Observar galáxias visualmente com
pequenos e médios telescópios é um exercício de paciência e tenacidade.
Algum
treino e técnicas serão de grande valia para a o neófito.
Para
aqueles que compraram seu primeiro telescópio (e imaginando que este se trata
de um refrator de até 90 mm de diâmetro) recomendo iniciar seu treinamento buscando
por outros DSO´s até que tenha desenvolvido sua capacidade navegacional e se
entendido bem com sua montagem (especialmente se esta for equatorial). Outra
coisa fundamental é possuir uma buscadora ótica de qualidade e com o máximo de
aumento possível. Recomendo que utilize uma buscadora 10X50 mm. Ou seja: uma
buscadora com uma lente de 50 mm de diâmetro e com uma magnificação de 10X. A
menos que você consiga um prisma eretor é importante também acostumar-se com
observar tudo invertido. Em cima será embaixo e direita será esquerda.
“EU VERIA O
JARDIM MUITO MELHOR”, disse Alice para
si mesma, “se pudesse chegar ao topo
daquele morro, e cá está uma trilha que leva
direto para lá… pelo menos — não, não tão
direto…” (depois de seguir a trilha por alguns
metros e dar várias viradas bruscas)
“mas suponho que por fim chega lá. É interessante
como se enrosca! Mais parece um
saca-rolha que um caminho! Bem, esta volta
vai dar no morro, suponho… não vai! Vai
dar direto na casa de novo! Bem, neste caso
vou tentar na direção contrária. ”
Alice Através do Espelho (Lewis Caroll)
Depois
de aprender a caminhar no País do Espelhos que se esconde dentro de sua
buscadora ficará bem mais fácil localizar alvos tímidos como galáxias. Mesmo
que você possua uma montagem equipada com Go-To. Galáxias, muitas vezes não se apresentam
imediatamente ao observador. E desta forma desenvolver suas habilidades de “star-hooping” (pulando estrelas) será fundamental para localizar estes universos-ilhas. Você geralmente irá começar o passeio junto a
sua buscadora e depois de determinado ponto seguirá viagem utilizando sua ocular de maior campo. Atualmente utilizo ou minha 40 mm ou minha 26 mm.
Quando
caçando por DSO´s em geral e por galáxias especificamente telescópios terão uma
função diferente de quando buscamos por imagens da lua, planetas ou paisagens
terrestres. Nestes casos seu principal propósito é ampliar o detalhe distante. Com
DSO´s terá como principal missão (mas não somente esta...) coletar luz para
seus olhos pouco sensíveis. Ao
observarmos galáxias o nosso problema não é que estas sejam muito
pequenas. É que elas são muito “escuras”.
Observar
DSO`s inclui um repertório de técnicas e normas que no caso de galáxias devem
ser conhecidos e respeitadas à risca.
Brilho do Céu - O fator isolado mais importante para a
observação de galáxias (e dso´s) é a poluição luminosa. Passei anos tentando
observar M 83 do Rio de Janeiro sem nenhum sucesso e bastaram alguns minutos
para localiza-la em diversos locais de céus mais “limpos”. Não que seja impossível,
mas o que você irá perceber será como um espirito assombrando sua ocular. Alguns truques podem ajudar aqui. Um é tentar
observar os objetos sempre o mais próximo a zênite possível. Observar depois de
00:00 e durante a madrugada também ajuda um pouco já que muitas luzes externas
são apagadas durante a madrugada.
A
lua é uma inimiga terrível de DSO´s.
Adaptação ao escuro- O ser humano é um
ser diurno apesar da boêmia ser responsável por algumas de suas mais belas
criações. E assim o olho humano funciona de forma muito mais eficientes com níveis
de luminosidade altos e estando-se sóbrio. Sem entrar em detalhes sobre a fisiologia do olho humano
vamos deixar claro que nossa capacidade visual noturna melhora com a adaptação ao
escuro. Depois de quinze no escuro total você vai ver melhor no escuro (até
seis vezes mais ou duas magnitudes...). Mas as coisas ainda continuarão
melhorando por mais uma hora e quinze minutos. Inicie sua observação com alvos
mais fáceis e depois ataque galáxias tênues e inicialmente invisíveis para sua
visão.
Visão Periférica – Uma técnica fundamental
para perceber objetos muito escuros ou tênues. Olhando diretamente para eles a
luz destes objetos vai recair sobre a fóvea
centralis (a parte mais central de sua retina) a qual possui muitas células
cone. Estas embora percebam cores não se dão bem com baixos níveis de luminosidade.
