Julian Temple e Dona Rosa - Morro do Cantagalo |
O Texto é sobre astronomia. E sobre como
ela deve estar presente no seu cotidiano.
É também uma homenagem.
Este mês se iniciou de uma forma bastante
ativa e caótica.
Desta forma, achei, as chances de
realizar qualquer tipo de atividade astronômica ficaram adiadas para o final do
ano.
Passei dezesseis dias acompanhando um
diretor inglês de renome (Julian Temple) na realização de um documentário para
a BBC, uma TV britânica. Este cidadão foi o diretor de um famoso filme intitulado
“The Great Rock and Roll Swindle”. Este conta à história da celebre banda Punk “Sex
Pistols”. Ele mesmo ainda um Punk de carteirinha, apesar de sua já mais
avançada idade...
O conceito de nosso documentário, batizado de " The Children of Revolution", seria
apresentar a Cidade do Rio de Janeiro e sua história recente através da musica.
Ou algo assim
Parecia claro para mim que meu caro diretor
não tinha a menor ideia de que filme ele estava fazendo. E eu menos ainda.
Nossos dias consistiam em jornadas de 12 horas
nas quais, às vezes, tínhamos uma ou mais entrevistas agendadas com alguma
autoridade ou alguém do meio musical. Estas poderiam acontecer ou não. Nos intervalos se filmava toda e qualquer
coisa que aparecesse pela frente.
Mesmo entre deslocamentos por meio a um
transito totalmente engarrafado nosso câmera man permanecia filmando através do
para-brisa de nosso veiculo. E o nosso genial diretor também. Com sua pequena
câmera amadora.
Este habito lhe rendeu o carinhoso apelido,
por parte da equipe brazuca, de “O Tarado da Camereta”.
Em seu quebra cabeça “filmográfico” nosso
gênio criativo tinha uma tara especial por ar-condicionado. Filmávamos e
capturávamos o som de diversos ares condicionados pela cidade.
Uma
completa loucura.
Este
processo orgânico de criação era extremamente estressante para ao fotografo
deste evento, Steve Organ. E este, que conhecia nosso diretor de outros
carnavais, me alertou para o fato. E como seu assistente fui instruído a tentar
manter um mínimo de ordem com relação ao nosso equipamento e ao que fosse
filmado.
Desta forma eu mantinha sempre comigo uma
mochila onde levava as lentes, baterias (duas sempre carregadas) e todo o “film
Stock”. Cada uma das coisas em bolsos pré-determinados. E mais alguns
acessórios. Fora o equipamento de iluminação. Este era um problema meu. Conseguir
fazer tudo caber na mala da van também.
Ainda devo ser capaz de pendurar uma câmera em qualquer posição e utilizando diversas "traquitanas". Sempre que faço isto me lembro de minhas montagens para o meus telescópios. E percebo diversas possibilidades . Tanto para câmeras como para telescópios...
Este processo me lembra bastante as minhas
aventuras astro fotográficas. Nestas eu
vivo um conflito de sistemas. Algo entre o processo orgânico de nosso diretor e
o cartesianismo de meu querido fotografo.
Em geral quando vou fotografar eu tento (e
quase nunca consigo) manter um “plano de filmagem”.
Eu
costumo iniciar o processo visitando um programa planetário e determinando
quais serão as “entrevistas” da noite.
Localizar DSO discretos, para mim, é um processo
orgânico e caótico.
A “La Mister Temple”.
Eu
tento localizar um alinhamento de estrelas e a partir destas achar o DSO.
Este só será percebido (se for) através
da Ocular. No caso minha 25 mm.
Isto me dá apenas 1º para acertar este
“Chute”.
Na verdade é também um habito que você
desenvolve com o tempo e o conhecimento das distancia quando vistas pela sua
buscadora que vão tornar isto rápido (ou não).
Que nem as entrevistas do documentário...
Agora vamos à parte mais cartesiana do
meu processo “criativo- astrofotografico”.
A “La Steve Organ”
Em primeiro lugar eu gosto de me
certificar que possuo um alinhamento polar ao menos razoável. Em casa isto nem
sempre é fácil devido às limitações espaciais do observatório. Assim eu mantenho algumas marcas no chão e
evito mexer na cabeça equatorial. Desta forma após fazer algumas fotos testes
eu em geral consigo obter um acompanhamento com um mínimo de dignidade sem
grandes sofrimentos.
Mantenho também, todo o equipamento necessário
para a operação em uma mesa próxima a telescópio.
O “T-Ring” vive montado no telescópio.
Desta forma após localizar o objeto e centralizar este eu retiro o porta ocular
carinhosamente e com o auxilio de uma chave Allen acoplo a câmera com carinho a
fim de não deslocar o telescópio.
Alguns procedimentos anteriores a tudo
isto também me são caros.
Checar que as bateria do motor estão
novas.
Que o Cartão da câmera esteja vazio e
formatado.
Que as baterias da câmera estão
carregadas.
Que a exposição já esteja realizada. Em geral
15 ou 30 segundos.
Que o Timer esteja “pré setado”. Preciso
comprar um disparador remoto...
E que eu já tenha realizado marcas na
cremalheira para auxiliar no foco.
Qua a buscadora esteja bem alinhada.
Que a buscadora Red dot tenha bateria.
Evidentemente que sofro de algum
gene bagunceiro em meu DNA. Sempre esqueço algum destes itens. É ahistória do astrônomo desastrado de novo...
Mas novamente sou obrigado a retornar a
figura de meu diretor.
