Setembro foi um mês dedicado a um
projeto que me manteve afastado dos céus. Em um sentido “quase bíblico” não
poderia estar mais distante deste e mais perto do inferno que neste. Em um
momento que as favelas (sou de um tempo nem tão politicamente correto em que as
ocupações humanas nas encostas do Rio de Janeiro ainda não eram denominadas
comunidades) se encontram em pé de guerra devido ao total abandono do estado e
também devido a rachas entre as diversas facções criminosas que detém o poder
sobre estas áreas e mesmo dentro de uma mesma facção me engajei em um filme que
foi realizado no Morro dos Prazeres, localizado no um dia aprazível bairro de
Santa Teresa. Segundo meu tio o nome da favela foi dado por um gozador. Toninho
Geraes, em seu clássico “Vida Boemia”, parece se dar bem com o local.
Carregando o Mundo nas Costas I |
Carregando o Mundo nas Costas II |
Um filme de caráter independente e com pouco
dinheiro. Conheci pessoas incríveis e vivi uma realidade onde literalmente se
carrega o mundo nas costas (me lembrei muito dos quadros de Portinari onde se carregam sacos e mais sacos de café ...) . Iluminamos
sets utilizando “ festivas” (gatos de energia), carregamos todo o equipamento
no lombo, ficamos presos em becos aguardando operações do Bope perseguirem
bandidos oriundos de outra favela que fora ocupada por forças do exército e
vimos armas. Muitas armas.
Meu fiel Juarez "Ratinho" descolando energia para minhas luzes... |
Em
uma cena um dos protagonistas carrega uma geladeira por uma escadaria que
tornaria a mais famosa “ Escada da Penha” uma estrutura de caráter minimalista.
Mas como o cinema é arte da enganação ele somente a transportou por três
degraus e mesmo assim com muita ajuda dos contrarregras. No mundo real vi um cidadão
com o apelido de “China” carregar de fato uma geladeira bem maior por todo o
percurso em poucos minutos. Em troca de uma pedra de crack. Depois desceu e ficou esperando o próximo
frete...
Oxalá carregando o Mundo. |
Já
na reta final filmamos em um terreiro onde aprendi que certas histórias tem um
caráter universal. Fiz uma foto de uma bela escultura em madeira. Logo depois
um dos ogãs me pergunta se eu sabia o significado da obra. Eu respondi não ter
a menor ideia. Ele me conta – É Oxalá carregando o mundo - pode-se perceber que
é uma carga bem mais pesada que uma geladeira... Não pude deixar de pensar em
Atlas.
Armas |
Muitas armas... |
No
penúltimo dia (na verdade a semana final foi toda de noturnas) filmamos um “
Baile Funk”. Em um arroubo dantesco eu tive certeza que se o meu inferno
existir o DJ estará lá...
Como
todos os filmes este foi repleto de slogans e frases feitas. As mais
corriqueiras foram “ O impossível a gente faz agora. Milagre demora um pouco”,
“Um pouco droga, um pouco salada. Meu médico disse que não dá nada não” e a
mais ouvida e que usava frequentemente para explicar para a fotografa
californiana e que não entendeu muito bem como foi parar nesta roubada e menos
ainda a realidade local: “ É o que temos para hoje...”
"Gangue dos Alfaces Transgênicos" Elétrica e Maquinaria... |
E
com a “missão dada, missão cumprida” após 27 dias de filmagem sem mortos nem
feridos e sem folga na última semana (a qual foi vendida juntamente com a alma)
parti para Búzios para, enfim, comemorar a Aporema de Primavera e o
encerramento do projeto “ Pacified”. Como não poderia deixar de ser esqueci a fonte
que alimenta Mlle. Herschel. Não
poderia ser tão fácil assim se livrar de todo esse karma terreno e poder de
novo vagar por recantos do universo onde eu consigo ver beleza com mais
facilidade. Não posso negar que não precisar mais usar o colete verde (que,
teoricamente, nos tornava a prova de balas) e nos tornou conhecidos como a
“Gangue dos alfaces transgênicos” ajudou no processo de descompressão.
Na
manhã seguinte saí em busca de uma fonte que suprisse as minhas
necessidades. (12 volts e pelo menos 2
amps) .... Felizmente a noite ficou nublada e assim minha dor de corno não me
levou ao pranto. Com o auxílio de uma
dose cavalar de Aloprazolam durmo por 10 horas. Estava precisando.
Sai
cedo com Mlle. Herschel ( minha montagem equatorial HEQ 5 pro ) em busca da fonte. Dona Fortuna sorriu para mim e na
loja de informática mais próxima repousava uma fonte universal “made in china”
que resolveu meu problema. Como eu já havia descoberto qualquer fonte que
gerasse algo entre 11 e 15 volts e uma corrente mínima de 2 amperes faria o
truque. Nada como manter o manual de seus brinquedos no HD do computador. Com a
cidade lotada conseguir navegar em busca destes dependendo de 3 ou 4 G pode ser
bastante frustrante.... Minha nova fonte é pequenina e pode ser regulada para
qualquer tensão entre 3 e 12 volts. 3 amperes... potencia 30 Watts. Fazendo as
contas calculo que a potência dos motores de Mlle. Herschel sejam de 22 watts.
