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segunda-feira, 30 de março de 2020

Ngc 6067 Reloaded



                Ngc 6067 foi um alvo que visitei algumas vezes. Inclusive creio que já o apresentei por aqui. Mas o tempo passa e novas descobertas e conhecimentos vão se somando. Bem como a biblioteca cresce. E assim achei que era hora de fazer uma versão reloaded deste belo aglomerado aberto no coração da Nuvem de Norma.  Vão-se 7 anos desde o primeiro post.
Esta passou por 2X drizzle no DSS. Seguiu para o PixInSight e teve um pequeno ajuste de curvas no Photoshop. foi a unica foto no post a pasar no Pix. È um programa bem poderoso e uso com moderação. O acompanhamento deixou um pouco a desejar . Mas o alinhamento polar foi feito de forma estabanada como pode ser visto aqui 

      A primeira coisa que vão reparar é que a capacidade fotográfica aqui no Nuncius Australis aumentou desde o primeiro post. Você  vai poder ver a quantas andavam as coisas aqui ( Algumas fotos abaixo...). Eram tempo de Hipatia (uma montagem equatorial Eq 2-3). A nova captura foi realizada com Mlle. Herschel (uma Heq 5 pro). Uma outra diferença vai ser fundamental. Na primeira visita fotografei 6067 a partir da “Stonehenge dos Pobres” O carinhoso apelido para a janela de meu apartamento no bairro do Leblon no Rio de Janeiro. E desta vez o fiz a partir de Lumiar. Em um ambiente rural.  Uma diferença de 5 pontos na escala Bortle.  Acrescente a isto que na primeira captura foi utilizado o Newton (meu telescópio refletor 150 mm f8). Desta vez estava em campo uma lente Canon 70- 300mm @ f5,6.  Apesar de seu menor poder de ampliação sua qualidade ótica é infinitamente superior.
NGc 6067 -300 mm f 5.6- tempo total de exposição 4,5min -Stacking no DSS e apertada apenas no PhotoShop


                And Last but not least os softwares de processamento que possuo hoje são mais avançados e minha habilidade com os mesmos melhorou bastante com a prática. Nas fotos do primeiro post foram utilizados o já pré-histórico Rot n´ Stack e o Photoshop. A cocktail atual começa no Deep Sky Stacker, segue para o PixInsight e terminamos tudo com uma esfoliação no Photoshop.
Uma foto antiga... Newtoniano 150 mm f8- Rot n` Stack +Photoshop+ noiseware ( Outra reliquia)

                -Ahhh!! E não posso esquecer da ausência da tela de janela que habita na Stonehenge dos Pobres em razão das crianças e do gato. Sendo que na época o pequeno nem era nascido. E assim em uma noite mais animada eu ganhei mais alguns anos de tela na janela de casa. Atualmente a Stonehenge se encontra aposentada.
                Mas vamos ao que importa: Ngc 6067.
            O aglomerado habita uma das “supérfluas constelações” criadas por Lacaille nos anos de 1750, como dito por Ridpath e lembrado por O´Meara nos respectivos Stars and Planets e no Deep Sky Companions: the Southern Gems. Nada poderia ser mais injusto. A Norma (A Régua) pertencem diversos aglomerados abertos deslumbrantes e menos famosos. Certamente Ngc 6067 é o maior injustiçado da coleção.  Facilmente percebido a olho nu (lembrem-se Bortle 3...)  e um belíssimo espetáculo com qualquer auxílio ótico. A escala Bortle é uma escala de poluição Luminosa. Quanto mais baixo o valor mais escuro o céu sobre sua cabeça.
A Região é repleta de Aglomerados abertos...  Esta foto foi levada ao Site da astrometry para identificar todos . É a mesma foto que abre o post; 1 exposição de 30 seg em 70 mm f4.5. Esticada no photoshop. As capturas foram realizadas em RAW ( cr2) e 1600 ISO. As fotos são carregadas em Jpeg para o Blog. 

                Localizada a meros 25´de Kappa Norma o aglomerado vai permitir ver as mais diversas formas no lúdico exercício de se ligar pontos. O aglomerado pequeno é bastante denso e se localiza no braço galáctico interno. No mesmo que habita M 24. Ngc 6067 reside na Nuvem Estelar de Norma. O braço Espiral de Norma contém as mais maciças nuvens moleculares bem como a região  mais luminosa no disco galáctico de infravermelho distante com maciça formação estelar . Essa a aglomeração OB1 de Norma. Apesar de ser cerca de 3000 anos luz superposto a aglomeração em si o aglomerado está no coração visual da aglomeração OB 1 de Norma.
                Sua distância engana. Ngc 6067 é cerca de 20 mais rico que as famosas Plêiades e tem aproximadamente a mesma idade (algo entre 60 e 80 milhões de anos). Não espalhem isso por aí ou os ufólogos vão criar uma nova espécie...
                Ngc 6067 foi “descoberto” por James Dunlop em 8 de maio de 1826. É incrível que Lacaille não o tenha incluído em seu catálogo.  Dunlop descreve o aglomerado: “Um belo e grande aglomerado de pequenas estrelas de magnitudes variadas com aproximadamente 12´de diâmetro. As estrelas são consideravelmente mais congregadas em direção ao centro e este se estende sudoeste para nordeste. “(D 360)
                Posteriormente John Herschel nos fala de “uma estrela chefe no meio de um soberbamente rico e grande aglomerado. No mínimo 20´ de diâmetro, pois mais do que preenche o campo (ocular); não muito comprimido em direção ao centro. Estrelas de 10 a 12a magnitude (h 3619)
                Um estudo dirigido por J. Eggen em 1983 (Cerro Tololo) descobriu duas cefeídas (estrelas que funcionam como velas padrão em função da razão entre o tempo e o brilho delas) e que permitiram concluir com segurança a distância de 5.700 anos luz. Há ainda mais uma cefeída no campo, mas tudo indica pertencer a aglomeração OB1 mais distante.
3 X drizzle no DSS. 

