nos fala em “uma grande, mas bastante pálida... em se fixando a visão ela se acende em direção ao centro.”

     Atualmente gosto muito de utilizar o Lunginbuhl e o Skiff como fiel da balança entre o biônico O´Meara e o mais pessimista Stoyan. Minhas observações costumam concordar com as descrições da dupla no relativamente recente “Observing Handbook and Catalogue of Deep Sky Objects” de 1990.  Eles nos dizem que ela será uma visão interessante mesmo em um 60 mm. Já a percebi com meu 70 mm. É pouco mais que um esfuminho com cerca de 4´ por 2´ bastante tênue e sem indício de núcleo. Os mesmos nos dizem que com um 150 mm a galáxia e seu halo se estenderão por cerca de 6´por 2´ com leves condensações e grão em direção ao centro e percebe-se um discreto núcleo. No Newton (meu Refletor 150 mm f8) com 70X eu tenho uma visão semelhante a isso, mas percebo uma leve textura em uma das bandas. É possível que sejam espíritos de regiões HII onde estejam se desenrolado alguma ação.  
           M 98 é um membro do aglomerado de Virgem, mas tem suas excentricidades. Ela se encontra do lado “de cá” do aglomerado e sua velocidade radial é de apenas 125 km/s.  Ou seja, quase 1000 km/s mais lenta que a velocidade média do aglomerado. Não só isso ela possui blueshift. Ela se aproxima de nós. Isso levou a muitos acreditarem tratar-se de uma galáxia em primeiro plano. Mas atualmente se acredita que um encontro próximo a tenha jogado por esse caminho.  M 98 já foi caracterizada como um objeto transicional e é uma galáxia com características LINER.  Uma galaxia de núcleo ativo. Recomendo que cliquem no link para saber mais sobre esse tipo de galáxia e um tópico bastante interessante na astrofísica...

            Localizar M 98 é basicamente localizar a estrela Coma 6. E depois tirar esta de quadro para que não ofusque a tênue galáxia. Se você está navegando pelo aglomerado de Virgem suponho que já tenha dominado técnicas de Starhooping e possua já sua navegação ensaiada. Um bom dever de casa vai ajudar. Na região você ainda vai encontrar Ngc 4216 e seu tripleto. Uma das galáxias não Messier mais fáceis da região.  Céus escuros são mandatórios para um resultado prazeroso quando se passeando por esta região.

          Todas as fotos aqui apresentadas foram resultado de diversos processamentos utilizando o Deep Sky Stacker para o empilhamento das fotos. Posteriormente as fotos foram esticadas no PixInSight e tiveram alguma cosmética no Photoshop. Todas são resultado de uma captura de 20 fotos com 45 seg. de exposição em ISO 1600. Foi utilizada uma Canon T3 e uma lente Pentax 300 mm f 4.5. Montadas sobre Mlle. Herschel (uma montagem equatorial HEQ 5 Pro.). Foram aplicados 20 dark frames.  

segunda-feira, 8 de julho de 2019

Ngc 6281: O Aglomerado Asa de Mariposa



A região da cauda de Escorpião é uma das mais nobres vizinhanças galácticas. Projetada contra o ponto central da galáxia a região é lotada de mansões celestiais e grandes e belas construções.  Ngc 6281 escapou de Lacaille e Messier. Muitos anos mais tarde ele não foi incluído por Sir Thomas Moore em seu Catálogo Caldwell. Isto tudo nos levaria a supor tratar-se de um aglomerado aberto dos mais sem graça. Ainda mais em uma região tão nobre seria fácil acreditar que ele passaria facilmente desapercebido. Não é verdade. Apesar da má vontade de nossos clássicos observadores o Aglomerado Asa de Mariposa é um espetáculo em qualquer lugar do céu. Não faz feio mesmo comparado ao mais famoso e próximo Aglomerado da Borboleta (M 6) e ao ainda mais famoso Aglomerado de Ptolomeu (M 7).
Eu o observei pela primeira vez meio que ao acaso. Um daqueles DSO´s que tem gosto de descoberta. Embora você saiba que algo tão legal não poderia ter passado desapercebido por tanto tempo. Como já sei (em se tratando de objetos ao sul do equador celeste) provavelmente esse DSO´s já foi observado ou por Dunlop ou John Herschel...
Em uma noite fria (era julho de 2018. Essa foto ficou esquecida no HD por quase um ano...)  na Pedra Riscada eu caçava pela Nebulosa Pata do Gato e com o Go-to de Mlle. Herschel (minha montagem equatorial HEQ5) extremamente voluntarioso eu tentava o péssimo método da força bruta. Mandava-a em busca da Pata do Gato e com o telescópio apontando para algum local próximo tentava chegar até meu objetivo escaneando a região através de minha ocular de 40 mm. Geralmente não funciona. Mas em uma das diversas varreduras realizadas me deparei com o belo aglomerado e acabei por fotografá-lo. Posteriormente descobri de quem se tratava com o auxílio do Astrometry...

