Se aproxima o Dia de Finados.
Para coroar um semestre “daqueles” meu computador deu pau e eu já duro tenho
que comprar um novo. Com um prefeito eleito que acredita que a Terra tem pouco
mais de 6000 anos acho melhor partir para Búzios. Vai que o louco resolve
cobrar dizimo por eu olhar o céu. A cidade está tão dura quanto eu.
A
beira de um ataque de nervos convenço a cara metade me deixar partir uns dias
antes e aguardar por ela e as crianças já em Búzios.
Com
a casa vazia e milagrosamente uma madrugada de Finados que não está chovendo
consigo um pouco de lazer. Na verdade, muito lazer.
Depois
de meses com o universo parecendo conspirar contra a minha pessoa parece que as
coisas vão melhorar. Contrariando algumas das leis fundamentais do Universo a
minha sessão de observação acontece como o planejado. Ou quase...
Como
o Newton estava já na terra de Zé Eustáquio eu chego na Armação de ônibus
levando apenas o novo computador e a mochila da câmera. Pouco antes da 16:00
horas. Rapidamente estou com o
telescópio colimado. Ou quase...
Depois
de uma rápida consulta a nova versão do Stellarium (muito boa) que instalara na
véspera decido utilizar n Octans como
estrela guia para meu alinhamento polar. Ela estaria cruzando o Meridiano exatamente
as 19:49:17. Com magnitude de 3.7 eu esperava que ela comparecesse na Buscadora
ainda no lusco fusco. Pouco minutos antes da hora ela se acende no canto da
buscadora. Com uma altitude de 33o ela me permitiu realizar o
alinhamento em posição confortável e rapidamente.
Como
tenho planejado fotografar Ngc 55 acho uma boa ideia utilizar Ankaa (Alpha
Phoenix) como uma das estrelas de alinhamento do Synscan. Um truque que aprendi
é utilizar como a segunda estrela (supondo que você esteja alinhando o Synscan
utilizando apenas 2 estrelas) uma que esteja próxima ao alvo desejado. Isto vai
“garantir” que o go-to funcione com bastante precisão. Pelo menos até você
buscar algo mais afastado da estrela que foi utilizada.
Mesmo
com esta precaução eu sabia que teria que esperar ficar mais tarde para
conseguir observar Ngc 55. O céu ainda estava muito claro para galáxias
distantes.
Assim
resolvo testar as coisas com M 30. As fotos que fiz do mesmo na última
temporada ficaram bem ruins e espero melhorar um pouco as coisas. Tudo corre
bem e o aglomerado surge quase centralizado na buscadora. E dentro do campo da
ocular de 40 mm. A Primeira foto foi
feita as 19:58.
Nada pode ser
assim tão fácil e no momento que consigo finalmente chegar até Ngc 55 esta está
quase cruzando o meridiano e o Newton (um telescópio refletor de 150 mm f8)
acaba se enroscando nas pernas de seu próprio tripé. Vou ter que partir para
outro alvo e retornar mais tarde. Mas pelo menos já tinha feito um bom
reconhecimento das vizinhanças e esperava não ter problemas para localizar a
galáxia novamente. Não é um alvo fácil apesar da proximidade de Ankaa.
Depois
disto faço um pouco de hora em M 31. Mas novamente as fotos não ficam grandes
coisas. Ela passeia muito baixa e sempre
dentro do arco de poluição luminosa da Armação ao norte.
As
22:58 eu estou de volta a Ngc 55. Prefiro não expor o novo computador a umidade
e assim faço as fotos (80) da galáxia pelo método antigo. E assim fico mais de
uma hora ao lado do telescópio disparando a câmera a cada 30 segundos....
Quando
venho para Búzios sozinho é sempre meio solitário. E assim costumo observar com
o rádio ligado. Mas desta vez parece que o Crivella já anda aprontando e
somente consigo sintonizar rádios evangélicas. Felizmente com o advento do
telefone celular isto não chega a ser um problema. Rapidamente estou com uma
seleção do The Who tocando via You Tube.
Depois
de cumprir a lição de casa e ter meu alvo principal capturado eu fujo um pouco
de script e acabo conhecendo um Messier que nunca visitara. M34. Faço umas
poucas fotos do simpático e pouco visitado aberto.
Agora
de volta a derrota planejada ... M 77. E levando Murphy a loucura ela aparece
bem no centro da buscadora. E não exige sequer visão periférico para se
denunciar mesmo possuindo uma brilhante estrela a lhe assombrar.
Normalmente
eu sigo sempre uma mesma rotina quando avisto um DSO. Primeiro dou uma namorada
utilizando ou a 26 ou a 40 mm (oculares). Depois texto mais magnificação com a
10 mm. E só depois retiro o suporte para ocular e encaixo a câmera para
fotografar. Depois faço quantas fotos me der na telha e sigo viagem. O número de fotos vai depender de diversas
variáveis. O Interesse do objeto, quão tênue este o é, o alinhamento polar ter
sido bem feito, a transparência estar boa ou não e etc...
The
Who vai fazendo bem seu papel:
“ Out here on the fields / I fight
for my meals/ I will turn back to my living. ” Na verdade ultimo verso não é esse. Mas me pareceu apropriado.