                Ngc 6067 é um dos aglomerados abertos mais charmosos e brilhantes do céu e corre lado a lado com M6 (O Aglomerado da borboleta) e M7 (O Aglomerado de Ptolomeu). Um programa obrigatório e alvo para qualquer equipamento.


              Localizar Ngc 6067 é muito fácil. Localize Kappa Norma ,que será percebida facilmente com uma buscadora mesmo em cidades grandes, e localizou Ngc 6067. 



segunda-feira, 3 de junho de 2019

Astrofotografia , o Gênio Ródio, Corredeiras e o Sturm and Drang


           

           Astrofotografia é muitas vezes chamada de “A Arte Difícil”. Definitivamente fotografar DSO´s é bem mais complicado que fazer umas fotos das crianças. Implica em um equipamento maior, diversas técnicas e muita experiência e paciência. Você deverá possuir uma cabeça equatorial motorizada, realizar o alinhamento polar dessa com bastante capricho, contar com o clima e com as fases da lua entre outras coisas...
    Mas você pode ter toda essa diversão sem tanta trabalheira. Mesmo sem cabeça equatorial é possível se registrar grandes campos do céu. Com lentes grande angulares é possível se obter exposições longas o suficiente para se registrar diversos campos interessantes e até mesmo alguns DSO´s propriamente ditos. Não pretendi chegar a tão pouco mas também não queria sofrer muito...
        Era tempo de se subir a Serra. Meu filho estava muito saudoso de seus “amigos capoeiras” e eu estava desejoso de subir a Serra e aproveitar não só para ver alguns amigos como para desfrutar dos céus bem mais escuros de Boa Esperança. Essa um pequeno ajuntamento rural próximo a Lumiar.
       Normalmente eu realizaria uma derrota (um termo náutico para plano de navegação...) onde teria diversos alvos a serem capturados e o horário que estes cruzariam o meridiano. Ainda teria várias estrelas com horários e altitudes calculadas para me ajudar com o alinhamento polar (tenho horror a fazer o drift para alinhar Mlle. Herschel).
     Provavelmente devido aos saraus filosóficos que vem sendo organizados pela minha tia, onde estudamos como a Beleza só pode ser compreendida na sua integra através da liberdade ( ou coisa que o valha...) ,no entender de Schiller, e abraçado ao seu conceito de  Gênios Morais que  o assim são de uma forma orgânica decido que dessa vez irei partir para um outro  tipo de abordagem. Em vez de levar o Newton (um telescópio com 1200 mm) irei somente eu, meu filho, Mlle. Herschel ( minha cabeça equatorial HEQ 5) , a Câmera e um quiver de lentes. Entre minhas lentes tenho duas favoritas. Uma Pentax 50 mm f 1.7 e uma outra 300 mm f 4.  Na véspera pego emprestado um duplicador com um amigo. Mas esse se revela incompatível com meu equipamento. Uma pena. 
          Assim no dia 31 de maio do ano de 2019 saio rumo a serra as 11:39 da manhã.  Em uma viagem tranquila estamos chegando na casa de meu velho professor de Geomorfologia as 14:30 da tarde.  Rio- Boa Esperança em menos de 3 horas. Com direito a parada para croquetes na Casa do Alemão e a umas compras rápidas no Mercado de Lumiar. Um recorde... Bastante impressionante se levando em conta que desta vez fui com um Fiat Mobi. Carro o qual eu achei uma porcaria. Cambio frouxo, pouquíssima potência e nem um pouco econômico. O aluguel é barato...
        Tal e qual o Gênio Ródio de Humboldt (um aluno de Schiller e fundador da Geografia) escolho que Theta Carina é a estrela certa para me ajudar no Alinhamento polar. Sendo a estrela mais brilhante das Plêiades do Sul e cruzando o meridiano exatamente as 18:00 me parece que nada pode dar errado. Exceto que as 18:00 ainda está claro para burro e a Buscadora polar não é exatamente um poderoso telescópio. Desconfiando que estou com a moça errada centralizada eu me dou por satisfeito.  
     Quando vou alinhar o Go-to (um sistema que permite que a cabeça equatorial localize os objetos que você quer observar sozinha...) percebo que o alinhamento polar esta medíocre. E assim será.


            Eu tinha um plano. Dessa vez astrofotografia ia ser a melhor diversão e nada desse papo de Difícil Arte. Mas...
        Esqueci o cartão de memória da câmera. Em um primeiro momento pânico. Mas rapidamente atino que possuo um programam maravilhoso no meu lap top. ATP tools. (Astrophotography tools). E assim conecto a câmera ao computador através de um cabo Canon, habilito o obturador desta a trabalhar sem cartão  e capturo as imagens diretamente para a pasta default do ATP. Nunca tinha feito isso. Mas não foi tão difícil. Fiquei com a impressão que o cabo é responsável por mais ruído nas capturas. Mas pode ser só implicância. E descubro que o ATP captura as imagens (por default) tanto em Jpeg como em RAW. E ainda cria uma pasta com versões pequenas (thumbnails) em PNG.  
Rho Ophiuchi e Antares régio. também conhecida como a "14a vértebra" . Foto com 3 Drizzle no DSS. 