Ngc 6281 foi descoberto por James Dunlop em 5 de junho de 1826. É o mais brilhante aglomerado “não Messier” / “não Caldwell” nestas plagas.  Ele se tornou D 556 em seu catálogo de 1827.  Ele a descreve como “uma curiosa linha de bonitas estrelas curvas e brilhantes com muitas estrelas tênues misturadas.”
John Herschel depois utiliza “muito rico” e “muito brilhante”. De fato, o brilho de superfície do aglomerado bem alto o que leva O´Meara a dizer que este é um excelente desafio para observação a olho ‘nu.  Com cerca de 70 estrela até 13a magnitude e com o seu membro mais brilhante brilhando com magnitude 9 e com uma magnitude total de 5.4 é possível que seja verdade. Mas sempre considero que nosso amigo é muito otimista e talvez biônico. Provavelmente ambos.

M 6281 é um aglomerado galáctico de meia idade. Contemporâneo de M 7. Ambos têm entre 150 e 220 milhões de anos dependendo da fonte. O Aglomerado Asa de Mariposa é mais apagado e menor que seu vizinho mais famoso.  Localizado a 1800 anos luz ele se encontra bem mais distante de M 7 e bem mais próximo de M 6 (que se encontra apenas 200 anos luz mais próximo de nós).  Mas ainda como nos conta O´Meara ele tem aproximadamente metade do tamanho física do Aglomerado da Borboleta. Faz sentido. Enquanto M 6 é o Aglomerado da Borboleta e apresenta suas  duas asas abertas sobre a "Guanabara" Ngc 6281 se assemelha a apenas uma asa de mariposa. Aqui a lepidóptera se apresenta de asas fechadas. Ele se espalha por meros 4.2 anos luz de universo.
Uma bela estrela de 6a magnitude habita o flanco noroeste de Ngc 6281 (HD 153919) já foi considerada membro do aglomerado. Mas não mais. Trata-se de uma estrela muito jovem com meros 1 milhão de anos e estudos recentes sugerem que essa seja uma foragida de Ngc 6231. Esta de qualquer forma merece alguma atenção no quadro já que é uma binaria eclipsante e uma variável irregular ótica. O´Meara destaca que HD 153919 é a estrela que vai lhe guiar até A Mariposa e que  é também o grande empecilho para a visualização a olho nu do aglomerado. É difícil separar uma coisa da outra. Em céus não tão generosos inicia sua navegação em Mu Scorpii (dupla) e chegue até lá por starhoop. Não é difícil. O aglomerado se apresenta em uma buscadora 8X 50 facilmente.
No Newton (um refletor 150 mm f8) o aglomerado se resolve facilmente com 80X. Sua uma e suas estrela mais brilhante é uma dupla com a primaria de 9a magnitude e uma companheira na casa da 10a.  
A foto aqui apresentada é resultado de cerca de 10 exposições de 30 segundos com ISO 1600. Camera Canon T3 montada em foco direto sobre o Newton (150 mm f8). O Stack foi realizado no DSS e ela foi levemente esticada no PixInSight. 
Ngc 6281 é um dos mais charmosos aglomerados abertos de Escorpião e ainda por cima pouco visitado. Uma irresistível tentação...

quarta-feira, 26 de junho de 2019

M 87 e o Buraco Negro


            
             M 87 é um monstro. Em qualquer espectro que seja observada. É a maior galáxia do “Universo Próximo” e só é diminuída por IC 1101. Mas esta se encontra a mais de 1 bilhão de anos luz de nós. M 87 (ou Virgo A ou ainda “A Arma Fumegante”) se encontra “apenas “53 ,5 milhões de anos luz.
                Ela foi descoberta por Charles Messier na Nocte Nebulae.  18 de março de 1781. Nessa noite inesquecível Messier descobriu nada menos que oito nebulosas. Sete galáxias e um globular.

                M 87 é a maior galáxia do superaglomerado de Virgem, mas seu brilho é levemente inferior ao de M 49. Outra gigante e sua concorrente mais direta no universo local. Na verdade, na região ela disputa quase em condições de igualdade também com M 84 e M 86 para o observador visual.  O registro de Messier deixa isso bem evidente:
                “Nebulosa sem estrelas em Virgem, abaixo e muito próxima de uma estrela de 8a magnitude, as estrelas tendo a mesma Ascenção reta que a estrela e sua declinação é 13o 42´ 22´´. Esta nebulosa se apresenta com  a mesma luminosidade que as Nebulosas de numero 84 e 86”.
                Visualmente M 87 parece muito com um grande globular além da resolução. Um núcleo mais brilhante envolvido em um halo luminoso. Mesmo em telescópios relativamente grandes. Uma galáxia elíptica.  O Jato que lhe empresta o apelido de “A Arma Fumegante” é dificilmente percebido sem auxílio fotográfico e até 1991 apenas Otto Struve o tinha observado visualmente. Utilizando o Telescópio Hooker no monte Wilson (100 polegadas) atualmente há alguns registros de sua percepção com telescópios na casa de 500 mm. O ´Meara nos conta que juntamente com Barbara Wilson desconfiou deste durante a Texas Star Party em uma noite especialmente generosa.
                M 87 é uma galáxia elíptica supergigante. É uma das maiores, mais maciças e mais luminosas galáxias no universo local (algo em torno de 100 milhões de anos luz). Tem uma massa estimada próxima a 3 trilhões de sóis e uma magnitude absoluta de -22. É o lar de ao menos 1 trilhão de estrelas. Estas formam apenas uma fração da massa de M 87. Sua massa total pode superar em 200 vezes a massa da via láctea ainda tenham tamanhos semelhantes.
Newton (150 mm f8)

