Há algum tempo eu não tentava a
sorte no Reino das Galaxias. Na verdade há anos. Desde os tempos em que as coisas não eram tão
politicamente corretas e que eu ainda podia chama-lo de Aglomerado de Coma-Virgem
e não ser acusado de sexismo pela minha própria filha...
Observar visualmente as galaxias
do aglomerado é uma tarefa difícil especialmente de locais afetados pela
poluição luminosa. Da Stonehenge dos Pobres é perda de tempo. Phill Harrington no seu já clássico "Starwatch"
nos diz que " mesmo sendo possível observar todas as Galaxias Messier (
Galaxias que foram descobertas e/ou incluídas no Catalogo Messier de Nebulosas publicado no século XVIII) com o auxilio de um binóculo de 50 mm estes
não são alvos indicados para novatos " Ele recomenda que você de uma
polida nas suas técnicas observacionais antes de tentar a sorte com alvos tão
difíceis.
Em experiencias anteriores ,
ainda nos tempos do "Galileu" ( meu bom , velho e confiável refrator 70 mm f13) eu já descobrira que é
melhor manter baixas as expectativas. Com este eu só consegui observar acima do
patamar de "Objetos Imaginários que gostaria de estar vendo" as
Galaxias mais luminosas. Sendo estas: M 49 , M 60 e M87. Na categoria dos " Objetos que
Percebo mas não Vejo" ficariam ainda M 84e M 86. Nestas o núcleo comparece
e se suspeita não ser uma estrela de campo.
Desta vez eu estava sedento de
sangue. Armado com o "Newton" ( meu mais novo porem nem tao jovem refletor 150 mm f8) e com Mme. Herschel ( uma
cabeça equatorial HEQ 5 pro com "go-to") eu preparei a emboscada.
Parti para Búzios pronto para pegar a noite de lua nova de maio com a casa
quase vazia. Iriamos somente eu , a cara metade , minha filha e o meu
filho. Organizei uma derrota realista e
coloquei tudo no papel. Ou melhor no "Notepad" do Windows...
O cronograma era bem apertado.
Iria pegar as crianças na escola as 13:00 horas
e sair direto para Búzios. Para realizar o alinhamento polar eu deveria
estar com tudo pronto no quintal dos fundos da casa as 18:20 para conseguir
utilizar Miaplacidus como estrela guia para o processo. Para desespero da cara metade a estrada até
Búzios é boa... Chegamos a casa as 16:00 horas tendo parado para comer croquetes
na casa do Alemão. Parei ainda para abastecer no Post "Atrás do Muro"
( a gasolina mais barata da estrada: R$ 3,59 o litro) e fiz mais um pitstop no
Supermercado quase chegando em casa.
As 18:00 Miaplacidus já se
encontrava centralizada na buscadora polar e com os parafusos da cabeça foi fácil
mantê-la ali até as 18:05:30.
Depois disto Murphy faz sua
visita obrigatória e começo apanhar das tomadas da casa. Realizava o alinhamento do Synscan da cabeça ( capaz de controlar a
cabeça e garantir suas capacidade de achar os objetos que você deseja. Também e
daqui para frente chamado de Go-to) e Murphy e seu amigo Osmar Contato vinham-me visitar. E lá ia eu de novo
realinhar o "go-to" de Mme.
Herschel.
Finalmente consigo superar todas
as dificuldades e a derrota planejada já tinha ido para o espaço.
E assim decido seguir os passos
propostos por Harrington no livro já citado. Este indica atacar o Aglomerado em
duas frentes Uma campanha começa por leste e outra por oeste. Me decido lutar
no front leste.
A observação visual de galaxias
é uma luta inglória. Muitas vezes você não vai ver nada ou quase nada ( a
menos que seu telescópio seja muito maior que o Newton). A maior parte delas
vai se apresentar na ocular pouco mais que seus núcleos. É por estes que você
procura em um primeiro momento . Depois de localizar um destes e desconfiar que
esta tênue estrela não é o que parece ser ( uma tênue estrela...) você vai
utilizar as tais técnicas observacionais polidas pelo tempo que o autor já
falou.A principal delas é a visão periférica. "Olhar com o rabo de
olho". Outra uteis são as vezes dar um tapinha no telescópio e
hiperventilar. Os olhos bem adaptados ao escuro são fundamentais.