Com a questão da captura resolvida parto para o jogo. Coloco a 300 mm na câmera e mando Mlle. Herschel em busca da “Running Chicken Nébula” no entorno de Lambda Centauro.
Percebo que não vai dar para se almejar tanto bebendo na companhia de Humboldt, Schiller e do Gil Velho e com um alinhamento polar feito , ou melhor, não feito. Coloco a 50 mm e mando Mlle. Herschel apontar para o Cruzeiro do Sul. Astrofotografia com uma 50 mm é bem mais fácil que com a 300mm e infinitamente mais fácil com um telescópio de 1200 mm.  O acompanhamento, alinhamento polar e etc. se tornam bem mais complacentes.
Essa foto esta centrada na apagada constelação de Circinus. No canto esquerdo está K Norma envolta em Ngc 6067. Um aberto impressionante.



Com o computador protegido do sereno e instalado em uma cadeira de bar coberta pelo meu Anorak eu já possuo um plano de captura para light frames (que são simplesmente fotos)  pré-programado no ATP onde, ao contrário do Crivella, tenho tudo sob controle. A câmera irá realizar 20 exposições de 45 segundos com ISO 1600 e com 5 segundo de intervalo entre as fotos. Um luxo. Você clica em “Start” e pode ir brincar com as crianças, beber cerveja com os amigos e outras cositas más. Depois de 1000 segundos o computador emitirá o som de sino e posso voltar e fazer tudo de novo.

Cauda de Scorpio

E assim capturo, sempre com a 50mm em f1,7, uma bela região pouco fotografada centrada em  Circinus com a Nuvem de Norma no canto esquerdo da foto. o campo de provas favorito na região de Antares e Rho Ophiuchi e a área no entorno do Falso Cometa em Escorpião.



Falso Cometa.

Sempre que observo a Via Láctea me lembro de um Rio. Algumas regiões são evidentes corredeiras. Estas áreas são sempre muito fotogênicas. E por isso ainda tento visitar a área em torno de Eta Carina. Quando se fala em corredeiras me lembro sempre que li em algum lugar que estas são classificadas (pelos praticantes de canoagem em uma escala que vai de do grau I (novatos) até VI (suicidas apenas) (https://en.wikipedia.org/wiki/International_scale_of_river_difficulty). A região de Norma seria algo como  III +.

    Eta Carina seria uma corredeira 5x. Ou seja suicida, mas muitas vezes navegada.  Dessa vez passo por apertos e o excesso de condensação me vira o kayak. A água é um perigo nos mais diversos estados... De qualquer forma acho que os resultados são abaixo da média e acabo descartando os quadros. Mas como o ATP \tools cria uma pasta com thumbnails ( em PGN) de todas as fotos capturadas acabei por achar 11 fotos de Eta carina e adjacências perdidas no HD. Tentei empilhar as pequenas fotos ( 256 por 128 pixels) no DSS. Não deu certo. Então ressuscitei o Rot n´s Stack . Seu efeitos são sempre mais para pop art que para astrofotografia. Mas  talvez embriagado pelo espirito do Sturm and Drang e do romantismo alemão que embala este post seguem alguns dos resultados..  Embora me pareçam resultado mais apropriados para o movimento  do "Storm and Drunk" que das obras de Schiller. 




single Thumbnail antes de ser feito belo e livre pelo Rot n´Stack. 

A noite transcorre assim. O único inimigo é a condensação. Sem um dew heater (um acessério que mantém as lentes aquecidas)  eu acabo perdendo o jogo. E com o velho professor meio adoentado e tendo se retirado bem cedo (19:30) desisto de lutar contra a natureza. As 22:30 dou uma olhada em Júpiter utilizado o Galileo (um refrator de 70 mm que estava aposentado há um bom tempo) e com esse também apanhando da condensação eu desisto.
Senhores das Moscas ou Captain Fantastic.

Dormindo as 10:30 da noite acordo sem esforço as 6:30. Depois de um café seguimos para um local em que pretendo retornar para a Aporema de Inverno. Galdino polis. Lá espero ter um céu Bortle 2. O Polis do nome está para lá de exagero... Vou com o Gil e as crianças até uma pequena casa de um amigo  perdida em meio a um grande pasto com o Rio Macaé ainda muito limpo ao seu lado. Fazemos uma macarronada a bolonhesa. No fogão de lenha da varanda.  As crianças brincam no Rio e no pasto. Eu confesso que poucas vezes mergulhei em água tão fria. Depois voltamos para beber em Lumiar. Compro um cartão de memória por 55 reais. Achei em conta.  Mas a chuva se aproxima. O resto é de pinga e prosa. 
Domingo partimos de volta para o Rio. Foi pouca astrofotografia. Mas definitivamente a 50 mm faz as coisas renderem muito. 
Astrofotografia é a melhor diversão...
Para os fissurados: Todas as fotos são resultado de 20 exposições de 45 segundos com ISO 1600. Captura em RAW (cr2.).  Tempo total de exposição 15 min. Foram utilizados ainda 20 dark frames para calibragem. Lente Pentax 50 mm f1.7. Canon T3 . Montagem equatorial HEQ 5 pro. 
O stacking ( empilhamento) foi realizado no Deep Sky Stacker. E as fotos foram posteriormente "esticadas" no PixInsight 1.8 e e passaram por algum trabalho cosmético no PhotoShop CS 8. 

quinta-feira, 9 de agosto de 2018

M 27: A Nebulosa do Haltere ,Deep Sky Stacker, PixInsight e os Delírios de Rosse.