                Galáxias elípticas gigantes, acredita-se, são resultado da integração de grandes espirais. As galáxias elípticas são as mais comuns no centro do aglomerado de Virgem (o aglomerado de virgem se divide em ao menos 3 subgrupos centrados em M 87 (Virgo A), M 49 (Virgo B) e M 86) e a área em torno de M 87 é superpovoada em galáxias do tipo S0.  M 87 deve tornar-se cada vez maior conforme for absorvendo outras galáxias na região. Ela é um “grande atrator” e o cacique da região. HÁ fortes indícios de que M 87 e M 84 parece rumar uma em direção a outra.

 Em exposições extremamente longas se percebe que M 87 se estende por bem mais que 120,000 anos luz. E que seu formato não é exatamente arredondado. Essa deformidade pode ser relacionada a um encontro antigo com M 84.  Na foto abaixo (novamente fugindo a regra e sendo emprestada pela NASA) se pode perceber isto claramente. Pensei em fazer isto utilizando uma de minhas capturas e o auxílio do Photoshop. Mas acabaria sendo uma representação de caráter mais Artísitico e sempre procuro evitar isso por aqui.  Seu tamanho aparente aí atinge impressionantes 1 milhão de anos luz. Suas franjas exteriores são também distorcidas fruto das diversas pequenas galáxias em processo de canibalização.

nasa

                Seu jato de plasma energético se move em velocidade relativística, O jato consiste em material gasoso expelido do Núcleo galáctico.
                Como hoje sabemos lá habita um imenso buraco negro.
                Por uma coincidência capturei as imagens de M 87 pouco dias antes de serem reveladas as primeiras fotos de um buraco negro. O Buraco negro no centro de M 87. Evidentemente que não possuo a nem equipamento nem know how para chegar sequer perto disso. Mas dada a importância do fato fujo de novo um pouco a prática aqui no Nuncius e apresento a foto realizada pela NASA. Afinal esta libera suas imagens para uso sem fins lucrativos e o blog aqui funciona a fundo perdido ha quase uma década.  É impressionante como a imagem se parece com o que se imaginava. 
O Buraco Negro de M87. O Primeiro fotografado. 

                Trata-se de um dos mais maciços Buracos negros conhecidos e tem uma massa calculada de mais de 6 milhões de sóis. Posicionado dentro dos 60 anos luzes centrais da galáxia é orbitado por um disco de gás ionizado que gira a mais de 1000 km/s. o Disco tem um diâmetro de 0.39 anos luz.
                Buracos negros são fascinantes. Dão espaço a um pouco de imaginação. São um local onde os conceitos de espaço e de tempo se tornam abstrações matemáticas e dão espaço a muitas hipóteses. Embora a nossa física não explique o que acontece para lá do horizonte de eventos e do limite de Volkof-Openheimer algo deve se passar. É um campo ainda rico para a filosofia e a metafisica. Um das  melhores imagens que já tive do que poderia acontecer por lá vem do filosofo cínico  Rustin Cohle.  Supondo-se que atingimos a eternidade, que é um ponto onde todo o tempo já passou, e olhamos para trás veremos todo o espaço e o tempo como um círculo achatado. Uma espécie de mapa logarítmico do Universo.  Recentemente vi uma imagem assim, mas nesta, em vez de estarmos em uma singularidade, estamos no sistema solar. A diferença é enorme já que tudo e nada estão no mesmo ponto na singularidade. Mas a ideia do círculo plano me vem à mente.  E como a física não explica o tempo que acontece por lá eu recomendo que deem uma olhada em Nietzsche e no seu eterno retorno. Filosofia nunca é perda de tempo...  Na verdade, imagino aquele cone que sai do Big Bang e caminha até onde estamos agora sendo achatado. Assim como o filosofo Cohle demonstra de forma didática amassando uma lata de cerveja no episódio 5 de True Detective (quem nunca viu deve ver...). Seria melhor se ele tivesse utilizado uma taça de vinho de alumínio na sua explicação. No final a forma do espaço- tempo é um círculo plano visto deste ponto.  M 87 é inspiradora e muita bobagem já foi dita em seu nome.
                Walton Arp utilizou seus jatos relativísticos para sustentar sua hipótese de galáxias gerarem quasares e assim matéria gerar matéria. E de como o redshift de objetos seriam associados a idade da matéria e não a distância... Foi uma linda tolice que encantou até mesmo Kauffman. Embora hoje em dia saiba-se que isto é uma hipótese furada, filha do Steady State, nos tempos do Burnham Celestial Handbook não era. Burnham fala longamente das observações de Arp e de suas conclusões sobre M87. A Hipótese de Arp nunca foi muito aceita. Mas ele formou uma minoria bem vocal por algum tempo. Muitos combatiam o Big Bang por razões religiosas. Na verdade, por acharem que este apoiava o ideário cristão sobre a criação.
                Agora, já que falamos de Burnham, Cohle e meus queridos Dom Quixotes vamos relembrar (ou não) algumas observações históricas de M 87. O Admiral Smyth, naquele que foi provavelmente o primeiro guia observacional para amadores, curiosamente não fala em M 87. É curioso já que aborda diversas outras galáxias bem mais discretas na região. Webb também não a inclui em se celestial Objects for Common Telescopes. John Herschel antes dos dois a aborda sucinta e diretamente:  Muito Grande, muito brilhante, redonda, e mais brilhante em direção ao centro.  
                Herber Curtis estudou detalhadamente a primeira foto de longa exposição de M 87. Sua descrição de 1918 é a primeira a mencionar o famoso jato que sai do núcleo. “Excessivamente brilhante, nenhuma estrutura espiral discernível. Um curioso raio reto repousa em uma divisão na nebulosa na PA 20´. Aparentemente conectada com o núcleo por uma fina linha de matéria. O raio é mais brilhante no seu final interior a 11´´ do núcleo”.
                Provavelmente devido a sua aparência sem detalhes M 87 não foi uma prima-dona entre os amadores por algum tempo. Mas como era a única galáxia elíptica onde Hubble conseguiu localizar cefeídas seu interesse cresceu e o estudo sobre ela idem.
                M 87 possui um imenso sistema de globulares e um grande desafio para possuidores de grandes telescópios é localizar estes.

