Semana Santa é sempre lua
cheia... A Pascoa acontece no primeiro domingo depois da primeira lua cheia após o equinócio. Forte
caráter astronômico e um mal momento para se observar. Não bastasse isto minha
querida cunhada montou um bar de frente para o local onde sempre observo em Búzios.
Para piorar isto colocou luzinhas de natal para decorar a fachada. E uma
“mirror ball” na varanda dos fundos. Gosto não se discute. Se lamenta. Nenhum governo ainda se dignou a promover uma
“Bolsa Observatório”.
Sem
saber da radicalidade da reforma fui para Búzios na vã esperança de conseguir
ao menos capturar M 68 e 53. Assim ficaria faltando fotografar M 72 para
completar minha coleção de Globulares Messier.
Na
quinta feira santa chego ao meio dia na Armação com os pés sujos. Pego uma praia com meu menor e volto
no fim de tarde cheio de esperança. Quase acreditando em ressureição. Quero
realizar um alinhamento polar “a sério”. Utilizando a técnica fotográfica.
Alinhamento Polar |
Esta
consiste em com a câmera já montada no Newton (e com o eixo polar apontando
grosseiramente para o sul celeste) realizar exposições de trinta segundos com
telescópio apontando para o equador celeste. Durante os primeiros 5 segundos de
exposição você nada faz. Depois desloca este para o oeste pelos próximos 15
segundos e para o leste os segundos restantes. Caso seu alinhamento esteja
correto o resultado será uma linha. Caso contrário um “V”. Sendo um “V” ajuste
a cabeça nos parafusos de Azimute até que o “V” se transforme em linha... É bem
mais preciso que o método “preguiçoso” e menos chato que o drift. Para ajustar
a altitude se faz o mesmo procedimento apontando-se para o horizonte leste ou
oeste o mais baixo possível. E evidentemente se ajusta a cabeça no parafuso
responsável pela altura. Quem quiser entender melhor o processo pode procurar
por um vídeo do Compassi no You Tube. Nesta época do ano implica em apontar-se
o telescópio para uma região com poucas e tênues estrelas. A Pascoa é um saco.
Só salva o feriado prolongado. A Aporema
de outono vai ter que esperar. Tenho um trabalho começando dia 5 e que deve ir
até 15. Há possibilidades de que este aconteça em Paraty. Será perfeito.
Logo
de cara a montagem não funciona com a câmera sendo operada pelo APT. Vai ser
manualmente mesmo. Quando estou quase lá as nuvens entram rasgando e deixo a
precisão para lá. Já fotografei com alinhamentos bem mais toscos. E com a lua cheia,
o novo bar e as nuvens rondando não tenho motivos para grandes esperanças. Já
tinha voltado ao estado de descrença que me é normal...
M
53 é um sonho impensável. Não consigo sequer ver Alpha Coma a olho nu. A lua
cheia é a maior inimiga que um DSO pode encontrar. Nem mesmo a iluminação das
pedras do Arpoador chega a ser um inimigo tão figadal.
Para
dizer que nada aconteceu nesta noite observei Castor. Esta eu nunca tinha
dividido tão facilmente. Com apenas 45 X de aumento percebia ambos os
componentes nos momentos de seeing estável. Com a Barlow era fácil. Outra dupla
que compareceu foi Cor Caroli. Com e sem Barlow . Muito baixa no horizonte
sofreu bastante com a instabilidade da atmosfera.
Segue
a noite e como dizem por aí “Tá no inferno abraça o Diabo”. Faço fotos da lua
cheia de todas as formas possíveis. Com o telescópio e utilizando a minha
Barlow OMNI da Celestron. Esta é uma “2X”. Curiosamente amplia mais que a minha
“2X” da Skywatcher que veio junto com o Newton. Atualmente uso a carcaça da
Skywatcher com a lente da Celestron. (a OMNI não tem rosca apara o adaptador da
câmera...). Faço também sem Barlow. Depois
com a minha lente 300 mm da Pentax e com uma 70- 210 mm da Tamaron. Com nuvem e
sem nuvem. superexposto e sub exposto. Etc., etc. e etc....