                  

                  M 27 tem duas curiosidades honrosas em seu currículo. Foi a primeira nebulosa planetária a ser descoberta. E é o ultimo DSO apresentando no enciclopédico “Burnham Celestial Handbook”. Ainda que quando descoberta não existisse ainda sequer o termo nebulosa planetária. E quanto a segunda curiosidade não há nenhuma razão astronômica para tal. O livro é organizado em ordem alfabética e com M 27 residindo em Vulpecula (raposa) é desnecessária qualquer explicação.
                Messier a registra em 12 de julho, 1764. “Nébula sem estrelas descoberta em Vulpécula (Raposa) entre suas duas patas dianteiras e muito próxima a estrela de 5a magnitude Flamsteed 14 nesta mesma constelação. Pode ser vista claramente com um refletor simples de três e meio pés. Apresenta um formato oval e sem estrelas. M. Messier marcou sua posição na carta do cometa de 1779, que vai ser publicada no volume da academia para aquele ano. Observada novamente em 31 de janeiro de 1781.”
                É interessante perceber que Messier, muitas vezes, não observou mais que uma vez diversas das entradas de seu catalogo. Ele sempre destaca objetos que ele observou mais de uma vez. Parece querer deixar claro que são objetos a não serem observados. Nebulosas que estão no céu apenas para serem impostores de cometas...  
                Mas, ao contrário de Messier, Herschel julga sua exploração e registro matéria fundamental. Ele é o próximo a colocar os olhos nela e embora não a identifique como uma nebulosa planetária é ele o autor do verbete... Ele julgou que M 27 “... um estrato duplo de estrelas de grande extensão. Um deles voltados para nós”. Seu filho John é que lhe dá o apelido pela qual é chamada. A Nebulosa do Haltere.   Numa longa, completa e algo confusa descrição:
                “Uma nébula com o formato de haltere... com um formato elíptico completado por tênue luz. Posição de um eixo de simetria através de dos centros de duas massas principais 30o a 60o. O diâmetro da elipse de luz preenche um espaço quase igual ao dos fios (7´ou 8´). Não resolvível. Mas vejo 4 estrelas...”   Em observação posterior John Herschel a descreve assim: “com um formato semelhante a uma ampulheta, preenche um formato oval com uma nebulosidade muito menos densa. A massa central pode ser comparada com uma vertebra ou um haltere. A cabeça sul é mais densa que a norte.”
                Lorde Rosse a observou devotadamente e chegou a conclusões que não poderiam estar mais equivocadas.  O nobre irlandês , o clima inclemente de Parsontown e o  maior telescópio de seu tempo nos deixaram uma ode ao relativismo histórico e  um motivo para não se construir  observatórios  no Mar do Norte e adjacências: “  É necessária uma noite extremamente especial e um grande aumento tolerável , e então, percebe-se que consiste de inumeráveis estrelas misturadas com nebulosidade; e então quando se vira o olho do telescópio para a Via láctea , a semelhança  é tão impressionante que é impossível não se sentir uma forte convicção  de que a nebulosidade em ambas vem da mesma causa.”    Pelo menos ele não percebeu uma estrutura em forma de espiral em M 27. Rosse, que graças ao Leviatã de Parsontown (o maior telescópio de seu tempo), descobriu a estrutura espiral de várias galáxias e deu um passo no entendimento destas estruturas. É provavelmente seu maior legado. Mas, já mais para o fim, começou a perceber espirais em tudo que observava. Estando o padrão lá ou não... Coisa semelhante acontece com místicos ao descobrirem Fibonacci ao lerem “O Código da Vinci”. Na verdade, J.E. Gore disse ter percebido indícios de estrutura espiral na nebulosa em fotos feitas por Schaeberle...
                Smith nos fala de forma entusiástica (de M 27) “um magnifico e singular objeto um daqueles esplendidos enigmas que são propostos por Deus.”
                Hoje sabemos que M 27 é “uma das gigantes da classe das planetárias e de grande importância na teoria destas estruturas. É a segunda nebulosa planetária mais estudada (atrás de M 57) e com um tamanho aparente muito maior. Se encontra muito mais próxima com valores encontrados na literatura que vão de 500 anos luz até 1300. Um valor de 850 é presente em diversas fontes...
                Nebulosas planetárias são um suspiro na vida de estrelas com massas próximas ao nosso sol.  A estrela que alimenta M 27 possui uma modesta magnitude de 14. E é uma parada dura para se observar visualmente. Os observadores clássicos, mesmo com telescópios grandes, como Herschel, Rosse e Trouvelot nunca a registraram em seus desenhos.  Trata-se de um tipo espectral muito quente (O 7, 85.000 K).
                Com cerca de 8 anos luz de diâmetro M 27 é, de fato, uma planetária muito grande.  A parte externa da nebulosa se expande em uma taxa de 2,3´´ ao século. E a interior a mais de 6´´. em alguns séculos ela terá se expendido tanto que seu brilho de superfície terá se “extinguido”. Um breve suspiro cósmico.  Calcula-se que o show tenha se iniciado a cerca de 9.000 anos. No amanhecer da história. Mas não há registros no alvorecer das civilizações de algum evento cósmico marcante nesta região do céu.   
13 frames 30 seg ISO 1600+ 8 darks+8 flats - Stacking e 2 drizzle  no DSS e stretch no PI e PS- 

                M 27 é um espetáculo para possuidores de quase qualquer equipamento ótico. É claramente percebida (em locais de céus escuros) com uma buscadora de 9X50. Com um Newton (um refletor de 150 mm f8) ela se apresenta pálida no Rio de janeiro e é espetacular sob céus rurais (Bortle 3). Chocante mesmo. É gigantesca para uma planetária e um dos poucos objetos Messier que apresenta extrema semelhança no visual e no fotográfico. Embora sua cor esverdeada seja muito discreta visualmente. Suporta grandes ampliações. Mas apesar de perceber algumas estrelas envolvidas, (como John Herschel) além da óbvia estrela no centro, que não é sequer relacionada a nebulosa, não percebo nem sinal da estrela central. Esta parece escapar até de O´Meara (que é biônico).  
               Ao garimpar o mapa para a navegação no Stellarium para este post descobri que , para meu desgosto (sou muito afeito as tradições...), inventaram dois novos apelidos para a Nebulosa do Haltere. Nebulosa Diabolo ( só quem já teve espingarda de chumbinho e já fez coisas extremamente incorretas vai associar uma coisa a outra...) e Nebulosa Apple Core ( que em uma tradução bem  livre seria Nebulosa da Maçã Comida).