                Localizada próxima ao centrão do aglomerado de Virgem e sendo perceptível mesmo em buscadora M 87 é facilmente localizável. Calcule o meio do caminho entre Vindemiatrix em Virgem e Denebola em Leão e você estra bem perto. Ela se apresenta com duas discretas companheiras em seu campo e assim não será confundida com M 84 e M86 que são tão brilhantes quanto, mas se encontram no mesmo campo e com mais companheiras evidentes em seu entorno.  E sendo uma das mais brilhantes galáxias em Virgem é um alvo relativamente fácil para possuidores de pequenos telescópios.
              No post ha fotos capturadas com o Newton (um refletor 150 mm f8) e com uma lente Pentax 300 mm f4,5. Como se pode perceber M 87 não muda muito. O Mesmo eu percebo visualmente tanto com o Newton como com o Galileo (um refrator 75 mm f 13) eles se parecem com um globular se solução. M 87 é um daqueles DSO que são semelhantes nas fotos e no visual...


               

quarta-feira, 12 de junho de 2019

M 95 e M 96 : Uma História Galáctica e Outro Livro Antigo...


          
         Após uma breve interrupção no projeto galáctico do outono o Nuncius Australis foge um pouco de Virgem e retorna até Leão.  Há tempos queria fazer um grande retorno e ganhar tempo para falar sobre M 95 e M 96 separadamente de M 105. Embora estas formem um tripleto menos famoso e sejam juntamente com o tripleto famoso (que consiste em M 65, M 66 e Ngc 3628) um grupamento em si as duas galáxias que aqui abordarei são alvo muito interessante e geralmente são apresentadas em conjunto. Até porque M 105 é uma entrada póstuma no catálogo Messier e é senhora de um tripleto particular dentro deste. Por uma daquelas coincidências de Adams (coincidências que parecem ser relacionadas a leis fundamentais do universo, mas que são apenas coincidências) Leão parece gostar de apresentar galáxias em grupos de 3.   De qualquer forma gostaria de fazer um pequeno rodeio antes de  chegarmos em M 95 e M 96.