Duas galaxias que nunca tinha
observado são a porta de entrada do aglomerado pelo leste. Fugindo um pouco do caminho traçado por
Harrigton ( que propõe iniciar em Vindemiatrix e observar a seguir Ngc 4762)
escolho partir de Rho Virginis e tentar perceber Ngc 4608 e
4596 no seu entorno. Já havia ensaiado o ataque no Stellarium ( um um
hibrido de software planetário e carta celeste ) e sabia que com minha ocular
de 40 mm ambas caberiam espremidas no mesmo campo que Rho. Existem outra fracas
estrelas no campo para ajudar a ambas disfarçarem-se. Ngc 4596 acabou se
entregando com o auxilio da 25 mm. Nada que que lembrasse o réveillon de
Copacabana mas ela estava lá. Seu núcleo bem obvio acompanhado de leve
nebulosidade no seu entorno. 4608 ainda mais discreta revelava somente seu
núcleo. Sabendo que estavam ambas em
quadro monto a câmera e realizo 40 exposições de 30 segundos. Desta vez
resolvera que ia utilizar o computador para me ajudar nas capturas e não ser
obrigado a ficar com um disparador na mão.
Havia feito o download do Astro
Photography Toll para a tarefa. Mas com
pouco tempo e sem querer correr o risco de perder a única noite que tinha
certeza que estaria aberta prefiro utilizar o Canon Utilities para controlar a
câmera. Escolho trabalhar em 1600 asas
já que estarei capturando mais frames do que geralmente faço e tentando ter menos ruido. Percebo logo na primeira
foto que era melhor ter sido mais conservador e utilizado a já habitual 3200
asa. Mas com tudo pronto , as fotos
rolando e o acompanhamento indo bem prefiro deixar as coisas como estão. E finalmente fotografo minha primeira
galaxia virginiana. Na verdade as duas primeiras. ( Há quem diga que M 104 é um
membro das bordas deste aglomerado . Mas não sendo uma Coma-Virgo "bona
fide" eu não vou considerar as fotos que já realizei desta) .
Depois peço para Mme. Herschel
me conduzir até M 87. Esta um alvo visual fácil e que já tinha observado com o
Galileu. Assim que coloco os olhos na Ocular percebo alguns esfuminhos. O campo
é rico em galaxias e como já havia
percebido que nos claros céus buzianos seria difícil conseguir extrair
detalhes me utilizando de minhas oculares prefiro fotografar as vitimas. Logo na primeira foto desconfio
que M 87 não esta entre elas. Mme Herschel tinha passado um pouco do ponto e
acabara me conduzindo para o Inicio da Corrente de Makarian. Estou nos arredores
de M 86 . Faço novamente 40 exposições . Desta vez com 3200 asa. Fico todo
feliz ao perceber que tinha capturado no conjunto " The Eyes". ( Ngc 4438 e 4435). Estas pequenas galaxias
merecem o apelido e mesmo visualmente transmitem a impressão de dois pequenos
olhos te observando. Percebo mais
varias galaxias no campo. Uma delas a interessante e visualmente perceptível Ngc 4388. Vou falar de todas elas
separadamente em posts futuros.
The Eyes |
Neste campo ocular você você vai
perceber diversas estrelas muito tênues. Diversas delas são galaxias. Com
atenção você irá perceber uma pequena nebulosidade envolvida. São todas
galaxias. Ao navegar por Coma-Virgo você não realiza "starhopping". A Brincadeira aqui é
"galaxyhooping".
Outra descoberta é que ao fotografar
o aglomerado você irá capturar diversas
galaxias em uma única foto. O campo do sensor de minha câmera no Newton ( uma Canon T3) cobre
62 `X42`. Nesta região isto implica em dezenas de galaxias em quase qualquer
lugar. Se lembramos que os membros do
aglomerado estão a uma distancia média de 60.000.000 de anos luz
de nós qualquer 1´de arco é algo como quase 6000 anos luz e que meu sensor vai cobrir mais de 300.000
anos luz por 200.000 anos luz de
latifúndio do universo. Não vamos falar em volume... Existe uma conta meio mandrake " paracalcular o diâmetro fisico de uma galaxia. Me foi apresentado no "Deep Sky Companions : The Messier
Objects" . Neste são apresentadas 2 constantes . Uma para objetos
galactico e outra para galaxias. Os valores funcionam bem para perto. Para
longe acho sempre muito modestos.