                Localizar M 27 em centros urbanos pode ser difícil já que Vulpecula é uma constelação discreta e a nebulosa não comparece na buscadora. Geralmente é mais fácil iniciar o “hoop’ a partir de Gamma Sagitta e chegar até 17 Flamsteed. Mas com algum dever de casa e um bom mapa é bem factível.
                Perto de Gamma habita também M 71. Outro alvo difícil 

debaixo de céus urbanos. Ambos fáceis e espetaculares em céus escuros...
           Agora vamos falar um pouco de astrofotografia. As fotos aqui apresentadas são fruto do Stacking de 20 exposições de 30 segundos (subs) com ISSO 1600. Foram empilhadas no DSS e esticadas no PixInsight 1.8 e mais alguma cosmética feita no Photoshop. Ou seja, seguiram a rota normal... Tanto na foto que abre o post como na qual foi efetuada o processo de 2 drizzle  foram aceitas apenas 13 subs pelo DSS.
   Ando tentando realizar o stacking utilizando também o PixInsight. Mas apesar de ser um programa caro o DSS tem me saído mais eficiente e pratico para este processo. No Pix é necessário realizar diversos procedimentos como calibrar os flats frames. Bem como os subs e mais outros truques. E quando utilizo o script automatizado deste o resultado tem sido pífio.  
     
Desastre Binário versão PixInsight. Resultado do empilhamento no Pix depois de um tour de force . Calibrar Lights , flats , criar master dark e flat, aplicar correções cosméticas nos lights e etc. para só depois integrar os lights. Um longo caminho para isto... Melhor empilhar no DSS e esticar no Pix.  
   
      Curiosamente ,acho que apenas para o stacking, o DSS, embora freeware, é mais eficiente e muito mais “user friendly”. Acho que vou insistir mais algumas vezes no empilhamento no Pix. Mas algo me diz que acabarei voltando para o DSS na maior parte das vezes. No Pix depois de muitos valores e menus ele acabou por aceitar 13 fotos também...      Mas o resultado foi estranhíssimo. Nada em comum com o "desastres binários que a vezes ocorrem no DSS . Mas nada fidedigno.                                                                                

sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

M 92 : Um Ancião entre Anciões



        M 92 é primo irmão de M 28. São ambos globulares de uma família que nasceu para ser ofuscada pela família dos “Grandes Globulares”. M 28 é praticamente esquecido devido a sua proximidade de M 22 (O Grande Aglomerado de Sagitário). M 92 sofre a mesma sina por habitar ne mesma constelação de M 13 (O Grande Globular de Hércules). Em minha missão auto imposta e já próxima do fim de fotografar todos os globulares Messier ele acabou ficando para trás provavelmente devido a isto e também por passear baixo no horizonte norte aqui pelas bandas do trópico de Capricórnio. Não bastasse isto sua foto acabou esquecida em uma pasta errada de meu HD e este aglomerado pé frio acabou esperando ainda mais tempo para ser aqui apresentado.  Uma Tremenda injustiça...
          Como Burnham nos diz “M 92 é um lindo e rico aglomerado globular que em qualquer outra constelação seria um espetáculo à parte. Mas em Hércules...”. Vocês podem imaginar como termina esta sentença.  
Localizado a cerca de 6o norte de Pi Herculis, que é a estrela que marca o canto nordeste do chamado “Keystone” de Hercules. Este é um asterismo em formato trapezoidal que permite uma fácil identificação da constelação.  Nos meus locais habituais de observação M 92 sofre um pouco com sua baixa altitude e é muito exposto a poluição luminosa. Mesmo assim (em noites boas) ele é perceptível como uma estrela enevoada em minha buscadora (50 mm) e evidente com meu 15X70 mm. Quando observado com o “Galileu” (um refrator de 70 mm) com 90X de aumento desconfio de alguma resolução em suas bordas. Ou ao menos um aspecto granular. Utilizando o Newton (um refletor de 150 mm) e com 120X suas bordas se resolvem e M 92 começa a mostrar seu charme.
M 92 retrabalhado. DSS+PixInsight+PS. É impressionante a semelhança com o registro de Trouvelot. (Um desenho). 