 Já falei aqui no Nuncius Australis que gosto de colecionar coincidências de Adams, Tripletos galácticos e guias observacionais pouco conhecidos. Desta vez esbarrei com o “Webb Society Deep Sky Observers Handbook”. Uma obra única e como todas elas quase desconhecidas para maioria da humanidade. São 5 volumes. Cada um abordando um determinado gênero de DSO. (Estrelas duplas, Aglomerados abertos e globulares, Nebulosas Planetárias, Galáxias e por fim Aglomerados de Galáxias). 
Com várias dezenas de galáxias fotografadas recentemente e esperando por apresentação é evidente que estacionei no volume relativo as mesmas (Vol. 4). 
Kenneth Glyn Jones (o editor e organizador do evento) inicia os trabalhos contando algo que já sabemos ou deveríamos saber. Galáxias são os blocos fundamentais de construção do universo. As partículas materiais que preenchem o volume do universo.  E depois nos leva (em uma interpretação pessoal) há divagar sobre como as galáxias são um alvo que fascinam o amador. Objetivos difíceis e que muitas vezes revelam poucas coisas ao observador com modestos (e nem tão modestos) telescópios mas que ainda assim são caçados sem dó nem piedade por eles. E não só isso. As galáxias observadas por estes são muitas vezes tidas como troféus. Minhas galáxias...
De volta ao livro ele nos lembra que galáxias são visíveis por uma grande gama de aparelhos, mesmo binóculos. Mesmo sem se obter nenhum detalhamento elas serão sempre responsáveis por uma certa fascinação para os observadores visuais. (Creio que a astrofotografia amadora, embora já incipiente, ainda não fosse uma prática tão comum nos tempos da primeira edição). De qualquer forma ele nos lembra que a evolução do entendimento do que são galáxias é a história da evolução do nosso entendimento do universo e da astronomia propriamente dita.
Nós só realizamos, de fato, o que são essas discretas nebulosas em 1924. Mas utilizando telescópios bem mais modestos que  o Hooker Telescope no Monte Wilson ,onde Hubble observou  estrelas cefeídas individualmente ( cefeidas são estrelas que apresenta um relação entre a oscilação de seu brilho diretamente ligada a tempo desta mesma oscilação. Por isso velas padrão e podem ser utilizadas para medir grandes distancias) em Andrômeda e provou que as tais nebulosas espirais eram mesmo Via Lácteas fora da Via Láctea,  o homem elaborou uma bela ideia do que e como seria o Universo.
Naturalmente, as concepções de sistemas extragalácticos (e do o universo como nós o entendemos hoje) tiveram que esperar a ideia de como se organiza uma galáxia e do entendimento da forma da nossa própria galáxia. Na verdade, esse processo foi a criação   da entidade "galáxia".  O próprio termo galáxia vem do entendimento do nosso lar no universo. A Via Láctea. Galáxia é uma palavra que deriva do termo grego galaxias kyklos que significa "círculo leitoso". Se habitássemos uma galáxia elíptica as coisas poderiam ser bem diferentes...

É Thomas Wright de Durham, em seu “An Original Theory or New Hipothesis of the Universe” (1750) que primeiro imagina a Via láctea como um disco de estrelas. Ele declara que essa possui a forma de uma Mó (Pedra de Moinho). E ainda se antecipa a Kant em profetizar que muitas nebulosas seriam galáxias.
“...Diversos locais nebulosos, apenas perceptíveis por nós, além de nossa região estrelada, onde espaços visivelmente luminosos existem sem nenhuma estrela ou corpo físico em particular possam ser percebidos, estes podem ser criações externas, semelhantes a conhecida (a Via Láctea) , muito distante até mesmo para nossos telescópios. “
5 anos depois Kant se apropria da ideia e enxuga todo o misticismo e religiosidade da hipótese de Wright e em seu seminal “ História natural do Universo e a Teoria do Céu”  apresenta ,de forma mais clara, a hipótese de que as nebulosas (especialmente as em forma de fuso) são Via Lácteas distantes como nosso próprio sistema e ainda propõe que estas se organizariam em super associações. Esta ideia posteriormente é batizada de Universos Ilhas por Humboldt. Este conceito de universos insulares e seus múltiplos agrupamentos, que agora entendemos como aglomerados galácticos, foi um notável insight e se revelou acertada quase 180 anos depois.
Tanto Kant quanto Wright atiraram no que viam e acertaram no que não viam. Quando Kant escreveu seu livro as únicas nebulosas que se revelaram galáxias mesmo conhecidas e já observadas eram as Nuvens de Magalhães ( conhecidas desde a pré história e de forma alguma semelhantes a um fuso)  , a Galáxia de Andromeda ( M31, Conhecida desde a antiguidade e descrita no livro das Estrelas de Al Sufi) ,  Galáxia do Triangulo ( M33, registrada por Hodierna antes de 1654)  e  A galáxia do redemoinho do Sul (M83, descoberta por Lacaille em 1751) já tinham sido observadas. As nebulosas que nutriram as ideias de Kant eram, muito provavelmente aglomerados globulares. Se fundamentara, quase certamente, na ideia de Maupertius (1742) de que esses eram corpos elipsoidais formados por rotação.
                Posteriormente Herschel estrutura a Via Láctea de forma mais fundamentada observacionalmente e embora não acerte no todo deduz corretamente a forma da coisa. E descobre milhares de galáxias. Se você pretende observar DSO´s é melhor que se encante por elas. Mais de 74% do New General Catalog é composto de galáxias.
                Lorde Rosse e seu Leviatã finalmente resolvem diversas das nebulosas em seu formato espiral.
                As coisas vão nesse pé até o Grande Debate entre Curtisse Shapley que já foi apresentado aqui no Nuncius. E como foi dito, Hubble encerra o assunto e prova que as ditas Nebulosas espirais eram, de fato, “Universos -Ilha”.           
                E graças, especialmente, as galáxias espirais o homem descobriu a expansão do Universo. Depois disso Hubble cria sua classificação de galáxias e se juntam as galáxias espirais as Elípticas, lenticulares, Irregulares e Cia. Ltda. Mas isso é papo para outro post.
                De volta as Espirais terminamos o rodeio e chegamos até Leão . M 95 e M 96.
                Galáxias espirais, a meu ver, são os mais desafiadores e belos DSO´s que se pode observar. São os objetos que menos desejam mostrar sua beleza e estrutura e ao mesmo tempo são os DSO´s onde você mais deseja extorquir tais informações. Conheço pessoas que tem esse Nirvana com Nebulosas Planetárias. Essas, me parecem, precisar de mais ampliação do que posso extrair do Newton, mas menos experiencia observacional e tenacidade. São pequenas , mas, geralmente, tem um brilho de superfície mais alto. Isso "by the book". Ou seja, tudo pode ser diferente.
                E é aí que M 95 e 96 se destacam. São ambas espirais que mesmo com equipamentos relativamente modestos você talvez perceba detalhes que Rosse precisou de 78 polegadas de espelho para descobrir. A ótica e os materiais evoluíram bastante...