Por isto não percebemos cores em nebulosas e galáxias. Mas evitando-se olhar
diretamente para os objetos que observamos (olhando de rabo de olho...) conseguimos
perceber estruturas com baixíssimo nível de luminosidade. Esta técnica faz com
que a luz destes tênues objetos recais mais nas bordas de retina aonde se concentram
bastonetes. Estas são células que percebem luminosidade. Mas não cor. Por isto galáxias,
quase sempre, serão imagens em escala de cinza para observadores visuais. Mesmo
em telescópios bem grandes... A quem interessar possa pesquise por “rodopsina”
no Google.
Aumento ótimo- Reza a lenda que pequenas magnificações
funcionam melhor para DSO´s. Afinal com pequenos aumentos a pouca luz destes
objetos será concentrada em uma área menor e assim aumentar seu brilho de superfície.
(a quantidade de luz atingindo x milímetros quadrados em sua retina.) Mas
estudos recentes nos dizem que nem tudo é o que parece ser. E assim vamos
aprofundar um pouco o assunto.
Ao
contrário de câmeras ou outros sistemas puramente eletrônicos, químicos ou mecânicos
os olhos perdem resolução em baixos níveis de luminosidade. É por isto que você
não consegue ler a Astronomy Magazine no escuro embora possa ver a revista
mesmo que sua retina dilatada deveria, teoricamente, resolver as letras melhor
que durante o sol de meio dia. Estudos revelam que o olho humano pode resolver
detalhes de quase 1 arcmin (1/60 de grau) em luz brilhante, mas não pode
revelar detalhes menores que 20 ou 30 arcmin (1/3 a ½ de grau) em condições de
baixa luz. Uma área quase equivalente a lua no céu. Assim detalhes ou mesmo a
existência de alguns dsos só pode ser registrada se este forem ampliados até
algumas dezenas de minutos de arco.
O
recado é simples. Embora você use sua ocular com o maior campo disponível para
localizar suas galáxias você poderá ter que acreditar que seu “star-hooping”
foi eficiente e trocar esta por uma com um campo mais modesto e tentar ver o
que você não via antes... Uma boa ideia é possuir uma boa ocular com zoom. E as
boas são caras...
Valores de magnitude podem enganar. Procure
pelo brilho de superfície das galáxias que você tem em mente observar para
imaginar quão duro será o teste.
“Last
but not least”: Galáxias em espiral de perfil para nós (edge on) são mais
facilmente percebidas que galáxia de “frente para nós” (face on). M 33 por
exemplo é uma galáxia de 5,7a magnitude. Mas de frente para nós e
cobrindo uma área de mais de um grau de firmamento apresenta um brilho de superfície
baixíssimo e é um alvo bastante difícil de ser observado. Seria como o brilho
de uma estrela de 6a magnitude se espalhando por uma área com o
dobro do tamanho da lua cheia...
P.S.
– Faça seu dever da casa e estude os mapas que você conseguir em programas planetários.
Localize padrões em estrelas que indiquem que você chegou ao seu destino.
Agora
gostaria de apresentar uma lista de galáxias que são mais simpáticas a
observação por pequenos aparelhos e o caminho das pedras para que você não só
chegue como as observe de fato.
M 31- Grande Nebulosa de Andrômeda. É certamente a galáxia mais facilmente observável do céu. Seu núcleo é facilmente percebido a olho nu mesmo em locais bastante poluição luminosa (bortle 6 ou 7). Em locais escuros a nebulosidade cobre uma área enorme mesmo com vista desarmada. Pelo telescópio em locais escuros o núcleo é muito brilhante e percebem-se faixas escuras entre seus braços que se apresentam claramente com o uso de visão periférica. Mesmo com visão direta se consegue detalhes. Localizar Andrômeda é bem fácil. Primeiro ache o “Quadrado de Pégaso”. Uma de suas estrelas é Alpha Andrômeda. A constelação em si parece como uma cauda se esticando do quadrado em direção a nordeste. Em Andrômeda Localize Mirach e duas estrelas menos brilhantes (Upsilon e v And) que marcam a “cintura de Andrômeda”. Seguindo a corrente você irá perceber uma pequena região enevoada. Ela será obvia pela buscadora. Este é seguramente o alvo mais fácil desta lista. Como cobre uma área muito grande se você utilizar muita ampliação é possível que não consiga ver todo o conjunto da obra. Seu núcleo suporta ampliações absurdas e é mais fácil de se perceber que diversos globulares.