       Perceber M 92 não é difícil realmente. É um globular brilhante e certamente deve ser mais interessante ainda se observado do hemisfério norte da terra.  Sua orbita apresenta grande excentricidade e este ao longo de seu passeio de 200 milhões de anos do centro galáctico pode se encontrar a 5000 anos deste ou a 35.000 anos deste. Devido a precessão da rotação do eixo da Terra em 14.000 anos ele se encontrará a menos de 1o  do polo norte celeste e fora do alcance para habitantes da cidade Maravilhosa...  E meu projeto para fotografar todos os “Globs Messier” ou iria para o brejo ou sairia ainda mais caro.
M 92 reside, no momento, a 25.400 ano luz da terra e com um diâmetro aparente de 14 ´ se espalha por um latifúndio de quase 104 anos luz de universo. Sua descoberta se deve a Bode que o observou em 1777. Este foi redescoberto de forma o independente por Messier em 1781 e este nos diz tratar-se de “Uma bela e conspícua nebulosa, bastante brilhante, entre o joelho e a perna esquerda de Hercules. É claramente visível com um refrator de 1 pé (se refere a distância focal do equipamento).  Não contem nenhuma estrela. Seu centro é limpo e brilhante. cercado por nebulosidade e recorda o núcleo de um grande cometa...”. Herschel resolve o objeto e Smith, em 1844, relata: “Um aglomerado globular de pequenas estrelas, precede a perna de Hercules. Este objeto é grande, brilhante e resolvível (Smith utilizou sempre um refrator de 150 mm em seu trabalho), com um centro muito luminoso; e sob as melhores condições apresenta as bordas irregulares e radiantes”. Smith no legou um desenho de M 92.  Trouvelot também desenhou o aglomerado em 1877. Cem anos depois de sua descoberta.
M 92 é um globular muito antigo e sua idade foi durante muito tempo paradoxal. Muito pobre em metais houve um momento que ele seria mais velho que o próprio universo. Em modelos antigos da evolução estelar em globulares acontecia este “pequeno” problema. Mas isto devia-se a modelos cosmológico antigos onde a expansão do universo desaceleraria. De qualquer forma ele é um ancião entre anciões. 14 bilhões de anos....
Smith

Trouvelot

Nos tempos de Hipatia (minha montagem equatorial EQ 2-3) para localizar M 92 eu, geralmente, mirava com meu “red dot Finder” em Pi Herculis e calculava o salto até o aglomerado por esta. Depois partia para a minha buscadora optica (8X50 mm) e geralmente com rápida escaneada chegava até ele. M 92 passeia bem baixo no horizonte e pode ser enganadoramente estelar de Búzios e muito discreto do Rio.  O´Meara nos diz que é facilmente perceptível a olho nu. Com magnitude 6.5 é uma possibilidade. Se você morar em um local muito escuro e ao norte do equador.
As fotos que fiz do globular demonstram bem isto. Foram realizadas em Búzios 21 de julho de 2017. Mesmo com a lua quase nova havia muita nebulosidade no ar e embora a maioria dos mortais acredita-se ser uma noite “limpa” eu sabia que a transparência não estava lá estas coisas. O sensor de minha câmera sabia disto também e o ruído nas fotos evidencia isto mais ainda. 
Existe um recurso no Deep Sky Stacker (um software para astrofografia) que permite “ampliar” os objetos fotografados. Na verdade, você determina uma região a ser empilhada nas fotos capturadas utilizando o recurso de Drizzle deste. Quando suas fotos estão muito boas este pode revelar vários detalhes. Quando não este pode revelar muito ruído. Com “2X Drizzle” este se torna muito evidente e com “3X Drizzle” insuportável.  A técnica de drizzle foi elaborada pela NASA para as observações feitas pelo “Hubble Deep Field”. De maneira simples o que ela faz é que um objeto que na captura inicial ocupava apenas x pixels passe a ocupar 2x pixels (2X Drizzle) ou 3x pixels (3X Drizzle) na imagem processada.

sem drizzle

2 X drizzle

3 x drizzle

Desta forma apresento aqui M 92 em todas as suas versões fotográficas por mim obtidas. Tentei utilizar diversos softwares para melhora a coisa, mas sem grande sucesso. E curiosamente quando tentei utilizar o PixInsight para remover o gradiente das fotos o ruído se tornou ainda pior. Apesar deste ser um programa mais poderoso ele, neste caso, rendeu menos que o Fitswork na tarefa.
Acho importante frisar que a captura sofreu muito com a nebulosidade e diversos objetos fotografados na mesma noite passaram pelo mesmo problema. Evidentemente que DSO´s que se encontravam mais altos no céu foram menos influenciados. O DSS já dava dicas de problemas na captura de M 92. Dos 30 frames capturados ele nunca aceitou mais que 18. E mesmo assim com um limite muito baixo. Nas fotos aqui apresentadas e com um “threshold” de 9% ele só aceitou 11 fotos das 30 realizadas. As exposições foram de 30 segundos e o ISO 1600.
As fotos foram realizadas com o Newton, uma Canon T3 montadas sobre uma montagem equatorial HEQ 5 Pro da Skywatcher. Na observação visual este mal se apresentava na buscadora e havia muito pouca resolução nas bordas com 120 X de aumento.
 Mas missão dada missão cumprida. Faltam-me fotografar M 73 e M 68 no “Projeto Globulares Messier”. Como estou trabalhando até 22 de dezembro em busca do vil metal e com a esperança de poder me dar de presente um sistema de acompanhamento para o Newton este vai ficar para 2018...

                

quarta-feira, 26 de julho de 2017

M 57 - A Nebulosa do Anel


          M 57 é provavelmente a nebulosa planetária mais famosa do céu. Devido a seu formato é corretamente chamada de “ A Nebulosa do Anel”. Este pequeno círculo esfumaçado é um exemplo didático de uma das mais curtas etapas evolutivas de estrelas com a massa semelhante ao nosso Sol. Estas após consumirem todo seu hidrogênio, se tornarem gigantes vermelhas e expelirem sua atmosfera mais externa tornam-se anãs branca envoltas em anéis de gases originários de suas próprias “cinzas”. O formato pode variar um pouco em função do ângulo de visada e assim as vezes podem ser planetárias bipolares. Mas o termo Nebulosa Planetária surge devido ao característico formato destas nebulosas circulares e que se apresentam como pequenos discos planetário coloridos em telescópios mais modestos e tão comuns nos primórdios da astronomia observacional.

STRETCHED no PI.