M 95

                M 95 e M 96 foram descobertas por Pierre Méchain na noite de 20 de março de 1781. Messier as observou 4 dias mais tarde. Caracterizou M 95 como “uma nebulosa sem estrelas, com uma luz muito tênue”. Cinquenta anos mais tarde o Adm. Smyth a descreveu como “Uma nebulosa lucida branca. Essa nebulosa é arredondada e brilhante e provavelmente mais definida no extremo sul que norte”. O´Meara destaca que com muita atenção se desconfia de sua estrutura espiralada e que a mesma recorda uma das naves do Império em “Star Wars”. Com essa cola eu consigo desconfiar dessa impressão no Newton ( meu telescópio 150 mm f8) com 120 X de aumento. Nas fotos essa impressão é evidente e uma excelente descrição. 
                M 95 é uma das poucas espirais barradas no catálogo Messier e é classificada com SBb ou SB(r) ab.  Sandage a define como protótipo de uma galáxia anelar.  Seu núcleo e cercado por um pequeno anel interior o onde ocorre intensa formação estelar.  Sendo um membro de Leo I e com observações de cefeídas realizadas pelo Hubble Space Telescope sua distância é estiada entre 31,2 milhões de anos luz e 32,6 milhões.
                Com pequenos telescópios M 95 será mais tênue das galáxias Messier na região e extrair detalhes dela será um exercício digno de nota. Ela habitara o limite do existir em binóculos e dependerá de noites e locais muito especiais para ser percebida com algo menor que um 15X70 mm.  E mesmo nesse será um trabalho duro. Você provavelmente perceberá primeiro M 96 e aí talvez consiga extorquir a mesma do fundo do céu.
M 96 - Estaa foto foi feita com o newton. Um refletor 150 mm f8. 20 X 30 seg... 

                M 96 é menor e mais apertada que M 95. Eu a acho mais fácil de perceber. Pelo menos seu núcleo é mais evidente. Seus braços nem tanto. M 95 é o membro mais brilhante do grupo de Leo. Estes são: M95, M96 e M 105, NGC 3299, 3377, 3384, 3412, 3489, 3627e UGC 5889 formam o resto). O grupo formado por M66, M65 e O fantasma de Hamlet é também  associado ...

                M 96 se encontra a uma distância aproximadamente igual a M95. Pode estar um pouco mais distante, mas suas velocidades radias as garantem como parceiras...  M 96 é uma galáxia espiral com diâmetro de 76.000 anos luz e massa total de 80 bilhões de sóis. Sua região central é habitada por estrelas amareladas mais antigas e apresenta uma discreta barra. Uma supernova foi descoberta nessa em maio de 1998. Devido a isto e diversas cefeídas observadas M 98 é uma galáxia bem estudada e um objeto muito utilizado para calibrar-se distancias.
                Um anel exterior bastante tênue ´´e de difícil observação e difícil mesmo para astrofotografias.

                O par é um excelente alvo para telescópios de médio porte e um desafio maior que M 66 e M 65 também em Leão. Juntamente com M 105 forma um tripleto mais difícil para amadores em busca de coincidências de Adams por Leão.  Localizado quase no meio do caminho entre Regulus e Chertan, abaixo da Barriga do Leão, você vai encontrar Leo 52. A partir dela cace seu caminho até nossas convidadas. Em locais escuros elas serão mais amigáveis. Recomendo que visite antes M 66 e M 65. Se estas estiverem em noite esquiva é melhor deixar para uma noite mais apropriada o ataque ao grupo de M 96. 

                  As fotos aqui apresentadas foram todas resultado de uma captura de 20 X 45 segundo ISO 1600 com uma Canon T3- Lente Pentax ED 300 mm f 4.5 Montada sobre um cabeça HEQ 5 pro. Realizadas em maio de 2019 na Armação dos Búzios. Foram empilhadas no Deep Sky Stacker com 20 dark frames. E posteriormente esticadas no PixInsight1.8 e cosmética no Photoshop.  Com exceção da foto de M96 isolada que foi realizada utilizando um refletor 150 mm f8. 

