M 27 tem duas curiosidades
honrosas em seu currículo. Foi a primeira nebulosa planetária a ser descoberta.
E é o ultimo DSO apresentando no enciclopédico “Burnham Celestial Handbook”. Ainda
que quando descoberta não existisse ainda sequer o termo nebulosa planetária. E
quanto a segunda curiosidade não há nenhuma razão astronômica para tal. O livro
é organizado em ordem alfabética e com M 27 residindo em Vulpecula (raposa) é desnecessária
qualquer explicação.
Messier
a registra em 12 de julho, 1764. “Nébula sem estrelas descoberta em Vulpécula (Raposa)
entre suas duas patas dianteiras e muito próxima a estrela de 5a magnitude
Flamsteed 14 nesta mesma constelação. Pode ser vista claramente com um refletor
simples de três e meio pés. Apresenta um formato oval e sem estrelas. M.
Messier marcou sua posição na carta do cometa de 1779, que vai ser publicada no
volume da academia para aquele ano. Observada novamente em 31 de janeiro de
1781.”
É
interessante perceber que Messier, muitas vezes, não observou mais que uma vez
diversas das entradas de seu catalogo. Ele sempre destaca objetos que ele
observou mais de uma vez. Parece querer deixar claro que são objetos a não
serem observados. Nebulosas que estão no céu apenas para serem impostores de
cometas...
Mas,
ao contrário de Messier, Herschel julga sua exploração e registro matéria
fundamental. Ele é o próximo a colocar os olhos nela e embora não a identifique
como uma nebulosa planetária é ele o autor do verbete... Ele julgou que M 27 “...
um estrato duplo de estrelas de grande extensão. Um deles voltados para nós”.
Seu filho John é que lhe dá o apelido pela qual é chamada. A Nebulosa do Haltere.
Numa longa, completa e algo confusa
descrição:
“Uma
nébula com o formato de haltere... com um formato elíptico completado por tênue
luz. Posição de um eixo de simetria através de dos centros de duas massas
principais 30o a 60o. O diâmetro da elipse de luz
preenche um espaço quase igual ao dos fios (7´ou 8´). Não resolvível. Mas vejo
4 estrelas...” Em observação posterior
John Herschel a descreve assim: “com um formato semelhante a uma ampulheta,
preenche um formato oval com uma nebulosidade muito menos densa. A massa
central pode ser comparada com uma vertebra ou um haltere. A cabeça sul é mais
densa que a norte.”
Lorde
Rosse a observou devotadamente e chegou a conclusões que não poderiam estar
mais equivocadas. O nobre irlandês , o
clima inclemente de Parsontown e o maior
telescópio de seu tempo nos deixaram uma ode ao relativismo histórico e um motivo para não se construir observatórios no Mar do Norte e adjacências: “ É necessária uma noite extremamente especial e
um grande aumento tolerável , e então, percebe-se que consiste de inumeráveis estrelas
misturadas com nebulosidade; e então quando se vira o olho do telescópio para a
Via láctea , a semelhança é tão
impressionante que é impossível não se sentir uma forte convicção de que a nebulosidade em ambas vem da mesma
causa.” Pelo
menos ele não percebeu uma estrutura em forma de espiral em M 27. Rosse, que
graças ao Leviatã de Parsontown (o maior telescópio de seu tempo), descobriu a
estrutura espiral de várias galáxias e deu um passo no entendimento destas
estruturas. É provavelmente seu maior legado. Mas, já mais para o fim, começou
a perceber espirais em tudo que observava. Estando o padrão lá ou não... Coisa semelhante
acontece com místicos ao descobrirem Fibonacci ao lerem “O Código da Vinci”. Na
verdade, J.E. Gore disse ter percebido indícios de estrutura espiral na
nebulosa em fotos feitas por Schaeberle...
Smith
nos fala de forma entusiástica (de M 27) “um magnifico e singular objeto um
daqueles esplendidos enigmas que são propostos por Deus.”
Hoje
sabemos que M 27 é “uma das gigantes da classe das planetárias e de grande importância
na teoria destas estruturas. É a segunda nebulosa planetária mais estudada (atrás
de M 57) e com um tamanho aparente muito maior. Se encontra muito mais próxima
com valores encontrados na literatura que vão de 500 anos luz até 1300. Um
valor de 850 é presente em diversas fontes...