            Recentemente falei por aqui que Messier (que é o verdadeiro descobridor de M 57) possuía telescópios inferiores ao meu. Durante as pesquisas para este post me deparei com um Dollond de 3 ½ polegadas de propriedade de nosso caçador de cometas. Um refrator de cerca de 90 mm feito pelo melhor fabricante de seu tempo. Os refratores Dollond são um marco na evolução dos telescópios. Neil English batizou o primeiro capitulo de seu livro (Classic Telescopes: A Guide to Collecting, Restoring and Using Telescopes of Yesteryear”) com o título de “The Dollond Century”.  John Dollond “criou” o telescópio acromático. Sem mencionar as colaborações teóricas de Euler, Hall ou Klingsternia ele apresentou seu projeto com uma objetiva feita com duas lentes de dois tipos distintos de vidro para a Royal Society em 1758. Ganhou a Copley Medal e o resto é história. Durante o século 18 os “Dollonds” eram os melhores telescópios do mundo.
            O próprio English testou um Dollond de 75 mm já da terceira geração da família de 1905 (circa) em M 57 e nos diz que ele não deixa nada a dever a um atual refrator do mesmo diâmetro.
            Como vinha querendo revisitar A nebulosa do Anel há tempos e fazer algumas fotos destas decidi pesquisar um pouco a respeito da mesma antes de me lançar a campo. Me recordava de ter visto um anel de fumaça onde com bastante ampliação notava um ponto negro na região central. O seja, um pouco mais que um falso disco planetário e de fato o Anel do nome. Com a pulga atrás da orelha se havia sido injusto com os telescópios de Messier decido visitar minha biblioteca em busca da descrição original e de outras descrições clássicas do mesmo.
            Antes de chegar a descrição de Messier na sua segunda edição de seu catalogo no Coinassance do Temps para 1783 (impresso em 1780) esbarrei uma longa história envolvendo diversos astrônomos e cientistas de várias gerações que parece só ter se definido em junho último. Com uma matéria que encontrei na Australian Sky and Telescope para agosto e setembro de 2017.
            Primeiramente fui na minha cópia do Catalogo Original (Um PDF disponível diretamente da BNF). Fracasso... esqueci que minha versão é da primeira edição (1771) e só cobre até M 45.

            O próximo passo é, evidentemente, consultar os mais atuais e meus inseparáveis companheiros quando se trata de Messier “ The Messier Objects” de O´Meara e o “Atlas of the Messier Objects” de Stoyan.
            É aí que a coisa começa a ficar divertida. Desejoso de apresentar M 57 de forma adiantada aqui no Nuncius Australis (reparem que tratados e revistas astronômicas sempre tentam lançar seus projetos com meses e até mesmo anos de antecedência. A segunda edição do Catalogo Messier foi editado em 1780 para um anuário destinado a 1783 e a S&T liberada em junho e que acabou me obrigando a mudar o post todo depois de pronto é destinada a Agosto e Setembro deste ano) descubro que a sua descoberta é atribuída a Antoine Darquier de Pellepoix. Em 1779.  Até mesmo Messier em sua apresentação nos diz isto: “ [ observado em 31 de janeiro de 1779] um remendo de luz entre b e g Lyrae descoberto enquanto observando o Cometa de 1779 (Bode) o qual passou muito próximo. Parece que este remendo de luz, o qual possui bordas arredondadas, deve ser composto de estrelas muito tênues. Não foi possível, entretanto,  ver a estas nem mesmo com o melhor telescópio (o já citado Dollond 90 mm), mas permanece a suspeita que há algumas. M. Messier marcou sua posição na carta para o cometa de 1779. M. Darquier, em Toulouse, descobriu esta nebulosa quando observando o mesmo cometa e reportou: “ Nébula entre b e g Lyrae, extremamente tênue, mas perfeitamente delineada. É tão grande quanto Júpiter e recorda um “apagado” planeta””
            A fim de realizar um “triple check” nas informações escolho vasculhar meu “Burnham´s Celestial Handbook” em busca de mais informações.
            Lá descubro que Darquier utilizou um telescópio de aproximadamente 75 mm em sua observação e confirmo que provavelmente foi William Herschel que percebeu a estrutura de M 57: “ Entre as curiosidades dos céus...  Uma nébula que possui um ponto escuro concêntrico e regular em seu centro... e é provavelmente um anel de estrelas. É oval em seu formato, o eixo mais curto sendo para o mais longo assim como 80 é para 100. ”  Burnham ainda nos diz que M 57 foi a primeira nebulosa planetária descoberta. Não é exatamente verdade M 27 foi descoberta antes, mas devido a sua posição em relação a terra ela não apresenta a forma de um anel perfeito. Nebulosas planetárias, em função de sua orientação para terra podem possuir diferentes formatos. Os mais comuns são as anelares e as em forma de gravata borboleta. As anelares me parecem ser origem do nome para estas estruturas que nascem da morte de estrela de massa semelhante as do Sol.  
            Herschel foi o homem que cunhou o termo nebulosa planetária. Burnham se pergunta se terá a descrição de Darquier colaborado para isto? (posteriormente Don Olson e Giovanni Maria Caglieris na fadada matéria da S&T também citam esta possibilidade...). É uma pergunta que talvez fique sem resposta. Mas como Herschel foi o descobridor de Urano e a muitas destas nebulosas planetárias possuem um tom levemente cianótico como o planeta em questão é possível que seja apenas uma coincidência e que a impressão de Darquier em nada tenho influenciado o famoso astrônomo real.
            As coisas estão neste pé enquanto me preparo para realizar minha viagem de inverno e fotografar M 57 (e outras cositas más). Seria o mesmo fim de semana que ocorreria o encontro Nacional de Astrofotografia lá pelas bandas do planalto central e já que não aconteceria de poder ir tão longe me conformei com um ataque até Búzios. É quando me deparo com a tal da Australian Sky and Telescope para agosto e setembro de 2017. Logo nas primeiras páginas me deparo com a chamada para a matéria na pagina 14. “ Quem descobriu a Nebulosa do Anel? ”