Já
mais embriagado percebo que Sirius surgiu por trás das bananeiras a leste e
percebo que isto se deu exatamente a meia noite. Começo a delirar.... Me ocorre
que Dia de Finados, o Halloween, O dia dos Mortos tudo isto deve ter algo a ver
com o dia que Sirius nascia a meia noite
nos Egito antigo. Fico louco para falar pro Crivella que o que ele comemora é
uma festa pagã. Aí me lembro de
Zeitgeist e acho melhor abrir outra cerveja.
O
Fim da noite é observacional. Me divirto seguindo a numeração do catalogo
Messier e visito em rápida sucessão M 35, M 36, M37, M38. Nunca vou conseguir
decidir qual dos Abertos de Auriga acho mais interessante. Dou um pulinho e aproveitando a história do “
Rising Vênus” vou a M41. Depois M 42 e 43. Tudo utilizando a 40 mm. É sensacional como é divertido passear pelo
céu com ela. Dá uma tremenda impressão de profundidade. M 44 é sensacional na mesma e faz grande
contraste com M67. Os dois abertos de Câncer não poderiam ser mais diferentes. M
45 também combina bem com a moça.
M
35 se funde com Ngc 2158 e percebo claramente como um é mais distante que o
outro. Um efeito que só percebo com o grande campo oferecido pela 40 mm “baixo
orçamento”.
Depois
fico subindo e descendo pela espada de Orion e visitando mais de uma dezena de
DSO ´no apertar de um botão. The Running Man Nébula é evidente visualmente. A
noite rendeu...
Dia
seguinte me divirto tratando as fotos e testando a velocidade absurda de meu
novo computador. Vai me levar a falência. Mas pelo menos não estarei nem louco
nem puto...
A
noite me preparo para o alvo que ficou faltando na noite anterior. Eu tinha
algumas opções na manga. Um bom plano observacional tem que possuir isto.
Pensava
em tentar Ngc 300 ou o Quarteto de Grous. Mas como já tinha passeado muito pela
região e sabia que os dois objetos seriam alvos puramente fotográfico e que não
tinha nenhuma chance de percebê-los visualmente decido me virar de costas para
o mesmo e tentar algo que há anos venho adiando.
Para
me fazer companhia eu coloco o Cosmos (o do Carl Sagan) rolando no celular.
Passei o dia sem falar nenhuma palavra. Ou quase pois é comum eu pensar alto...
Finalmente
fotografo Ngc 7331. A equivocadamente batizada de Galáxia do Cervo no novo
Stellarium. Mas apesar do que eu imaginava esta também só se revelou para a
minha câmera. Visualmente não desconfiei nem de seu núcleo. Novamente o Synscan
mostrando seu valor.
O
tempo começa a nublar, mas eu já estou realizado.
Depois de
processar as fotos chego à conclusão que preciso, definitivamente de um novo
focalizador. Crawford e dual-speed de preferência. Com o atual conseguir um
foco digno é missão quase impossível. O original do Newton empenou e foi
substituído por uma ruim e o mais barato. Se o original já não era estas
maravilhas o atual combina bem com a atual status quo e é quase medieval
(afinal durante a idade das trevas a astronomia sobreviveu muito graças a
registros chineses).
No
dia seguinte chegou a chuva, os amigos e a família. Começo a elaborar um plano
para permanecer até terça feira. As crianças perderiam aula a lua já estaria se
pondo mais tarde, mas eu teria a oportunidade de ficar sem trabalho em local
agradável e observar mais.
No
domingo à noite se abrem pequenos buracos no céu e aproveito para fazer algumas
rápidas capturas. Visito rapidamente Selene ( A Lua) Consigo registrar M 42 com um pouco de dignidade.
Apesar de não focar nenhuma Brastemp e de eu descobrir (ou redescobrir) que a umidade se transforma em
ruído. De qualquer forma fico feliz que o trapézio se apresenta na captura. É difícil
não sobre expor o conjunto que ilumina a nebulosa. Nas fotos abaixo pode-se perceber bem isto. As vezes em busca de se conseguir um registro grandioso da nebulosa se perde muitos detalhes e mais ainda do que realmente se observa. Um registro astronômico se torna uma obra impressionista. Nada contra. Meu museu favorito no mundo é o Orsay. Mas uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa...
Tento
a sorte com a Nebulosa da Roseta. Mas com as nuvens entrando e saindo me
conformo em registrar apenas 2244 (o aberto envolvido com a nebulosidade que
responde por um outro número no New General Catalog.
Depois
dito e com o céu cada vez mais nublado registro algumas estrelas só para me
maravilhar como o synscan estava se comportando bem. Era só escolher a estrela
e ela aparecia centralizada no view finder da câmera.
Aldebarã |
Bellatrix |
Betelgeuse |
Meissa e O Collinder associado |
Rigel |
Mintaka |
Segunda-feira o dia amanhece ensolarado. Depois de um praião ele nubla novamente e resolvo não esperar mais. É hora de voltar para o Rio e torcer para o telefone tocar. Afinal sempre preciso do vil metal.
Mas
sempre terei o céu sobre nós e não creio que o alinhamento entre o Bispo e o Trump cause o fim do mundo.
Tenho um amigo que sempre diz -" Calma ! Isto também passará."
E para momentos mais desesperado tenho um outro amigo que sempre recita este mantra: " Ri melhor que Rivotril".
Espero realmente que as coisas melhorem para acertar minhas contas com a Nebulosa da Roseta este verão....
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