Projetos
observacionais são um excelente método para manter a paixão pela astronomia.
Possuo vários e transcorrem simultaneamente. Meu primeiro projeto foi observar
(e posteriormente fotografar) todo o Catalogo Lacaille. Seguindo o rumo normal
das coisas observei todo o Catalogo Messier (alguns abertos em Cassiopéia aguardam
uma viagem senão ao hemisfério norte pelo menos mais ao norte...). Desta mesma
forma me dedico a uma versão “adaptada” dos “400 de Herschel”. Estes são os 400
DSO´s mais interessantes e acessíveis entre os descobertos por William
Herschel. De um total de mais de 2000. E assim ele é uma significativa parte do
mais ambicioso e irreal “Projeto Tudo que Existe”. Neste planejo registrar todo
o catalogo Ngc....
Existem
diversos guias observacionais que abordam os “400 de Herschel” e mais um pouco.
Possuo alguns deles. Um bem completo e que seleciona 615 membros como “Showpieces”
é o do James Mullaney “The Herschel Objects and How to Observe Them”. Habita também minha biblioteca o hercúleo “The
Complete Guide to the Herschel Objects” de Mark Bratton. Neste estão todos os
objetos catalogados por William e sua irmã Caroline. Como o catalogo Herschel não foi “perfeito” há
controvérsias sobre o real numero de descobertas realizadas pela dupla. Este numero
varia entre 2511 “nebulosas” e 2435.
Entradas repetidas e erros de plotagem são responsáveis por este pequeno
desvio. Bratton confirmou 2435 entradas.
E
por fim vem meu favorito e amigável “Herschel 400 Observing Guide” de Steve
O´Meara. Neste o autor apresenta um projeto factível e muito bem realizado para
que se observem “Os 400 de Herschel” em um ano. Uma semana por mês. Quase um vídeo
de ginástica da Jane Fonda para astrônomos amadores.
Foi
com ele que acabei chegando até Ngc 5897. É o único globular planejado por O´Meara
para o que deveria ser a primeira noite de observação no mês de julho. O aglomerado é, possivelmente, o único DSO
digno de nota localizado na constelação de Libra. Todos os outros são pequenas
e tímidas galáxias abaixo da magnitude 12.
É um aglomerado muito pouco concentrado (XI na escala Shapley)
localizado próximo a Iota Librae. Aglomerado
pode ser visto, em noites sem lua e em céus escuros como um brilho amorfo e bem
grande. Mesmo telescópios bem modestos (e
meu bino 15x70) o apresentarão sob boas condições. Com pequenas ampliações 5897
é um perfeito “cometa sem cauda”. Não espere resolver nenhuma estrela neste com
nada menor que 150 mm. E mesmo assim somente com visão periférica e discretas.
Seu apelido de “O Globular Fantasma” é muito apropriado. O´Meara o batizou
assim por este lembrar uma imagem fantasmagórica e apagada do também frouxo,
porém mais “resolvível” M 55 em Sagitário.
O
observei em 16 de julho de 2018 debaixo de um céu Bortle 3. Com 46X de aumento
ele é um tênue brilho bem arredondando e com as bordas mais brilhantes bem como o
centro. Sem estrelas. Com 70X e visão
periféricas algumas poucas estrelas “flicam”, mas se apagam ao se fixar a
visão. Porém é obvio e não demanda grandes exercícios para ser percebido.
Ngc
5897 é um globular da população do halo bem distante. Mais de 40.000 anos
luz. Foi descoberto por Herschel em 10
de março, 1785. Ele o descreve como “...Um
muito próximo, concentrado aglomerado de estrelas. 8´ ou 9´ de diâmetro,
extremamente rico, de um formato arredondado irregular. As estrelas são tão
pequenas que são difíceis de serem vistas. E tão acumulado no centro que parece
nebuloso (H VI-19 = VI-8).
Percebe-se que a impressão de Herschel
é bem diferente da minha e que este é, possivelmente, uma das entradas
repetidas no catalogo de Herschel.
Herschel sempre buscou conectar a aparência
visual das nebulosas e aglomerados com algum tipo de realidade física ou
material. Ele considerou 5897 uma descoberta importante por ser “uma das
graduações possíveis de conglomerados estrelares palpáveis ... em direção a nébulas
distantes”. Ele acreditava (a cosmologia
de Herschel só se mantém “viva” devido ao valor histórico) que toda as “nebulosas”
estavam em processo de formação e apenas vistas de diferentes distancias e que
o grau de concentração das nebulosas eram diretamente relacionadas ao seu grau
de evolução; sistemas muito evoluídos teriam um alto grau de concentração e vice-versa. E assim considerou 5897 um sistema com uma
idade e distancia intermediarias. Ele
considerava (inicialmente) este uma espécie de elo entre aglomerados como as Plêiades,
Hiades, Presépio e a Nebulosa de Orion. Achava este que M 42 era composta de
estrelas muito agregadas e extremamente distante. Alguns anos depois e citando
Ngc 5897 ele já fala que “que a nebulosidade sobre uma estrela pode não ser de
natureza estelar”.
Herschel nos fala ainda que o objeto
“é maravilhoso, mas difícil”. Smith no “The Bedford Catalogue” nos conta (ele observou
todo o Catalogo com um refrator acromático de 150 mm) que é “um grande e
concentrado aglomerado de mínimas estrelas ... É tênue e pálido mas dependendo
da finesse da noite , a estabilidade
da contemplação e a excelência do
telescópio este poderá ser tão bem visto como pode ser um objeto tão
baixo (no horizonte) e tão terrivelmente distante.”
Ngc 5897 possui cerca de 135 anos
luz de tamanho físico. Isto o faz bem maior que M 55 (mas que se encontra bem
mais perto...). Possui uma considerável população de Blue Stragglers (estrelas
que aparentam ser bem mais jovens do que deveriam e são fruto, provavelmente,
de colisões ou interações entre estrelas-membro). É um globular extremamente
pobre em metais (1/50 a 1/79 de ferro por unidade de Hidrogênio do que o Sol) e
provavelmente formado em um estágio embrionário da evolução galáctica. Durante
o colapso da nuvem proto-galactica. Ngc
5897 é um contemporâneo de M 3 e formou-se a cerca de 13 bilhões de anos.
Estudos realizados em 1992 por Ata Sarajedini dizem que este é mais velho que M
3 até 2 bilhões de anos. Quase um daqueles paradoxos de objetos mais velhos que
o universo. Parece ser evidente que alguns ajustes são necessários; E garantem
a importância cosmológica do “Aglomerado Fantasma”.
A foto que abre o post é resultado de uma captura de 10 exposições de 30 segundos ISO 1600 com uma Canon T3 montada em foco direto sobre um refletor de 150 mm f8. Foram utilizados 4 dark frmes. O processo de stacking foi realizado no Deep Sky Stacker e o "stretching" feito no PixInsight e no Photoshop. A montagem utilizada foi uma HEQ 5 pro.
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