               

segunda-feira, 3 de junho de 2019

Astrofotografia , o Gênio Ródio, Corredeiras e o Sturm and Drang


           

           Astrofotografia é muitas vezes chamada de “A Arte Difícil”. Definitivamente fotografar DSO´s é bem mais complicado que fazer umas fotos das crianças. Implica em um equipamento maior, diversas técnicas e muita experiência e paciência. Você deverá possuir uma cabeça equatorial motorizada, realizar o alinhamento polar dessa com bastante capricho, contar com o clima e com as fases da lua entre outras coisas...
    Mas você pode ter toda essa diversão sem tanta trabalheira. Mesmo sem cabeça equatorial é possível se registrar grandes campos do céu. Com lentes grande angulares é possível se obter exposições longas o suficiente para se registrar diversos campos interessantes e até mesmo alguns DSO´s propriamente ditos. Não pretendi chegar a tão pouco mas também não queria sofrer muito...
        Era tempo de se subir a Serra. Meu filho estava muito saudoso de seus “amigos capoeiras” e eu estava desejoso de subir a Serra e aproveitar não só para ver alguns amigos como para desfrutar dos céus bem mais escuros de Boa Esperança. Essa um pequeno ajuntamento rural próximo a Lumiar.
       Normalmente eu realizaria uma derrota (um termo náutico para plano de navegação...) onde teria diversos alvos a serem capturados e o horário que estes cruzariam o meridiano. Ainda teria várias estrelas com horários e altitudes calculadas para me ajudar com o alinhamento polar (tenho horror a fazer o drift para alinhar Mlle. Herschel).
     Provavelmente devido aos saraus filosóficos que vem sendo organizados pela minha tia, onde estudamos como a Beleza só pode ser compreendida na sua integra através da liberdade ( ou coisa que o valha...) ,no entender de Schiller, e abraçado ao seu conceito de  Gênios Morais que  o assim são de uma forma orgânica decido que dessa vez irei partir para um outro  tipo de abordagem. Em vez de levar o Newton (um telescópio com 1200 mm) irei somente eu, meu filho, Mlle. Herschel ( minha cabeça equatorial HEQ 5) , a Câmera e um quiver de lentes. Entre minhas lentes tenho duas favoritas. Uma Pentax 50 mm f 1.7 e uma outra 300 mm f 4.  Na véspera pego emprestado um duplicador com um amigo. Mas esse se revela incompatível com meu equipamento. Uma pena. 
          Assim no dia 31 de maio do ano de 2019 saio rumo a serra as 11:39 da manhã.  Em uma viagem tranquila estamos chegando na casa de meu velho professor de Geomorfologia as 14:30 da tarde.  Rio- Boa Esperança em menos de 3 horas. Com direito a parada para croquetes na Casa do Alemão e a umas compras rápidas no Mercado de Lumiar. Um recorde... Bastante impressionante se levando em conta que desta vez fui com um Fiat Mobi. Carro o qual eu achei uma porcaria. Cambio frouxo, pouquíssima potência e nem um pouco econômico. O aluguel é barato...
        Tal e qual o Gênio Ródio de Humboldt (um aluno de Schiller e fundador da Geografia) escolho que Theta Carina é a estrela certa para me ajudar no Alinhamento polar. Sendo a estrela mais brilhante das Plêiades do Sul e cruzando o meridiano exatamente as 18:00 me parece que nada pode dar errado. Exceto que as 18:00 ainda está claro para burro e a Buscadora polar não é exatamente um poderoso telescópio. Desconfiando que estou com a moça errada centralizada eu me dou por satisfeito.  
     Quando vou alinhar o Go-to (um sistema que permite que a cabeça equatorial localize os objetos que você quer observar sozinha...) percebo que o alinhamento polar esta medíocre. E assim será.


            Eu tinha um plano. Dessa vez astrofotografia ia ser a melhor diversão e nada desse papo de Difícil Arte. Mas...
        Esqueci o cartão de memória da câmera. Em um primeiro momento pânico. Mas rapidamente atino que possuo um programam maravilhoso no meu lap top. ATP tools. (Astrophotography tools). E assim conecto a câmera ao computador através de um cabo Canon, habilito o obturador desta a trabalhar sem cartão  e capturo as imagens diretamente para a pasta default do ATP. Nunca tinha feito isso. Mas não foi tão difícil. Fiquei com a impressão que o cabo é responsável por mais ruído nas capturas. Mas pode ser só implicância. E descubro que o ATP captura as imagens (por default) tanto em Jpeg como em RAW. E ainda cria uma pasta com versões pequenas (thumbnails) em PNG.  
Rho Ophiuchi e Antares régio. também conhecida como a "14a vértebra" . Foto com 3 Drizzle no DSS. 