Para
não dizerem que não falei de flores faço algumas imagens da Caixinha de Joias
de Herschel (Ngc 4755) e de Ômega Centauro.
Caixa de Jóias (Ngc 4755) 7 x 30 Seg. + 4 darks (Raw) -DSS 2X Drizzle+Fits+Photoshop |
Sem drizzle |
Omega Cen- 10X30Seg- DSS 2 drizzle+PixInSight+PS+Noiseware. Esta foto foi submetida a varios processos em todos os softs citados. |
A
primeira noite se encerra junto com a
garrafa de Wiborowa. Não poderia deixar de comentar que houve um show da
Anita na Armação para coroar o fracasso. Felizmente longe o suficiente da casa
para não ter que escutar nada...
Vai
começar a segunda noite. Sexta da Paixão. Ao contrario de Cristo continuo vivo apesar da vodka. Tudo no lugar e a cabeça quase
alinhada. O projeto da noite é modesto. Quero refinar o alinhamento polar pela
técnica nova e só. O resto será lucro. Observar (e fotografar) na lua cheia é
apenas um exercício. Mas como já dizia o poeta “homem é o exercício que faz.”
A
realizar o teste para o alinhamento para o azimute eu não poderia ser mais
feliz. Estava cravado. (Aqui em Búzios eu sei aonde esta o sul de cor e
salteado...). O topografo da região foi pai do caseiro e os lotes tem os muros
alinhados no sentido Leste-Oeste com uma precisão de segundos. Pelo menos na
Rua da Linguiça...
Depois
de alinhar o Synscan utilizando Acrux e Sirius e este se revelar bem preciso
começo a observar em uma das piores condições que já o fiz. O Bar todo aceso, a
cunhada fazendo bacalhau, a lua com 99.5% do disco iluminado, a pequeno febril
e uma cachorrinha Chihuahua histérica infernizando a todos. Mesmo assim aponto para Ngc 2516 no intuito
de revisitar o maior número possível de “Lacailles” possíveis durante a noite.
Com “O Sul Profundo: o Catalogo Lacaille” aberto sobre a bancada do bar planejo
uma minimaratona para a clara noite. Os DSO´s descobertos pelo Abbe (em sua
maioria) são dos poucos capazes de sobreviver a tanta agressão. Faço poucas
exposições e percebo que o acompanhamento está muito bom. Apesar das “full
conditions” (um termo inglês utilizado no montanhismo e que se refere a
escaladas realizadas com muito frio, neblina, neve e sobre terreno desconhecido,
mal protegido e pouco confiável) Ngc 2516 apresenta estrelas redondas e alguma
cor. É um dos mais ricos aglomerados abertos dos céus. Possui diversos apelidos: O Aglomerado do Corredor
( Sprinter cluster) e o Presépio Austral são os mais famosos.
Ngc 2516- 6X30 seg -DSS+Fits +PS. Pouquíssimo tratamento aplicado. |
Dedicarei
boa parte da noite me dedicando a caça de estrelas duplas. Afinal é Lua mais
que cheia... E estas são resilientes. Conheço uma nova e muito interessante. 24
Coma. Esta com sua componente primaria
sendo uma gigante amarelada e sua parceira uma estrela de um pálido branco
azulado. Belo contraste mesmo muito próxima a lua. Se separou com uma Barlow 2x
e uma ocular de 17 mm. Separação 20.3´´.
Depois
tento 35 Coma. É uma binaria visual. Os
membros foram resolvidos com ótica adaptativa.
Algieba
é outra divertida. Também com a Barlow e a 17 mm. Com uma separação de 4´´ não
a consigo fotografar. Ela se apresenta como uma estrela alongada. Não se
separando de fato. Bem no limite de Dawes do meu conjunto óptico.