Foram 16 dias de filmagem onde eu não
vislumbrava nem de longe o fio da meada que conduzirá o documentário
Apelidara o filme, a esta altura, de “Caos
at the Temple”. Afinal, como já disse, diretor é Julian Temple.
Eu não tinha esperança de realizar
nenhuma fotografia astronômica até o fim da empreitada. Mas...
E é aí que a astronomia se apresenta. Ela
sempre se apresenta. Habita o céu sobre nós.
Desta forma, no ultimo dia de filmagem,
eu tive uma luz.
Tínhamos feito a ultima entrevista do
documentário com Dado Villa- Lobos na véspera ( e gravado uma nova versão , meio tosca, de Geração Coca-Cola . Veja no video acima). E eu nada de entender o filme.
Nos dois dias (na verdade noites) finais
eu sabia que filmaríamos diversas projeções de filmes brasileiros. Iríamos
projetar filmes em diversos locais da cidade maravilhosa e filmar estas
projeções. Um esporte chamado de “Vídeo-Arte”. Me parecia mais um nosense do
“tarado da camereta.”.
Video Arte de Kombi |
Desta forma projetávamos filmes sobre o
cinema ODEON , dentro de um telefone publico com anúncios de travestis, no
toldo do “Amarelinho” e pelas paredes dos armazéns do cais do Porto. Neste
ultimo com o projetor e toda a equipe montada em cima de uma Kombi aberta e em
movimento.
E nada de astronomia... E nem de entender
a porra que eu estava filmando.
Finalmente chega o ultimo dia e
continuaríamos na missão Video-Arte.
Mais Video Arte- Pedra do Arpoador |
Primeira locação do dia é o teto de um
hotel na praia de Copacabana.
E finalmente se faz a Luz.
Projetávamos
filmes de vários períodos da história da cidade sobre a lamina d’água da
Piscina na cobertura. E com o deslumbrante cenário do Morro do Leme e o oceano
atlântico ao fundo.
Como dizia se fez a Luz. Entendi que as
projeções seriam o fio condutor do Caos. As perguntas das entrevistas seguiam
sempre certa ordem cronológica. Ainda que feitas totalmente fora de ordem. Como era o Rio na sua infância, ou nos anos
70. O que você ouvia nos anos 80 e etc...
Ele iria quebrar a monotonia de uma coleção
de entrevista pontuando estas com imagens muito loucas, filmadas sobre diverso cenários
cariocas, de filmes dos respectivos períodos, ou de imagens que remetessem a
descrição daquele tempo pelos entrevistados. Desta forma as projeções de
imagens de Tropa de Elite representariam os anos 90. Carmem Miranda os mais
pacíficos anos 30. E por aí vai.
Do teto deste hotel se fez a luz. Logo...
Astronomia.
Olhávamos para o Leste e conforme anoitecia
pipocavam luzes. A Primeira a surgir: Júpiter. E pronto. De uma forma
totalmente sem planejamento eu faço uma fotografia astronômica que embora limitada técnicamenete apresenta o gigante de uma forma clara e poética. E ainda apresenta a geografia da cidade com o pão de açucar emoldurando o céu. Júpiter e a Terra se encontram . Isto é astronomia. E usando um Telefone celular.
Júpiter: astronomia do cotidiano. |
E apesar de nenhum “Plano de filmagem”,
sem ter formatados cartões, sem alinhamento polar e sem nada disto tirei a
primeira foto do mês e ainda fiz minha primeira sessão de observação. Usando
apenas meus olhos e meu celular...
Aprendo que nem sempre é necessário planejar.
Astronomia e astrofotografia podem ser um processo totalmente casual e Orgânico.
Elas são frutos de se olhar para o céu e de poder captar estes momentos. Não
dependem de equipamentos caros ou de um conhecimento especial. Você aprende
fazendo. E que apesar de minha obsessão uma foto dita "Astronômica" não implica na presença de um obscuro DSO com um nome em forma de sigla e de baixíssimo brilho de superfície...
E assim além de fazer uma foto que é bela
pelo simples motivo de que o Rio e o firmamento são belos eu ainda pude
apresentar para minha equipe de filmagem algumas das belezas do firmamento.
Meu caótico e caro diretor, inglês,
adorou saber que a bela estrela avermelhada próxima a Júpiter era chamada de
Aldebarã.
Conforme ia escurecendo a imagens da
projeção ia ficando mais definidas e mais estrelas pipocavam pelo céu. Sirius
logo se apresenta também. Betelgeuse é a próxima que percebo. E conforme elas
pipocam mais encantados vão ficando os amigos.
Finalmente chegamos a Patrick Moore. Um
dos maiores divulgadores da astronomia do UK, recentemente falecido é invocado.
E tanto o diretor como o fotografo falam dele como um velho amigo. Afinal o
documentário é para BBC e Sir Patrick Moore apresentou seu show por décadas na
companhia ( Entre Abril de 1957 e janeiro de 2013, quando será apresentado o ultimo episodio gravado por P.M. do "The Sky at Night"). Além de que é uma figura do imaginário coletivo inglês. E eu me
choco como dois velhos Punks tem tanto carinho por um astrônomo.
Fiz minha foto e aprendi que astronomia
deve fazer parte do cotidiano das pessoas. E como Patrick Moore fez disto algo
comum a todos os ingleses.
R.I.P. Sir Patrick Moore
Parabéns pelo blog, estou comecando agora nesse mundo da astronomia amadora, e já acesso seu site todo dia pra ver se tem post novo.
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