Com a questão da captura resolvida parto para o jogo. Coloco a 300 mm na câmera e mando Mlle. Herschel em busca da “Running Chicken Nébula” no entorno de Lambda Centauro.
Percebo que não vai dar para se almejar tanto bebendo na companhia de Humboldt, Schiller e do Gil Velho e com um alinhamento polar feito , ou melhor, não feito. Coloco a 50 mm e mando Mlle. Herschel apontar para o Cruzeiro do Sul. Astrofotografia com uma 50 mm é bem mais fácil que com a 300mm e infinitamente mais fácil com um telescópio de 1200 mm.  O acompanhamento, alinhamento polar e etc. se tornam bem mais complacentes.
Essa foto esta centrada na apagada constelação de Circinus. No canto esquerdo está K Norma envolta em Ngc 6067. Um aberto impressionante.



Com o computador protegido do sereno e instalado em uma cadeira de bar coberta pelo meu Anorak eu já possuo um plano de captura para light frames (que são simplesmente fotos)  pré-programado no ATP onde, ao contrário do Crivella, tenho tudo sob controle. A câmera irá realizar 20 exposições de 45 segundos com ISO 1600 e com 5 segundo de intervalo entre as fotos. Um luxo. Você clica em “Start” e pode ir brincar com as crianças, beber cerveja com os amigos e outras cositas más. Depois de 1000 segundos o computador emitirá o som de sino e posso voltar e fazer tudo de novo.

Cauda de Scorpio

E assim capturo, sempre com a 50mm em f1,7, uma bela região pouco fotografada centrada em  Circinus com a Nuvem de Norma no canto esquerdo da foto. o campo de provas favorito na região de Antares e Rho Ophiuchi e a área no entorno do Falso Cometa em Escorpião.



Falso Cometa.

Sempre que observo a Via Láctea me lembro de um Rio. Algumas regiões são evidentes corredeiras. Estas áreas são sempre muito fotogênicas. E por isso ainda tento visitar a área em torno de Eta Carina. Quando se fala em corredeiras me lembro sempre que li em algum lugar que estas são classificadas (pelos praticantes de canoagem em uma escala que vai de do grau I (novatos) até VI (suicidas apenas) (https://en.wikipedia.org/wiki/International_scale_of_river_difficulty). A região de Norma seria algo como  III +.

    Eta Carina seria uma corredeira 5x. Ou seja suicida, mas muitas vezes navegada.  Dessa vez passo por apertos e o excesso de condensação me vira o kayak. A água é um perigo nos mais diversos estados... De qualquer forma acho que os resultados são abaixo da média e acabo descartando os quadros. Mas como o ATP \tools cria uma pasta com thumbnails ( em PGN) de todas as fotos capturadas acabei por achar 11 fotos de Eta carina e adjacências perdidas no HD. Tentei empilhar as pequenas fotos ( 256 por 128 pixels) no DSS. Não deu certo. Então ressuscitei o Rot n´s Stack . Seu efeitos são sempre mais para pop art que para astrofotografia. Mas  talvez embriagado pelo espirito do Sturm and Drang e do romantismo alemão que embala este post seguem alguns dos resultados..  Embora me pareçam resultado mais apropriados para o movimento  do "Storm and Drunk" que das obras de Schiller. 




single Thumbnail antes de ser feito belo e livre pelo Rot n´Stack. 

A noite transcorre assim. O único inimigo é a condensação. Sem um dew heater (um acessério que mantém as lentes aquecidas)  eu acabo perdendo o jogo. E com o velho professor meio adoentado e tendo se retirado bem cedo (19:30) desisto de lutar contra a natureza. As 22:30 dou uma olhada em Júpiter utilizado o Galileo (um refrator de 70 mm que estava aposentado há um bom tempo) e com esse também apanhando da condensação eu desisto.
Senhores das Moscas ou Captain Fantastic.

Dormindo as 10:30 da noite acordo sem esforço as 6:30. Depois de um café seguimos para um local em que pretendo retornar para a Aporema de Inverno. Galdino polis. Lá espero ter um céu Bortle 2. O Polis do nome está para lá de exagero... Vou com o Gil e as crianças até uma pequena casa de um amigo  perdida em meio a um grande pasto com o Rio Macaé ainda muito limpo ao seu lado. Fazemos uma macarronada a bolonhesa. No fogão de lenha da varanda.  As crianças brincam no Rio e no pasto. Eu confesso que poucas vezes mergulhei em água tão fria. Depois voltamos para beber em Lumiar. Compro um cartão de memória por 55 reais. Achei em conta.  Mas a chuva se aproxima. O resto é de pinga e prosa. 
Domingo partimos de volta para o Rio. Foi pouca astrofotografia. Mas definitivamente a 50 mm faz as coisas renderem muito. 
Astrofotografia é a melhor diversão...
Para os fissurados: Todas as fotos são resultado de 20 exposições de 45 segundos com ISO 1600. Captura em RAW (cr2.).  Tempo total de exposição 15 min. Foram utilizados ainda 20 dark frames para calibragem. Lente Pentax 50 mm f1.7. Canon T3 . Montagem equatorial HEQ 5 pro. 
O stacking ( empilhamento) foi realizado no Deep Sky Stacker. E as fotos foram posteriormente "esticadas" no PixInsight 1.8 e e passaram por algum trabalho cosmético no PhotoShop CS 8.