Esta foto engloba o oeste da
famosa Corrente de Makarian. Esta inicia-se em M84 , passa por M86 , segue rumo
a oeste pelo par que forma "The Eyes". São os membros originais da
Corrente e listados por Makarian ( seu
"eu profundo") . Creio que a Corrente de Makarian não tenha sido
batizada pelo próprio. Este grande astrônomo foi o primeiro a perceber e/ou
registrar que este grupo de galaxias caminham juntas pelo universo. Velocidade,
distancia e direção são iguais ou pelo menos muito próximas. Seu nome
em inglês é "The Makarian´s Chain" . Mas em um arroubo "José
Eustaquiano" ( lendário astronômo dos tempos do Império...) eu creio que
Makarian "himself" a definiu como "The Makarian´s Stream".
Algo como a "Corrente de Humboldt"
que nasce na Antártida e sobe a costa do Peru. Parente do "El
Niño".
A corrente de nasce próxima ao
centro "geográfico" do Aglomerado de Virgem e possui como
"Heartland" M86. são as Galaxias originais e com movimento medido por
Makarian M84 , M86, Ngc 4477, 4473,4461, 4458, 4438 e 4435.
No lote fotografado temos ambas as Messier e 4438 e 4435. Estas duas
formando o já citado "asterismo galáctico" conhecido como "Os
Olhos" ( "The Eyes" mesmo no Stellarium em português...) .
De volta ao projeto original e
achando que esta seria a grande estrela da noite me viro de costas para Virgem e olho para o sul. O objetivo agora seria Ngc 4945 em Centauros. Esta bem mais próxima que os velhos convidados
e assim cobrindo uma area de sensor muito maior. Somente 12.000.000 de anos luz
de nós. Com 20´de diâmetro e aplicando a tal conta que
falei ela mede menos de 30.000 anos luz. Mas 77.000 é uma valor comum na literatura.
Como falei a conta é meio "mandrake".
Fiquei um bom tempo caçando a
galaxia. Com magnitude listada de entre 8,5 e 9,3 deveria ser visível mesmo com
Bortle 7. Mas não era. Felizmente ela se localiza ao lado de Epsilon Centaurus.
Uma dupla. E com esta visível na buscadora e com o dever de casa feito eu sabia
onde ela estava. E estava. Foram realizadas 40 fotos de 30 segundos . Uma única
exposição nos explica o que é brilho de superfície. com 20´o brilho de uma
estrela de 8,5 magnitude é quase nada. depois do processamento ela revela alguns
detalhes. É um belo objeto que para ser observado visualmente deve demandar
céus muito escuros. Depois do objeto
fotografado e sabendo bem onde estava eu consegui suspeitar sua presença com a
17 mm.
Já ia tarde e minha cara metade
queria atenção. Marte já alto no céu é um bom programa para "os não
iniciados". O seeing não era essas coisas mas se percebiam algumas
formações no planeta já próximo da oposição. Com a 10 mm e uma barlow 2X tive
arroubos de Schiaparelli e achei que via canais escondidos na paisagem. Tempo
de encerrar a função e beber uma cerveja.
O Aglomerado de Coma- Virgo não
é alvo facil. Sem duvida uma grande diversão para aqueles que os americanos
chamam de "Deep Sky Die Hard". Algo como " Fissurado em Céu Profundo". Como no disse Harrington uma área de lazer para
os mais experientes. Mesmo com telescópios maiores que o Newton achar detalhas
na paisagem será um exercício de visão e experiência.
O que pode ser melhor que isto?
P.S. As fotos aqui apresentadas são fruto de um primeiro processamento realizado em Búzios. Por algum motivo o Deep Sky Stacker não quis funcionar por lá. Eu conseguia abrir os light frames mas ao tentar carregar os darks ele se fechava automaticamente. Desta forma recorri ao bom , velho e confiável Rot n´ Stack em combinação com o Fitswork para fazer o pós processamento. Já de volta ao Rio reinstalei o DSS e tudo voltou ao normal. Resolvi guardar estas para próximos posts e ainda são produto inacabado.
Eu sei que preciso limpar o sensor da câmera...
P.S. As fotos aqui apresentadas são fruto de um primeiro processamento realizado em Búzios. Por algum motivo o Deep Sky Stacker não quis funcionar por lá. Eu conseguia abrir os light frames mas ao tentar carregar os darks ele se fechava automaticamente. Desta forma recorri ao bom , velho e confiável Rot n´ Stack em combinação com o Fitswork para fazer o pós processamento. Já de volta ao Rio reinstalei o DSS e tudo voltou ao normal. Resolvi guardar estas para próximos posts e ainda são produto inacabado.
Eu sei que preciso limpar o sensor da câmera...
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