Cor Caroli com uso de Barlow 2X -Frame unico |
Sem Barlow |
Não
poderia faltar Cor Caroli. No limite do conjunto ótico sem o uso de Barlow.
De
volta aos DSO´s visito um apagado M 35. Este me prepara para o que me espera. Mesmo
aglomerados bem claros serão discretos visualmente durante esta noite. Com o
Synscan (sistema de localização da cabeça equatorial. Também chamado de “go-to”.)
um pouco errante é bom manter o nível de expectativa baixo.
IC 2488- 9 X 30 Seg- DSS+PixIn Sight 1.0+PS(varios processos)+Noiseware. |
Retorna
a Lacaille e visito IC 2488 e IC2391. O primeiro bem discreto visualmente. Com
a ocular de 40 mm parece apenas um agrupamento casual. Mas como é velho
conhecido apelo para a 17 onde este se apresenta descolorido, porem mantendo
seu caráter de aglomerado evidente. Faço pouco mais de 10 fotos. Murphy é um
babaca. Em noite de Lua o acompanhamento se apresenta muito bom e consigo
exposições de 45 segundos com excelente aproveitamento. IC 2391, A pequena
Cassiopéia, é muito claro e evidente. Faço apenas uma exposição com este já
cruzando o meridiano e com o Newton (um newtoniano 150 mm f8) quase tropeçando
no tripé.
IC 2391- Frame unico. Apenas convertido de Raw para Jpeg no PS. |
Quando
visito Ômega Centauro perco qualquer esperança com relação a M 53 e M 68. O
gigante é pouco mais que um fantasma. Mas faço pouco mais de uma dezena de
exposições deste e com um foco raro para meu focalizador de pinhão e
cremalheira.
Ngc 5460- 10X30 seg- DSS+Fits+PS |
Resolvo
passear por Centaurus e acabo conhecendo um belo e discreto (em noite de lua cheia...)
aberto pouco visitado. Ngc 5460. Muito apagado visualmente requereu uma
navegação um pouco mais elaborada para se render. Faço muitas fotos. Este merece uma nova visita
em noite mais digna. Muito delicado e totalmente fora do circuito. Um clássico
do “Projeto Tudo que Existe”. Este foi fruto da melhoria da qualidade de vida
no Observatório. Com todos na Armação fiquei eu e meu pequeno em casa. E assim
a vizinhança baixou um ponto na Escala Bortle. Fechei o Bar, apaguei tudo que
dava e coloquei o APT (software para astrofotografia) para funcionar. Deixei o
computador fazer o trabalho sujo da captura e fiquei um pouco com meu filho
levemente febril. Definitivamente preciso fazer mais isto. Com um alinhamento
polar bom consigo 45 segundos de exposição sem acompanhamento. Por cerca de 10
fotos. Depois um leve ajuste e mais um round agora apenas com 30 segundos de
exposição.
M 7 -6 X 30seg -DSS Pix+PS |
Para
finalizar uma rápida captura de M 7 que vai brotando por trás da aroeira. E
claro, a lua com 99.6 % do disco iluminado.
Sábado de Aleluia chega a outra cunhada com o marido francês e mais duas crianças. Churrasco. Não é motivo para entoar-se o Gloria. Para não aproveitar nada da temporada Eustaquiana monto Mlle. Herschel (minha
montagem equatorial HEQ 5 pro) com a Canon e sua 18-55 mm “de fábrica". Em meio
as carnes e os vinhos farei algumas fotos de caráter mais artístico. Uma
espécie de Fairnbarns dos miseráveis. (Espero que ele me perdoe algum dia por
isto.) Uma pena que com a lua cheia exposições muito longas sejam inviáveis.
Com o alinhamento polar bom conseguiria exposições de 2 minutos facilmente com
uma distância focal tão curta. Não sou muito de fazer composites. Mas tenho
algum material para treino.