            Darquier evidentemente.  Mas “só que não”. Os autores (Olson e Caglieris) garantem que todos os livros dão o nome errado do descobridor. O verdadeiro (primeiro a colocar os olhos) foi Messier. Segundo os autores a confusão se dá devido a uma questão semântica em razão do sentido da palavra “descoberta”. Como a linguagem é algo dinâmico (embora na França e em Portugal isto possa ser meio controverso) quando Messier atribui a descoberta a Darquier em sua apresentação não é isto que ele estava dizendo. De qualquer forma a explicação mais detalhada da história parece sustentar a ideia dos autores acima de qualquer dúvida. Messier observou em 31 de janeiro de 1779. Uma carta de Darquier nos conta que “ fui informado da aparição do Cometa (o Cometa Bode de 1779) apenas pela “Gazette de France” em 9 de fevereiro na qual M. Messier informa sua descoberta (nos tempos antes do telefone a informação de que o cometa já fora descoberto antes por um astrônomo na Alemanha demorava mais para chegar em Paris que a “Gazzete” em Toulouse...). Na noite de fevereiro 9-10 eu procurei por ele ao redor da meia noite. O achei na perna esquerda de Hércules. ”
            Em sua carta a Messier o próprio Darquier fala de seu ambicioso projeto a ser realizado entre 10 de fevereiro e o final de abril. Ele pretende criar um catalogo de 270 estrelas ao longo do caminho do cometa com várias que não constam no Catalogo de Flamsteed e para uma Nebulosa que se encontra entre b e g Lyrae.
            É só cruzar as datas e chegamos ao inegável fato de que Messier é o verdadeiro descobridor de M 57. Na carta onde Messier marcou M 57 esta também M 56 descoberto no mesmo dia que este localizou o Cometa de 1779 (18 para 19 de Janeiro).

            Os autores ainda dizem que o erro foi fruto do mal habito de astrônomos copiarem as fontes de outros astrônomos e assim erros (principalmente históricos) se perpetuam... E os rapazes fizeram uma bela pesquisa. Até mesmo Humboldt foi checado. Eu, grande fã do mais holístico dos cientistas “sérios”, fundador da Biogeografia e o primeiro a perceber a influência humana no clima em tempos que negacinonistas do aquecimento global e mesmo a aquecimento eram coisas distantes fiquei muito impressionado com esta nova faceta de meu ídolo. Nos tempos de faculdade existia uma enorme poltrona em nosso diretório onde eu passava horas. Era a “Cadeira de Humboldt”. Me vi obrigado a baixar uma versão digitalizada de seu Cosmos e estou lendo na integra. Lá de fato fala em M 57 e atribui sua descoberta a Darquier. E sabiamente expõe seu método... “ Meu ensaio, Cosmos, trata da contemplação do universo.”
            Dando razão a eles parto em um último arroubo investigativo vou atrás de duas fontes que ainda não visitara.
            Primeiro a desprezada Wikipédia. Esta fora atualizada no dia da matéria de S&T e trazia a história de Olson e Caglieris.
            Resta o antigo e clássico “The Bedford Catalog” que habita o segundo Volume do “Cycles of Celestial Objects” do Admiral Smyth.  Parece que os rapazes estão cobertos de razão e nenhum livro possui a informação correta... Smyth também cita Darquier como descobridor.
             Como já disse aqui e vou repetir M 57 foi uma estrela semelhante ao nosso sol que em se aproximar de seu fim ejetou suas camadas mais exteriores formando o que parece, a partir de nossa perspectiva, um anel centralizado em uma estrela que está morrendo. No caso de M57 este estertor aconteceu a cerca de 20 mil anos atrás. Diversos membros do gênero Homo devem ter presenciado o evento mesmo sem nada terem visto. Localizada 1140 anos luz não deve ter sido um espetáculo muito chamativo.
3 X Drizzle

            M 57 é a mais famosa nebulosa planetária dos céus e merece a honra. Seu anel é perceptível com cerca de 100X de aumento e está ao alcance de pequenos telescópios. Devido ao pequeno tamanho não é um bom alvo binocular.

            Sentada entre b e g Lyrae e mais próxima de b (uma variavel que oscila quase uma magnitude a cada 4 dias) navegar até ela é tarefa fácil. Mesmo que não resolva o anel o aspecto de disco planetário a denúncia mesmo em bem telescópios bem modestos. Na verdade, a descrição de Messier e Darquier me dá motivos para continuar a crer que o “Newton” (um refletor 150 mm f8) tem mais poder de fogo que um Dollond 90 mm.
            A estrela central, a matriz de M 57, é alvo visual difícil e com 15a mag. é um desafio.
            Realizei 44 fotos de M57 com 30 segundos de exposição. ASA 1600. Sem acompanhamento e com uma Canon T. As fotos foram processadas no DSS (Stacking e Drizzle) e seguiram para o Fitswork onde apenas melhorei o gradiente de fundo. Depois Photoshop. Ao longo do texto vimos versões sem nenhum drizzle, com 2 e com 3 X drizzle (processo de ampliação e adição de pixels realizado no DSS)
2X Drizzle

            Fico feliz que perceba uma estrela central (ainda que discreta) no centro da nebulosa. Em fotos do Hubble se veem duas. Uma só que participa do espetáculo. Não sei dizer se é a que registrei.


            M 57 é uma excelente introdução a nebulosas planetárias e um charmoso DSO para temporada que se aproxima.