Nebulosas
planetárias são um suspiro na vida de estrelas com massas próximas ao nosso
sol. A estrela que alimenta M 27 possui
uma modesta magnitude de 14. E é uma parada dura para se observar visualmente. Os
observadores clássicos, mesmo com telescópios grandes, como Herschel, Rosse e Trouvelot
nunca a registraram em seus desenhos. Trata-se
de um tipo espectral muito quente (O 7, 85.000 K).
Com
cerca de 8 anos luz de diâmetro M 27 é, de fato, uma planetária muito
grande. A parte externa da nebulosa se expande
em uma taxa de 2,3´´ ao século. E a interior a mais de 6´´. em alguns séculos
ela terá se expendido tanto que seu brilho de superfície terá se “extinguido”.
Um breve suspiro cósmico. Calcula-se que
o show tenha se iniciado a cerca de 9.000 anos. No amanhecer da história. Mas
não há registros no alvorecer das civilizações de algum evento cósmico marcante
nesta região do céu.
![]() |
13 frames 30 seg ISO 1600+ 8 darks+8 flats - Stacking e 2 drizzle no DSS e stretch no PI e PS- |
M
27 é um espetáculo para possuidores de quase qualquer equipamento ótico. É claramente
percebida (em locais de céus escuros) com uma buscadora de 9X50. Com um Newton (um
refletor de 150 mm f8) ela se apresenta pálida no Rio de janeiro e é
espetacular sob céus rurais (Bortle 3). Chocante mesmo. É gigantesca para uma planetária
e um dos poucos objetos Messier que apresenta extrema semelhança no visual e no
fotográfico. Embora sua cor esverdeada seja muito discreta visualmente. Suporta
grandes ampliações. Mas apesar de perceber algumas estrelas envolvidas, (como
John Herschel) além da óbvia estrela no centro, que não é sequer relacionada a
nebulosa, não percebo nem sinal da estrela central. Esta parece escapar até de
O´Meara (que é biônico).
Ao garimpar o mapa para a navegação no Stellarium para este post descobri que , para meu desgosto (sou muito afeito as tradições...), inventaram dois novos apelidos para a Nebulosa do Haltere. Nebulosa Diabolo ( só quem já teve espingarda de chumbinho e já fez coisas extremamente incorretas vai associar uma coisa a outra...) e Nebulosa Apple Core ( que em uma tradução bem livre seria Nebulosa da Maçã Comida).
Localizar M 27 em centros
urbanos pode ser difícil já que Vulpecula é uma constelação discreta e a
nebulosa não comparece na buscadora. Geralmente é mais fácil iniciar o “hoop’ a
partir de Gamma Sagitta e chegar até 17 Flamsteed. Mas com algum dever de casa
e um bom mapa é bem factível.
Perto
de Gamma habita também M 71. Outro alvo difícil
debaixo de céus urbanos. Ambos fáceis
e espetaculares em céus escuros...
Agora
vamos falar um pouco de astrofotografia. As fotos aqui apresentadas são fruto
do Stacking de 20 exposições de 30 segundos (subs) com ISSO 1600. Foram empilhadas
no DSS e esticadas no PixInsight 1.8 e mais alguma cosmética feita no
Photoshop. Ou seja, seguiram a rota normal... Tanto na foto que abre o post
como na qual foi efetuada o processo de 2 drizzle foram aceitas apenas 13 subs pelo DSS.
Ando tentando realizar o
stacking utilizando também o PixInsight. Mas apesar de ser um programa caro o
DSS tem me saído mais eficiente e pratico para este processo. No Pix é
necessário realizar diversos procedimentos como calibrar os flats frames. Bem
como os subs e mais outros truques. E quando utilizo o script automatizado
deste o resultado tem sido pífio.
Curiosamente ,acho que apenas para o stacking, o DSS, embora freeware, é mais eficiente e
muito mais “user friendly”. Acho que vou insistir mais algumas vezes no
empilhamento no Pix. Mas algo me diz que acabarei voltando para o DSS na maior
parte das vezes. No Pix depois de muitos valores e menus ele acabou por aceitar
13 fotos também... Mas o resultado foi estranhíssimo. Nada em comum com o "desastres binários que a vezes ocorrem no DSS . Mas nada fidedigno.