Acabo
encurtando as exposições devido a uma noite mais nublada. E acabo aproveitando
para testar as potencialidades de uma Tamaron 70-210 mm f4 que herdei. Faço
varias fotos com a mesma e ela se revela bem superior a Vivitar 70-150 mm f3.8
que reformei recentemente. Não é uma lente Zeiss mas vai dar para o gasto. Meu
sensor está precisando passar por nova faxina.
Infelizmente com o churrasco e com a casa muito cheia a casa se encontra
muito clara. Luzes de todas as cores acesas e descubro que meu irmão e minha
cunhada tem medo de escuro... Em uma varanda com pouco mais de 25 metros
quadrados existem 10 lâmpadas e todas sempre acesas. Vergonhoso.
Tamaron Single frame- PS.-O sensor esta imundo... |
Mimosa e Ngc 4755 -Tamaron @ 210 mm - 6X 30 seg- DSS+Pix+PS |
Rubiacea. |
Mas
a Tamaron localiza Ômega Centauro e a Caixa de Joias e faz interessantes
composições. É bom fotografar em f4. Mas com ela toda aberta percebo algum
cromatismo ao redor da Mimosa (Beta Crux). A lente mantém o foco conforme mudo
a distância focal. Ponto para ela. Usando o APT faço varias brincadeira com um
plano de captura para 10 fotos com 40 e depois 30 segundos de exposição. Apesar
de nuvens passageiras muitas fotos são aproveitáveis. Infelizmente as fotos com a Tamaron esta noite foram capturadas apenas em Jpeg. Uma distração minha atribuída ao vinho.
Para
encerrar a temporada apresenta-se um enorme halo lunar que vai se formando aos
poucos. Minha 18 mm é pouco para abarcar sua imensidão com todas as honras
necessárias para tamanho espetáculo. Mas
consigo o registro. Um halo enevoado e diferente.
Resta
empacotar as coisas e aguardar a manhã seguinte para esconder os ovos e depois
voltar para Rio. Infelizmente as crianças estão em aula e a maior não pode mais
faltar por razões tão mundanas. E o halo e o vento me dizem que o tempo vai
nublar.
Depois
disto ainda é necessário “revelar” as fotos. Especialmente quando sua captura
acontece em RAW (e deve acontecer) são muitas as possibilidades. As vezes penso
em primeiro “brincar” com as imagens a serem empilhadas uma a uma no Camera Raw
do Photoshop e depois empilhar estas “pré-tratadas”. Mas sempre me dá uma
enorme preguiça e nunca o fiz... Seguindo o curso normal todas as imagens de
cada um dos alvos vão passar pelo DSS para serem “stackeadas” (adoro poder
assassinar duas línguas simultaneamente com uma única palavra...) e
posteriormente visitar ou o Fitswork ou o PixInSight para a remoção dos
gradientes de fundo. Reparei que o Fits,
embora mais rápido e fácil, adiciona ruído as fotos após a remoção deste. O Pix,
que possui uma interface mais complexa e é mais trabalhoso, apresenta resultados
melhores. Depois disto tudo ainda visitarão o Photoshop para os ajustes finais.
E poderão ainda ir ao forno no Noiseware, mas este é um versão para lá de
genérica e não chega a mudar muito as coisas. Geralmente eu realizo um stacking
inicial no DSS com os frames integrais. E depois um segundo Stacking onde utilizo
o drizzle para conseguir imagens mais detalhadas e ampliadas. Evidentemente que
alguns DSO´s não nasceram para o processo de drizzle (Ngc 2516 é um exemplo clássico)
pois ocupam uma região maior do frame do que a área admitida para o drizzle. Abertos,
em geral, (uma opinião pessoal) se descaracterizam um pouco no procedimento. Já
Nebulosas Planetárias se beneficiam do mesmo.
Ao
longo do post vocês puderam observar algumas destas diferenças. O workflow das
fotos finais está descrito sob cada foto.
Que
venha a lua nova. Estou louco
para poder atacar o aglomerado de Virgem na Aporema adiada de Outono. E capturar logo M 53 e M 68.
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