M 33 - A galáxia do Triangulo. Esta demanda céus muito escuros. Cobrindo também
uma área muito grande do céu muitas vezes é difícil percebe-la com muita
magnificação. Acho M 33 um alvo binocular difícil e um alvo telescópico mais difícil.
Em locais escuros ela se revela com bastante detalhe usando-se visão
periférica. É possível perceber diversas regiões HII nos braços da mesma que
possuem entrada no catalogo Ngc e IC só delas. IC 133 é o mais fácil deles. Para
localizar M33 ache Mothallah (Alpha Triangulo) e Mirach calcule a posição dela
em relação a estas estrelas e tente a sorte. Partindo-se de Mothala existe uma
estrela de 7a magnitude que indica o caminho.... Estude bem o mapa e
boa sorte.
Ngc 5128- Em Centauros. Facilmente
percebida pela buscadora. Geralmente parto de Ômega Centauro (o Globular mais
brilhante e que você deve estar localizando até mesmo vendado antes de tentar galáxias...)
e seguindo uma linha de fracas estrelas rumo norte ela estará lá. Revela muitos
detalhes e suporta bem magnificação. Sua faixa de poeira é muito evidente mesmo
em binóculos grandes (15X70). Um espetáculo nos céus austrais.
Ngc 55 – Localizada próxima a Ankaa (Alpha
Phoenix) Ngc 55 é uma bela galáxia que se apresenta de perfil para nós. O que,
em tese, facilita as coisas. Mas atenção e céus escuros vão ajudar muito. A partir de Ankaa siga um sinuoso caminho de
fracas estrelas (mas em um campo sem muitas estrelas...) que lhe levará até o
destino. Assim como Ngc 4945 uma de suas extremidades é mais brilhante e mais facilmente percebida.
Ngc 253- A grande galáxia de escultor.
Localizada quase exatamente entre Diphda (Beta Ceti) e Alpha Sculptor e com Ngc
188 (um obvio globular) bem próximo Ngc 253 é um alvo relativamente fácil. Só
se revela para a buscadora em locais escuros. Mas tendo-se estudado bem a área em
mapas bem ampliados vai se perceber um pequeno triangulo de estrelas sobreposto
a galáxia e que denuncia sua posição.
M 83- A galáxia do Cata-Vento austral.
Localizada na fronteira entre Hydra e centauros é uma galáxia de frente para nós.
A navegação até a mesma não é muito fácil.
Ela reside entre Menkent (q Cen) e y Hydra .
Partindo-se de Menkent passa-se por algumas estrelas mais brilhantes rumo ao
norte. Seguindo-se em direção a Hydra em uma região bem pobre de estrelas em
campo se encontra a galáxia. Pouco mais que uma estrela fora de foco. Com atenção
e em céus mais escuros se percebe a nebulosidade ao redor. Com mais ampliação
percebe-se traços de seus braços. Um mais evidente que o outro. Foi incrível Lacaille
descobrir este DSO com uma luneta de apenas 12,5 mm. É o alvo mais difícil no catalogo Lacaille e
o ultimo que observei. Céus escuro são importantes para pequenos instrumentos.
Não poderia deixar de citar M66 , M65 e M 104 como outras belas e "fáceis" galaxias para possuidores de pequenos telescópios e que estejam se iniciando nesta nobre arte. Estas até mais fáceis que algumas das galaxias acima presentadas. Mas achei importante apresentar diversas representantes dos céus austrais que embora acessíveis a pequenos aparelhos ficam de fora de muitas listas.
Depois de
estes alvos tentar a sorte no Aglomerado da Virgem será um passo óbvio. A
região pipoca em galáxias e diversas destas são até mais fáceis que algumas das
aqui apresentadas. Mas com tantas galáxias seu “starhooping) deverá ser afiado.
Pois em campo com poucas estrelas e muitas galáxias pode ser difícil de saber
quem é quem. E mesmo em campo tão rico em galáxias percebe-las pode ser bem
mais difícil que se supõe. Você vai
utilizar técnicas de “galaxyhooping”.
A
Observação visual de galáxias em pequenos aparelhos é para aqueles que
realmente gostam de DSO´s. será difícil achar e não espere detalhes (ao menos
na maioria das galáxias).
Galaxias são também interessantíssimos alvos fotográficos e através da astrofotografia revelam detalhes muitas vezes inimagináveis junto a pequenos ( e mesmo grandes) telescópios.
Todas as galaxias aqui apresentadas já foram apresentadas de forma mais aprofundada no Nuncius Australis. Uma rápida pesquisa pode levar aos respectivos posts para aquele que assim desejarem.
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