IC 2395 foi um dos últimos objetos
do Catálogo Lacaille que observei. Não por razões técnicas. Apesar de ser um
objeto do “Index Catalog” e que isto possa sugerir um alvo mais difícil ele é
um DSO bem claro e navegação até o mesmo não chega a ser difícil.
Embora hoje em dia o acesso a
informação torne o trabalho do pesquisador muito mais fácil do que nos tempos
de Dreyer e que observar e registrar fotograficamente o Catalogo Lacaille não
seja nem de perto uma tarefa tão árdua como organizar todos os DSO´s conhecidos
até 1888 sempre é necessária alguma pesquisa quando trata-se com
documentos referentes ao séc. XVIII. Nem todas as entradas do Catálogo Lacaille
são unanimidades e dependendo da fonte consultada podem haver discrepâncias.
Para contribuir com a confusão o grande observador austral que se seguiu a
Lacaille foi Dunlop. E este não é famoso pela precisão de seus dados.
Meu primeiro contato com Lacaille se
deu através do trabalho de Frommert em seu incrível site associado a SEDS. E
neste a entrada Lac III. 3 é colocada em dúvida. Paira uma suspeita se este
objeto é um equivoco total ou trata-se do aglomerado aberto vdB-Ha 47 (Catalogo
van den Bergh-Hagen).
Posteriormente e visitando outras
fontes (colaborou para minha certeza o trabalho realizado por Stoyan com a colaboração
de Binnewies, Friedrich e Schoeder) descobri que Lac III. 3 é, acima de
qualquer suspeita, IC 2395.
O trabalho de Glen Cozens sobre os
três primeiros grandes catálogos de DSO´s austrais também ajudou na conclusão
embora em seu trabalho seja dedicado especialmente a Dunlop. E na verdade embora
ele nos diga em um momento que Lac III .3 é, possivelmente, vdB-Ha 47 em outro
ele associa este a IC 2395. Pela minha pesquisa a entrada 453 do Catalogo
Dunlop é o mesmo aglomerado que IC 2395 no Index Catalog elaborado por Dreyer (o
Index Catalog é um complemento do New General Catalog [NGC] e foi o primeiro
catalogo elaborado já com auxílio da fotografia).
Lacaille era muito metódico e a
posição por ele indicada é extremamente próxima (um erro de 2´) para haver
qualquer dúvida na identificação do objeto. Já
Dunlop foi duramente criticado por Herschel por suas anotações descuidadas e
pelos grandes erros na localização de seus objetos. Herschel quando explorou os
céus austrais localizou apenas 1/3 das entradas do Catálogo Dunlop. Cozens em seu trabalho faz uma revisão do
catalogo e identifica mais de uma centena de objetos além dos revisitados por Herschel.
É importante lembrar que Dunlop trabalhava sem nenhum tipo de apoio. Seu trabalho
é fundamental e belíssimo.
Para tornar as coisas mais confusas,
mas ao mesmo tempo encerrar a questão, retornei anos depois a página de Frommert
para vdB-Ha 47 e descobri que a possibilidade deste e IC 2395 serem o mesmo
objeto são enormes... enquanto IC 2395 foi descoberta por Bailey em 1908 vdB-Há
47 foi registrada pelo time van den Bergh- Hagen em 1975. Sua posição é muito
próxima e a descrição muito semelhante. Com isto o outrora objeto Lacaille “perdido”
e observado pelo Abbé em 17 de fevereiro de 1752 engaveta seu processo de
identificação.
Lacaille é sempre bem sucinto em
suas descrições e utilizando minúsculas lunetas não poderia ser mais preciso:
“Estrela de 6a magnitude
conectada a outra por um traço de nebulosidade. ”
Sua
descrição me lembra muito o que percebo utilizando uma buscadora de 7X30mm.
Já Dunlop com seu telescópio de 9 polegadas
e de espelho de metal apresenta uma descrição muito semelhante ao que vejo com
o “Newton” (um telescópio newtoniano de 150 mm f8):
“ Um grupo de 10 ou 12 estrelas pequenas
e bem brilhantes a sudoeste de 409 Argus (Bode) ”
Curiosamente IC 2395 , apesar de sua evidente graça, escapou de quase todos os "Guias Observacionais Modernos". Não entrou no Catálogo Caldwell e nem mesmo O´Meara em sua imensa série "Deep Sky Companions" fala nele. Burnham em seu "Celestial Handbook" dá um descrição sumaria da apresentação da constelação de Vela: "Mag. 6; Diam. 10´; Class E; Cerca de 16 estrelas mag. 9". Uma tremenda injustiça e um excelente motivo para você visitá-lo.
Sua estrela mais brilhante é de 5.5 a
magnitude. Do tipo espectral B5. Em trabalhos mais recentes a idade do
aglomerado é estimada em aproximadamente 7 milhões de anos. Em função da fonte
esta estimativa varia entre 5 e 16 milhões de anos. De qualquer forma um jovem
aglomerado galáctico localizado a 2500 anos luz de nós.
Em um trabalho desenvolvido por Zoltan
Balog, Nick Siegler, G. H. Rieke, L. L. Kiss, James Muzerolle, R. A. Gutermuth,
Cameron P. M. Bell, J. Vinko, K. Y. L. Su, E. T. Young e Andras Gaspar e
utilizado o Telescópio Spitzer foram identificados mais de 300 membros em IC 2395
e a presença de discos protoplanetários em aproximadamente 10% destes; Sistemas
solares em formação. Com o estudo de nosso convidado eles nos contam como o Spitzer
ampliou o nosso entendimento na formação destes discos. Hoje sabemos que a acréscimo de gases em
protoestrelas tende a estar cessando em 15 milhões de anos e que os discos
primordiais devem estar se dissipando. A esta altura os chamados planetesimais
(um projeto de planeta...) já se
formaram e a poeira produzida em suas colisões gera um disco de debris. Este
disco regenerado revela indiretamente a presença de corpos planetários que garante
a retroalimentação deste processo e nos permite rastrear a evolução de sistemas
planetários ao longo de toda a faixa de idades estelares.
Localizar IC 2395 em locais escuro
não é difícil. O mesmo se revela como uma estrela de 5a magnitude. Ou
parta de Regor e seguindo uma corrente de estrelas de 4a e 5a
magnitude você chegará a seu destino. Os outros abertos próximos são bem mais
discretos que IC 2395 e não há como se enganar. Uma vez na região aproveite
para conhecer Ngc 2660. É um interessante aberto com forte concentração
central.
O aglomerado é bem mais interessante do que pode sugerir a fotografia que abre o post. Esta foi resultado de pouco mais de uma dezena de exposições com 20 segundos de exposição ASA 1600. Porém sofreu muito com a lua quase cheia na ocasião...
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