Afinal 11 X 2 = 22. Possuo uma pequena margem de segurança. Uma formula muito
útil nos diz que Volts X Amperes = Watts.
Finalmente
conseguirei observar. Desta vez sem nada planejado. Poucas horas antes do
entardecer vou colimar o Newton e aguardar por Peacock (Alpha Pavo) para afinar
meu alinhamento polar. Tenho em mente tentar algumas fotos do Quarteto de Grus.
E mais nada. Outro alvo que gostaria de tentar fotografar (este utilizando
minha lente 70 -300 mm) é a nebulosa do Véu.
Sonho
meu. Feriadão a população dobra e a poluição luminosa aumenta 2 pontos na
escala Bortle. Não bastasse isto realizei o alinhamento polar “de ouvido” e
acabei com um Synscan pouco preciso. Go-to
se encontrava sofrível. Era sexta feira
13.
Uma
rápida inspeção por Sagitário e percebi que a noite não prometia nada de muito difícil
ou tênue. M22, M8 e outros espetáculos “fáceis” se encontravam bem discretos.
Depois de visitar uma desbotada Albireo achei que não valia o esforço melhorar
muito as coisas. A visão de M 11 era desoladora. Abandonei a derrota planejada e insisti sem
sucesso durante toda noite em caçar M 72. Entre as muitas tentativas frustradas
de que fiz a cada calibração do Go-to tentava novamente localizar o penúltimo globular
Messier que me resta fotografar. Foram diversas tentativas durante a noite e
nenhuma exatamente bem-sucedida. Entre isto visitei alguns velhos conhecidos e
algumas duplas novas. Logo no começo da
noite visitei 94 Aquário. Uma delicada e pequena dupla que por um daqueles
truques de contraste parecem ter um componente verde.
Depois M 15 recebeu rápida visita e foi surpreendente levando em conta o que já tinha observado em M 22 e M4. Por alguma razão se apresentava mais brilhante e com o núcleo evidente mesmo na buscadora.
Depois M 15 recebeu rápida visita e foi surpreendente levando em conta o que já tinha observado em M 22 e M4. Por alguma razão se apresentava mais brilhante e com o núcleo evidente mesmo na buscadora.
Tenho
impressão que a noite foi escurecendo com o andar das horas. E como acabei ou
fracassando em M72 ou visitando alvos bem brilhantes acabei tendo uma noite
cheia de DSO´s claros na ocular. M 45 foi namorada durante bastante tempo.
Preciso colar um "gaffer tape" ou uma fita isolante sobre a luz que se acende na nova fonte de Mlle. Herschel . Muito forte e azul...
Preciso colar um "gaffer tape" ou uma fita isolante sobre a luz que se acende na nova fonte de Mlle. Herschel . Muito forte e azul...
A
grande novidade da jornada acabou sendo o nem tão obscuro aberto em Andromeda,
Ngc 752. E claro fiz algumas
experiencias fotográficas com M 31. Preciso continuar experimentando...
Primeiramente
fotografei a galáxia com o Newton. E depois com minha lente 75-300 mm @ 250 mm
f 6.3. O núcleo de M 31 é muito brilhante e um alvo fácil. Perceber seus braços
espirais já é um pouco mais delicado. Visualmente são pouco mais que um
gradiente com visão periférica. Nas fotos um pouco mais que isto. Cobrindo uma área enorme Andromeda é um alvo
que se adequa mais ao grande campo do zoom do que ao limitado campo do Newton. M 110 é facilmente percebida. M 32 nem tanto.
Nas fotos são obvias. As fotos
realizadas com o Newton destacam apenas seu núcleo e com atenção a mancha de
poeira no noroeste dos braços.
3X Drizzle DSS+ PS -- 64 X 30 seg 1600 ASA |
2X Drizzle |
A
Poluição luminosa é tal que não utilizo daylight com “White balance” da câmera.
Se o fizesse teria um fundo de céu fortemente alaranjado. Regulo o White
balance para 4200 kelvin.
Resultado do Stacking feito no Rot n´Stack... |
Como
já havia visitado algumas das filhas de Atlas (M45 ou as Plêiades...) e em um tributo a Oxalá faço uma rápida visita
as outras filhas do titã que carrega o mundo nas costas e passo pelas Híades.
Para
encerrar nada como um tour visual por Orion nascendo a leste. Com uma lua
minguante se juntando a já intensa poluição luminosa M 42 era uma imagem
desbotada. Melhor dormir...
Infelizmente
as noites que se seguiram foram nubladas e a Aporema de Primavera acabou sendo
comemorada em uma única noite. Para aqueles que não acompanham o Nuncius Australis
“Aporema” é uma festa que é comemorada 4 vezes ao ano nas luas novas mais
próximas aos solstícios e equinócios e que remonta ao Cacique Aporema (um
cacique Tupinambá provavelmente de visão aguçadíssima). E mesmo com esposa, cunhada,
filha e São Pedro jogando contra consegui comemorar o evento em uma noite bem
divertida.
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